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Diário Liberdade
Domingo, 25 Setembro 2016 16:40 Última modificação em Quinta, 29 Setembro 2016 16:17

Dilma é derrubada. Cai também a tese da democracia Destaque

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Rogério Castro

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[Rogério Castro*] O dia 31 de agosto do ano de 2016 acaba de entrar para os anais dos importantes acontecimentos da história nacional por conta da condenação – sem provas – da presidente da República Federativa do Brasil, Dilma Rousseff, não supérfluo o registro, reeleita pelo voto livre e direto em 26 de outubro de 2014 para um mandato de quatro anos (2015-2018).


Foi uma cassação política, um golpe! As razões que a levaram a tal condição, do ponto de vista político, ainda hão de ser em detalhes investigadas; da mesma maneira, não será nessas linhas que irá se expor, em seus pormenores, os fundamentos que infirmam a legalidade e a legitimidade do processo, por certo, então, o predicado que lhe adjudica de golpe, de ruptura com as leis institucionais. O que tentaremos iluminar nessas breves linhas é exatamente o desenraizamento, ou a fetichização, daquilo que parcela expressiva da esquerda patrocinou, alimentou, e que agora, a própria história práticareal, e não a teoria, acaba de refutar e faz vir ao chão: a democracia.

No ano de 1979, Carlos Nelson Coutinho, filósofo e professor emérito da UFRJ falecido a 20 de setembro de 2012, de modo sério, no contexto em que a hipertrofia do estado soviético há muito tornara-se insuportável, escreveu um texto do qual o próprio orgulhara-se por ter sido um dos mais lidos na esquerda quando da sua publicação: A democracia como valor universal. Embora, conforme o mesmo se assegure, a sua concepção de valor almeje estar plenamente livre da percepção abstrata de valor, por exemplo, dos kantianos, e vise a se fundar na ontologia (por isso, o “valor” enquanto objeto é, para ele, substantivo), isto é, entender a gênese do valor a partir do trabalho e enquanto decorrência necessária do seu processo de socialização, a argumentação de Carlos Nelson não deixa de incorrer no que aqui se chama de fetichização da democracia. O filósofo estava convencido de que, por contribuir para explicitar e desenvolver o ser genérico do homem [que, para a ex-discípula de Lukács, Agnes Heller, autora na qual ele apoia a sua constatação, fariam parte dessa essência genérica do homem: o trabalho (a objetivação), a socialização, a universalidade, a consciência e a liberdade], tanto nas formações sociais capitalistas como nas socialistas, seria correto conferir ao substantivo valor o qualificativo de “universal” para se referir à democracia, algo que seria quase consensual nos dias em que ele escrevera, e que, ainda segundo o próprio, era nada mais do que a expressão subjetiva de algo primariamente objetivo.

