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Diário Liberdade
Quarta, 20 Julho 2016 07:18 Última modificação em Sábado, 06 Agosto 2016 12:54

O ridículo golpe de Estado da Turquia em 17 reflexões Destaque

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País: Turquia / Institucional / Fonte: Punto y seguido

[Nazanín Armanian, tradução do Diário Liberdade] A partir da escassa informação disponível sobre os acontecimentos de 15 de julho, ocorrem-me as seguintes ideias:

.Embora o regime de Recep Tayyip Erdogan seja capaz de cometer um atentado de bandeira falsa (tinha planejado destruir o mausoleu de Sha Solimán, fundador da dinastia otomana situado na Síria e lançar um míssil sobre seus próprios cidadãos culpando de ambos atos ao governo de Bashar al Assad, como se revelou em março de 2014), não o faria por meio do exército. Seria demasiado arriscada uma operação com armas reais a partir de uma instituição da qual o presidente turco desconfia.

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.Também é dudoso que Fathola Gülen, o clérigo sunnita turco estabelecido felizmente nos EUA, possa, como assinala Erdogan, mobilizar milhares de militares de um exército profundamente laico. Além disso, seu método é tomar o poder infiltrando-se nas postos chaves do poder, não patrocinar um levantamento de amadores.

.É possível organizar um golpe de Estado em um país da OTAN (que não só está localizado na região mais estratégica do mundo, como está em guerra) sem o conhecimento e/ou a autorização do Pentágono? Os não menos de 1.500 militares dos EUA presentes nas bases da Turquia deveriam saber qualquer coisa do plano de uns golpistas que, para mais, atuaram como amadores.

.EUA pretende acabar com o regime individual de Erdogan. Esta trapalhada inesperadamente, tal como o atentado do aeroporto de Ataturk duas semanas antes, acontecem precisamente quando Ancara pretendia corrigir, à sua maneira, os graves erros na política exterior que enfrentou o governo turco com todos os seus vizinhos. O diálogo entre EUA e Turquia rompeu-se: às discrepâncias sobre a situação da Síria, Iraque e a questão curda, acrescentou-se o pedido da Turquia para ingressar na Organização de Cooperação de Xangai, onde o presidente turco participou a 29 de junho em Tashkand, dizendo que “é muito melhor do que a União Europeia”. Não dá para ser membro da OTAN e aproximar-se da China e Rússia (em parte como consequência do Brexit e a perda de interesse de Bruxelas por integrar a Turquia) oferecendo à Rússia suculentas propostas comerciais que romperão as multas impostas por Ocidente, ou estar na Organização de Cooperação Econômica do Mar Negro (BSEC), em vez de potencializr a Associação Transatlântica de Comércio e Investimento (TTIP/ATCI)! EUA precisa um sócio obediente na região que aplique a estratégia da contenção militar e econômica da Rússia, China e Irã. Alguns meios russos apontaram 31 de março também para este desejo ou plano de EUA de “mudança de regime” na Turquia.

.Barack Obama, que começou seu mandato apoiando a Irmandade Muçulmana, apostou forte no “Islamismo de gravata” contra a nefasta aliança de Bush com o islamismo de turbante dos xeques waabitas da Arábia Saudita. Recebeu de braços abertos Erdogan e sua esposa, e aplaudiu as conversas de paz com a guerrilha curda de PKK, ignorando que o astuto dirigente turco tinha preparado uma armadilha aos curdos. A deceção posterior de Obama com o líder turco não foi por ter visto ele sem máscara, mas porque seu aliado tinha sua própria agenda na política exterior, saindo da órbita dos EUA. Daí o duro castigo, empurrando ele para o inferno da guerra de desgaste da Síria. No dia 28 de março passado, Obama recusou receber Erdogan em audiência em Washington e inaugurarem juntos uma mesquita turca em Maryland.

.Para além da responsabilidade do Erdogan e seu partido em deriva-a do país, Turquia foi vítima das estratégias erradas de Washington (inclusive para seus próprios interesses). Converteu o peso pesado da Eurásia em “Paquistão 2.0”, a partir de onde a CIA envia grupos terroristas religiosos ao país vizinho, Síria, para desmantelar seu governo semilaico, perdendo um aliado fulcral como a Turquia. Não vê que o Paquistão foi recolhido pela China?

