Pezão fechou o acordo na esfera federal, que prevê, entre outros, privatização da empresa de tratamento de esgoto e distribuição de água (uma empresa superavitária); aumento da contribuição previdenciária nos vencimentos do funcionalismo para 14%, com adicional de 8% “provisórios” por três anos; elevação do ICMS; cortes nos serviços públicos da ordem de R$ 9 bilhões.
Faltou “combinar” com os sujeitos diretamente afetados: a população e os servidores públicos estaduais. Por razões abaixo destacadas, é pouco provável que esse espúrio acordo tenha aplicação, sobretudo em sua integralidade.
1. O governador, por motivos notórios e a cada dia mais evidentes, não possui legitimidade para nada. O seu antecessor e padrinho político, Sergio Cabral Filho, está preso. Símbolo maior das mazelas promovidas nos últimos anos pelo agrupamento político de Pezão.
2. Temer e Meireles, igualmente, não possuem qualquer credibilidade política. Golpistas, sem legitimidade popular, que não contam com o respaldo do voto.
3. Com todas as inúmeras limitações do movimento dos servidores estaduais do RJ, os níveis de mobilização e politização alcançados nos últimos meses não permitem acreditar em aprovação parlamentar fácil e muito menos integral do draconiano pacote na Alerj.
4. Toda a roubalheira (Sergio Cabral possui cerca de 100 milhões de dólares que foram ocultados em contas no exterior) e a entrega dos recursos do estado para o grande capital – sob a forma de mais de R$ 180 bilhões em “incentivos fiscais”, sobretudo para multinacionais e empreiteiras – são de notório conhecimento no estado, em especial pelos servidores. A cobertura dessa sangria de recursos públicos não será facilmente transferida para o sacrifício dos servidores e da população.
5. Os servidores têm se deparado com salários atrasados (o pessoal da Ciência e Tecnologia, da Cultura e da Saúde, assim como os aposentados e pensionistas, têm sido os mais afetados, com salários de dezembro, 13º e férias ainda a receber). O desmonte, em particular, dos hospitais, das universidades, agência de fomento à pesquisa e escolas técnicas, é dramático. Fatores de enorme repercussão pública e descontentamento entre servidores, pacientes hospitalares e estudantes.
Com isso, se pode especular o seguinte:
6. Os dias de apreciação e votação do pacote na Assembleia Legislativa serão tensos e contarão com a importante e dilatada pressão dos servidores e do público destinatário dos serviços.
7. Por enquanto, sendo apenas ventilada pelos servidores de diferentes órgãos e secretarias, não seria desrazoável supor o estabelecimento de uma greve geral do funcionalismo estadual, de modo a reverberar a ilegitimidade do “acordo” Pezão/Temer e a pressionar mais os deputados estaduais.
8. Como se desenrolou entre os meses de novembro e dezembro do ano passado, com o envio de tropas da Guarda Nacional, em meio a amplos protestos do funcionalismo, provavelmente ocorrerá uma intervenção armada federal. Talvez em escala superior.
9. Desse modo, Temer terá que se dispor a eventualidade de sujar as mãos de sangue.
10. Não surpreenderia a ocorrência de divisões no setor armado, especialmente no âmbito da segurança estadual. Mesmo considerando múltiplas limitações e contradições, nos últimos meses, importantes setores da segurança bravamente se dispuseram a acompanhar o movimento integrado pelas frações civis do funcionalismo, negando-se a um acordo à parte, particularmente em torno da questão previdenciária. Não sendo impossível, é difícil crer que o faça agora, em momento tão candente e decisivo.
Esse malfadado pacote vai sair muito caro para os governos federal e estadual, em termos de credibilidade e estabilidade política e social. Seria razoável que pensassem em entregar a “fatura” da crise a quem a promoveu e deu sustentação: variados setores do grande capital. Mas, reacionários, entreguistas e golpistas não são razoáveis.
São testas de ferro do capital, que destroem os serviços públicos e transferem os parcos e sacrificados rendimentos da população para os empresários.
Como tem ocorrido em um intervalo superior a mais de um ano de lutas dos servidores estaduais do Rio, a deliberação e a votação parlamentar será nova oportunidade para estreitar as relações de solidariedade entre as diferentes categorias, assim como repercutir as péssimas escolhas e ações do governo estadual.
Já para o dia 1 de fevereiro, o Movimento Unificado dos Servidores Públicos Estaduais (MUSPE) marcou protesto em frente à Assembleia Legislativa. Um dos principais itens de pauta é o impeachment do governador Pezão. A nota oficial do Movimento é reproduzida abaixo.
Roberto Bitencourt da Silva – historiador e cientista político.
Blog do Roberto Bitencourt da Silva: http://jornalggn.com.br/blog/roberto-bitencourt-da-silva/
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MUSPE
NOTA OFICIAL
Considerando a publicação no Diário Oficial do Poder Legislativo e o ofício emitido aos deputados pelo atual presidente da ALERJ, Jorge Picciani, convocando todos os Parlamentares a estarem presentes no dia primeiro de fevereiro, para a apresentação do acordo de ajuste de medidas fiscais e eleição do futuro presidente da Casa Legislativa, o ato de protesto do MUSPE "Só o Impeachment Salva o Rio", com a presença de milhares de servidores e demais cidadãos, será transferido para o dia 01/02, às 12h, em frente à ALERJ.
Movimento Unificado dos Servidores Públicos Estaduais