Antes de mergulhar na miséria filosófica com a qual justifica hoje a “democracia”, o PT haveria de percorrer a década de 1980, sendo ele, desde então, uma expressão variegada de forças (em seu interior, abrigava-se de ex-guerrilheiros a membros dos Conselhos Eclesiais de Base; ver: História do PT. Lincoln Secco, 2011), cujas disputas, muitas das quais fratricidas, mantinham – em disputa – o horizonte estratégico do partido. É somente após esse processo permeado de vicissitudes – do qual pode se destacar a desvinculação, como quem se desfaz de um grande inconveniente, da expressão ditadura do proletariado, e também, após a débâcle soviética, de tudo que remetesse à economia planificada (um contraponto à produção anárquica e epidêmica do capitalismo) –, como se, no âmbito do ser dos seus dirigentes, fosse preciso livrar-se “desse passado decrépito”, depurar-se, para assim se obter as credenciais da política profissionalizada, institucional (note-se que a consequência disso é que as determinações econômicas vão progressivamente sendo abandonadas e passam a ser objeto de mera manipulação prática). Tal processo culmina com o que Secco denomina de aggiornamento, que é quando o partido, indiscutivelmente hegemônico em tal ocasião na esquerda brasileira, “quebra o tabu” do financiamento das campanhas (aceitando dinheiro de empresas privadas), amplia a sua política de alianças, e, chegando ao poder central em 2003, na efetivação de tal política de alianças (um desdobramento necessário da realização prática do governo), passa a realizar concessões – como se fosse o preço que escolhera para governar – típicas do submundo da política brasileira [diferente de todo simplismo principista, e de toda hipocrisia e do controle da opinião pública burgueses, desenvolvo algumas linhas gerais desses problemas, vistos do ponto de vista concreto, no texto A crise brasileira atual, de abril deste ano; no âmbito maior da economia, vale aqui a observação de Carlos Nelson que, ao não se furtar a considerar o abandono por reformas e a adoção de planos neoliberais pelos partidos social-democratas, não situa, por consequência, tais partidos no campo conservador, como parte da esquerda crítica ao PT passou a situá-lo – “Renunciar às reformas e adotar paradigmas neoliberais tem sido, infelizmente, a alternativa da maioria dos partidos social-democratas”. Por sua vez, o juízo de Carlos Nelson sobre o governo Lula e o PT pode ser conferido em duas entrevistas concedidas por ele, uma em 2003, quando anuncia a sua saída conjunta do partido (ele sai juntamente com Leandro Konder e Milton Temer), e outra em 2005, quando da “crise do mensalão”; se, por um lado, Coutinho se mostra assaz descontente e não hesita em caracterizar o governo Lula como neoliberal (talvez o analisando mais no atacado do que no varejo, além de falar do terceiro de uma sequência de treze anos de governos do PT), por outro, a crença de que a “burguesia” – na figura do capital industrial e financeiro – não patrocinaria um golpe por ela ter suas demandas plenamente acolhidas pelos governos petistas evaporou-se; ver: Intervenções: o marxismo na batalha das ideias. SP: Cortez, 2006]. É somente ao longo desse processo que “a tese da democracia” vai estar plenamente ajustada não apenas no PT, mas na coalizão de forças originárias da esquerda que lhe dará sustentação enquanto governo (embora com diferenças e sendo oposição, o PSOL não estaria inteiramente imune também das consequências de uma percepção fetichizada da democracia).

A miséria filosófica dessa tese – não adstrita ao Brasil, vale o registro – consiste no seguinte: cada um “pensa” de uma forma, a cada dois anos defende “suas ideias”, e, após a escolha popular (a “festa da democracia”), o escolhido (o mais votado entre os “eleitores”) realizará o mandato que as urnas lhe conferiram pelo tempo por elas designado. No contexto onde ela irá florescer tem-se que levar em conta a débâcle soviética e a hipertrofia dos estados do leste europeu, assim como os 21 anos da ditadura militar inaugurados em 1º de abril de 1964 (principalmente com todos os traumas dos quais a resistência aos militares proporcionou aos seus bravos combatentes; Dilma e o alto escalão do governo deposto, por exemplo, são dessa geração). Ou seja, no marco maior onde essa tese irá prosperar, ela encontrará esse terreno relativamente fértil para impor-se como um caminho crível [ainda que não se credite a membros do PT a defesa do socialismo, e sim, como se isso fosse possível, uma defesa de uma sociedade “mais justa, mais humana” por cima das determinações econômicas (portanto, uma defesa abstrata), intelectuais sérios, como o citado filósofo Carlos Nelson (no texto de 1979), acreditavam ser a “democracia” o caminho para chegar-se a esse patamar onde os antagonismos econômicos fundacionais conheceriam o seu desfecho resolutivo – “Também é preciso afirmar que, tanto na fase de transição para o socialismo quanto no socialismo realizado, continuam a ocorrer situações que só a democracia política será capaz de resolver no sentido mais favorável ao enriquecimento do gênero humano” (CNC); ênfase minha].

O 31 de agosto, porém, acaba de derribar “a espécie de cristal” que o processo de redemocratização do país (pós-1985) fez muita gente, credulamente, pensar tratar-se de algo sacramentado (via respeito às leis, às instituições, agora “sólidas”, à Carta Magna); a tese da democracia acaba de não resistir ao real, necessário e concreto teste histórico. Sua invalidade agora está devidamente comprovada, e quem a atesta não é mais a teoria, mas sim a própria prática dos homens, que, em linha de sucessão dos acontecimentos, também é conhecida por história.