.Embora hoje o presidente de Turquia se apresente como o herói nacional e pareça o principal beneficiário do tumulto militar, não o é: o fim do erdoganismo começou com sua derrota nas eleições do junho do 2015. Agora, nem poderá controlar a tantos inimigos que tem criado dentro e fora do país, nem governar a sociedade que tão vilmente fragmentou.

.Este não ia ser um golpe contra a democracia. O golpe do governo do Partido de Justiça e Desenvolvimento foi o que deu contra a democracia quando bombardeou a população curda, retirou a imunidade dos parlamentares opositores, fechou dezenas de diários, prendeu centenas de jornalistas, estudantes, prefeitos, juízes e políticos.

A farsa de um golpe de Estado

Surpreende que os golpistas de um exército de meio milhão de homens e um orçamento anual de 18.000 milhões de dólares não seguissem os mais elementares passos para tomar o poder:

.Contar com as figuras mais destacadas e de maior patente do exército. Os comandantes das forças terrestres e marinha turcos não se envolveram na tentativa.

.Ter imobilizado os aviões e navios militares, controlando os aeroportos, estradas principais, etc. Os golpistas foram atacados por um avião caça, por tanques e helicópteros!

.Ter detido ou assassinado o chefe do Estado ou o resto do governo. Conta-se que chegaram a bombardear o hotel onde estava Erdogan, mas só quando ele já o tinha abandonado. Depois aterrissou no aeroporto internacional de Ataturk, que não tinha sido ocupado pelos golpistas.

.Ter-se feito com o controle de todos os meios de comunicação. Salvo a Rádio Televisão turca, onde deram uma penosa imagem de golpistas sem ânimo de triunfar, se esqueceram do resto dos meios, incluídas as redes sociais (que Erdogan costuma as bloquear inclusive quando há manifestações pacíficas em sua contra). Na televisão não apresentaram um líder decidido e firme, nem leram uma declaração de intenções atraentes, nem deram a imagem de pessoas que fossem tomar o poder a sério. Assim, era impossível recrutar os setores sociais anti Erdogan nem muito menos os indecisos. Ao invés, o presidente (ao que parece) só com um celular e com a CNN turca, conseguiu arrastar milhares de seus seguidores às ruas. O resto fizeram-no as mesquitas, animando os fiéis para que fossem à guerra contra “os inimigos do Islã”.

.Os militares enganaram-se julgando que a atual sociedade ia apoiar um golpe de Estado. Os cidadãos, os partidos da oposição, e inclusive os curdos que vivem um verdadeiro massacre, lembram ainda as ditaduras despiadadas dos uniformados: “Nem Erdogan, nem militares”, foi a palavra de ordem dos partidos de esquerda.

.Não atraíram o apoio de outros países. Nas três primeiras horas que Obama manteve um estranho silêncio, Irã e Qatar opuseram-se ao golpe, e a Arábia considerou que era um assunto interno.

.Não teve nenhuma condição objetiva, nem subjetiva para o triunfo do levantamento. “Alguém” enganou os amotinados, preparou-lhes uma armadilha. O qual não impede que no futuro o exército turco possa atuar, mas a sério, mas isso será quando EUA não vir a possibilidade de uma transição não violenta para desmantelar o regime de Erdogan.

.Os militares formam uma casta, o qual significa que se protegem em termos de lealdade corporativista. Daí que, quando fracassa sua tentativa de golpe de Estado, os mandatários costumam mudá-los de postos ou os aposentar, ao invés de os deter ou executar. Assim, evitarão contragolpes. O que fizer Erdogan ao respeito, mostrará o grau de sua habilidade e o sentido comum.

.A principal lição destes fatos é que Erdogan não controla a situação, e a sua permanência no poder poderá empurrar a Turquia para uma guerra civil, com as forças reacionárias de protagonistas: ninguém pode garantir que a Turquia estará imune a cair em uma “sirização” total.

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