Para suavizar a árida travessia da leitura de sua maior obra, Marx oferecia alguns oásis literários.
Ao discutir, por exemplo, a utilização capitalista das máquinas, ele cita palavras do degolador Bill Sykes, de Charles Dickens:
Senhores jurados, não há dúvida de que a goela deste caixeiro-viajante foi cortada. Mas isso não é culpa minha, é culpa da faca. Teremos nós, por causa deste inconveniente temporário, de abolir o uso da faca? Vejam só! Onde é que estariam a agricultura e o comércio sem a faca? Não é ela tão salutar na cirurgia quanto conhecedora em anatomia? E além disso uma ajuda que se deseja à mesa do festim? Se abolem a faca — lançam-nos de volta nas profundezas da barbárie.
Há um trecho em que Marx destaca a capacidade do capitalismo em transformar trabalho vivo em trabalho morto. Em valor que se valoriza a si mesmo e, ainda assim, tem a capacidade de se mostrar como “um momento animado que começa a ‘trabalhar’ como se tivesse ‘amor no corpo’”. Esta última expressão pertence a um verso do “Fausto”, de Goethe.
Por fim, “Antígona”, de Sófocles:
Nada suscitou nos homens tantas ignomínias/ como o ouro. É capaz de arruinar cidades,/ De expulsar os homens de seus lares./ Seduz e deturpa o espírito nobre/ Dos justos, levando-os a ações abomináveis,/ Ensina aos mortais os caminhos da astúcia e da perfídia,/ E os induz a cada obra amaldiçoada pelos deuses.
Mas como disse Shakespeare, em outra frase presente na obra, “o curso do verdadeiro amor nunca é sereno”. E o deserto continua logo adiante, esperando pelos persistentes leitores.