Desfetichização da democracia

Uma das provas retumbantes da fetichização da democracia no Brasil é o quase lugar-comum por meio do qual passou-se a referenciá-la como uma “jovem democracia”. Como um ser dotado de vida (há vários fatos que impugnam uma defesa em sentido contrário, metafórico, por assim dizer), a democracia teria se tornado um bem supremo, para o qual todos, independentemente de suas respectivas condições de classe, haveriam de reverenciar. Hoje, a “jovem” fora violada, inteiramente devassada por aqueles que deveriam velá-la, afinal, quando empossados, juraram respeitar a Constituição que acabaram de mandar pelos ares. Mas o que justifica essa ruptura? Seria um mero desejo de um grupo, ansiado em tomar para si o poder, a causa decisiva para a ruptura do suposto pacto democrático (de respeito às leis da República)? Evidentemente que para cada caso concreto, só uma análise concreta correspondente poderá fornecer as respostas que se procuram; não há aqui uma lei geral. No caso da atual derrubada da presidenta do Brasil, embora, como resguardado, os anseios políticos pessoais também tenham concorrido para a consecução do golpe de Estado, a economia foi o fator decisivo para essa cruzada de quase dois anos com o intuito de derrubar o governo, cujo desfecho se dera neste dia 31. Como analisado noutro lugar (A crise brasileira atual, R. C.), o que fez a FIESP e empresários brasileiros patrocinarem uma campanha pelo impeachment (mesmo sem crime de responsabilidade) – via órgãos de mídia Veja, Isto É, Estadão, Folha, Organizações Globo e outros meios – e associarem-se a políticos visceralmente ligados às suas visões de economia foi fundamentalmente o diagnóstico comum sobre a situação econômica e também a convergência sobre o “remédio” para enfrentá-la. Dizendo de outra forma, a visão comum de que a diminuição da atividade econômica e o chamado “desequilíbrio” das contas públicas são produtos do “desperdício” do governo em políticas sociais (“não se pode gastar o que não se tem para gastar!”, esbravejam), o remédio para tal crise seria um duro programa de austeridade (com cortes em programas “sem eficácia”, áreas sociais, privatizações, concessões, reforma previdenciária, revisão constitucional dos repasses para saúde e educação via “Novo Regime Fiscal – PEC 241/2016”) e, para “recuperar a confiança dos investidores” (essa cantilena mistificadora revestida de pura retórica e com quase nenhuma objetividade econômica), desonerá-los de obrigações trabalhistas e tributárias {o próprio Carlos Nelson, no texto mencionado, não se furta a apontar o que seria um limite para a implementação de políticas sociais no capitalismo (por parte da social-democracia): “mas, por outro lado, conservada a lógica da acumulação capitalista, não é possível ampliar esse nível de satisfação [das demandas contempladas pelas políticas sociais] para além do ponto em que tal ampliação, ao impor um aumento excessivo da tributação e do déficit público, termine por bloquear a reprodução do capital global” [o parâmetro é a teoria marxiana do salário]; ênfase minha}. Numa palavra, um Estado enxuto (já que desprovido de receitas) e minimamente regulatório (nada de CLT; o negociado entre as partes prevalece). Não será aqui o lugar nem para aprofundar essas questões, nem sequer mencionar as reais causas da crise capitalista contemporânea; realça-se aqui, en passant, apenas o quadro que galvanizaria e encorajaria aqueles que deveriam guardar pudor e não violar a não mais jovem imaculada democracia.

