As operações críticas de Mészáros reúnem o exaustivo conhecimento do objeto sobre o qual incide uma coragem intelectual que não vacila em franquear – quando preciso – a fronteira da iconoclastia. A modos nada diplomáticos, que certamente causam frisson aos bem-pensantes deste nosso tempo de capitulações e concessões, subjaz um tipo de fundamentação teórica cada vez menos encontrável no mundo universitário: Mészáros é pensador de estirpe clássica, que mobiliza sólido acervo cultural no trato das expressões ideais que, no século XX, serviram, intencionalmente ou não, para legitimar o jugo do capital. Ele conduz esse tratamento, ao mesmo tempo, com artilharia pesada e esgrima florentina, num estilo de crítica haurido nos melhores escritos de Marx e Lukács. Que o leitor confira-o nas páginas que seguem, no enfrentamento, entre tantos, de ícones da academia, como Weber, Adorno e Habermas.
A alusão a Marx e Lukács não é casual: Mészáros é legatório de ambos. Não é, jamais, um discípulo: é continuador, distingue o que é vivo do que é morto, serve-se da herança marxiano-lukacsiana para fazer avançar criadoramente a crítica revolucionária do presente.
É suficiente que o leitor desta obra percorra algo da parte um e toda a parte dois para dar-se conta de que a radicalidade polêmica antes referida não se esgota em si mesma: abre a via seja para a compreensão renovada de complexos processos societais, seja para o afinamento dos parâmetros teórico-metodológicos necessários à sua análise.
Na terceira e última parte do livro comparecem questões pertinentes à problemática da emancipação humana (isto é, o comunismo). Nela, o leitor verifica como a qualificação teórica conjuga-se à paixão revolucionária. Mészáros continua, sem ilusões e sem utopismos – como Marx e Lukács –, identificando no movimento real que derrói a ordem de hoje o vetor da alternativa socialista.
O poder da ideologia, na paisagem do final do século XX, permanece, contra ventos e marés, como demonstração da vitalidade e do potencial crítico-analítico da tradição marxista.
Fonte: Blog da Boitempo.