Diferente dessa visão fetichista da democracia, segundo a qual esta seria uma coisa suspensa no ar, ela nada mais seria do que a forma política por meio da qual são “administrados” os conflitos econômicos consubstanciados (e derivados) na clássica relação burguês e proletários. A política enquanto esfera particular da realidade irá expressar, de fato, o conflito entre patrão e empregado existente (e fundacional) na sociedade civil; o objeto central da política são as reais relações econômicas. A república democrática – isto é, a forma por meio da qual os membros da sociedade (chamados agora de “eleitores”) escolhem e dão a chamada legitimidade aos ocupantes dos cargos, aos eleitos; o contraponto moderno ao arbítrio monárquico precedente – nunca pode se sobrepor aos aspectos fundacionais da sociedade (a sua forma política, democrática, não se superpõem), justamente porque os conflitos de interesses de classes desbordam o seu âmbito, isto é, eles precedem-na, terminam por determinar-lhe. Noutras palavras, a situação na economia vai determinar, antes e acima de tudo, até onde, digamos assim, se pode ir com a democracia; ou seja, não é a democracia/política que impõe indefinidamente até onde a economia pode ir, ao contrário, são os conflitos desta derivados que irão dar o tom – dizendo melhor, estabelecerão os limites – da forma política/democrática. Quando tais conflitos se agudizam no seu âmago, e a ordem é ameaçada ou pela sublevação, ou por reformas que almejem repartir a propriedade, ou pelas respostas insatisfatórias a crises epidêmicas de superprodução, a classe cuja dominação está sendo posta em causa reage e pode lançar mão ao recurso de rupturas, tal como nos mostra a história. No caso do golpe consumado no dia 31, que pode ser chamado de frio, as razões econômicas foram acima arroladas; em 1964, cuja designação quente não nos parece equívoca, as motivações econômicas compareceram igualmente em sua base; e assim por diante. De modo que, salvo as exceções inter-partidárias, os conflitos que derivam da esfera econômica desautorizam qualquer apreensão estática, inviolável, da democracia, como aliás, uma vez mais, o dia 31 de agosto de 2016 brasileiro acaba de ratificar; isto é, tal tese não resiste à prova da história.

Essa concepção idealizada de democracia não comporta o fato de que um burguês no parlamento – para sermos ilustrativos aqui – ao tomar uma decisão jamais pode tomá-la a favor de si sem que, simultaneamente, esta não seja em desfavor de alguém. Isso é nada mais do que a expressão do conflito fundacional da sociedade que aqui reaparece. Logo, tal forma democrática, determinada por tais relações econômicas, é dotada de limites, já que, embora “eleito”, uma decisão do burguês quase sempre é tomada em seu benefício (e de sua classe; vide flexibilização da CLT, terceirização, etc.), e este, não raro, não coincide, ao contrário, contradita, com os interesses dos demais membros da sociedade. Portanto, caso se conceba uma outra forma democrática (ver: CNC, supra), para que esta seja plena, é pré-requisito elidir-se os componentes fundacionais geradores do conflito econômico (isto é, dirigir as atenções para as “determinações econômicas” – supra), para que, sem eles, toda escolha da maioria seja tomada verdadeiramente em proveito de todos [a problemática da hipertrofia do estado soviético e o seu processo de burocratização são discutidos, de uma perspectiva radicalmente concreta e sem abdicação do ponto de vista da totalidade, no texto de 1968, O processo de democratização, do filósofo húngaro György Lukács – ver: Socialismo e democratização: escritos políticos 1956-1971. RJ: Ed. UFRJ, 2008).

Dialética versus democracia

Se a democracia não é auto-determinada, ao contrário, ela é antes determinada pelas relações econômicas e, mais especificamente, pelos conflitos e contradições desenvolvidos em seu âmbito, é preciso então dirigir as atenções (ou concentrar prioritariamente os esforços) para a órbita dos problemas fundacionais. Se o movimento da história é dialético, isto é, é a luta de classes que faz a história andar para a frente, é porque tais conflitos econômicos podem ter um encaminhamento resolutivo independentemente da forma democrática, uma vez que, vale dizer, tais conflitos não são dela dependentes. O fato da resolução desse problema poder ser efetuada – de modo revolucionário, para ser mais explícito – sem ter que necessariamente concretizar-se pela mediação democrática não impugna o fato de que, face ao arbítrio, ao regime de força, de censura, privação de liberdade, etc., a alternativa democrática parametrada nas leis burguesas seja qualitativamente superior. Entretanto, vista de modo fetichizado, ela nunca poderá ser apreendida em suas reais dimensões, em seus reais limites; se apreendida de modo integral, ver-se-á que, por não se auto-determinar, ela jamais pode ser fim, mas, principalmente diante da disjuntiva aludida, pode ser apenas meio (a proposta de Lukács contida no texto A ditadura democrática, por não desvincular de sua análise os aspectos fundacionais da sociedade, isto é, não padecer duma visão fetichizada da democracia, é um bom exemplo de interação dialética nessa relação entre meio e fim).

É verdade que as caracterizações do pensador italiano, Antonio Gramsci, em que ele distingue as sociedades de tipo ocidental das de tipo oriental, sendo o critério distintivo delas a “ampliação” do Estado vigente nas primeiras e ausente nas segundas, exerceram (e continuam exercendo) forte influência na esquerda mundial, a brasileira inclusa (para as primeiras, a estratégia do movimento socialista deveria pautar-se pela chamada guerra de posições, já para as segundas a estratégia continuaria sendo o “assalto revolucionário” via guerra de movimento). As sociedades de tipo ocidental (como a brasileira, segundo Carlos Nelson), por terem produzido em seu interior o que o pensador sardo vai chamar de “aparelhos ‘privados’ de hegemonia” (sujeitos políticos coletivos), antes de fazerem valer o recurso da coerção, precisariam, via sujeitos políticos, lançar mão do recurso do consenso, a ser obtido mediante hegemonia resultante da busca de legitimação [nada como o processo de deposição consumado em dia 31 de agosto de 2016 para atestar as falhas dessa tese (a artificialidade do consenso forjado via grosseira manipulação/campanha midiática). Na sua Para uma ontologia do ser social II, não abdicando-se das inter-relações dos complexos sociais (como a ideologia, a alienação, etc.), Lukács nos parece fornecer uma análise que não apenas dá conta do fenômeno para o qual Gramsci busca abarcar, mas nos oferece, pelo que foi dito (embora por outra via), uma resolução/indicação muito mais fundada na real processualidade do processo (“unidade de força explícita e força disfarçada, revestidas com as vestes da lei” – Lukács, op. cit.)]. Mas o fato é que respostas como “a democracia por um fio”, ou “esse processo mostra que é preciso estarmos de vigília com a democracia”, não dão conta do problema porque não foi da “democracia” (auto-determinada) que partiu as motivações para o farsante impeachment (ainda que determinadas intrigas e disputas tivessem seu peso relativo), mas sim, fundamentalmente, dos conflitos emanados da esfera econômica da sociedade. E é exatamente esse o desafio que será posto para o conjunto da esquerda brasileira, já que todo o campo oposicionista hoje fará oposição à esquerda ao governo que se estabelece mediante um golpe. A democracia, mesmo com a história (pelo golpe) desautorizando, vai continuar a ser a pedra angular e o Santíssimo Sacramento da esquerda brasileira, ou vai esta, haurindo a situação e tirando-lhe as lições, perceber os limites desse caminho e estabelecer no horizonte, de modo prioritário (embora, sem sectarismo, fundada em cada e na real situação concreta), o definitivo equacionamento dos antagonismos fundacionais da sociedade brasileira? Ainda que muitas das questões postas pelo segundo caminho não encontrem respostas a priori, tal fato não lhe inviabiliza, visto que, como provam-nos a França de 1871 (Comuna) e a Rússia de 1905/17 (soviets), muitas das respostas estavam por vir, brotam da processualidade do processo, sendo condição para o seu surgimento, portanto, o prévio desdobramento do mesmo.    

*Publicado originalmente no Blog da Boitempo Editorial.

*Rogério Castro (Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo.) é Doutorando em Serviço Social pela ESS-UFRJ; mestre em Serviço Social pela UFAL. Professor universitário e pesquisador da obra do filósofo marxista húngaro, György Lukács. É autor de artigos em periódicos, jornais e sites especializados. Dentre os trabalhos publicados, destacam-se: “Os 40 anos sem Lukács e o debate contemporâneo nas ciências humanas” (Revista Serviço Social e Sociedade, n. 114); Celso Furtado e a formação do Estado brasileiro em Formação Econômica do Brasil (Revista “Cadernos do Desenvolvimento” do Centro Internacional Celso Furtado, n. 14); O debate sobre o trabalho em Marx (Revista Praia Vermelha, UFRJ, v. 24, n. 2); além dos artigos, pelo Blog da Boitempo, “As raízes da escalada conservadora no Brasil atual” e “A crise brasileira atual”.

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