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Diário Liberdade
Sábado, 27 Janeiro 2018 11:50 Última modificação em Sábado, 27 Janeiro 2018 11:54

2018, Ano Marx (I) / Nom é a pobreza, nem a redistribuiçom… é a exploraçom!

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Mauricio Castro

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Completam-se, neste ano, douscentos desde o nascimento de umha figura incontornável na história social do último século e meio.


Seja qual for a avaliaçom que cada qual figer, é inegável a importáncia da teorizaçom realizada ao longo de toda a vida adulta por Karl Marx. Nom é exagero afirmar que nom dá para compreender realmente nengumha das chamadas ciências sociais sem estudar os seus contributos nessa ampla área de estudo científico.

Dito o anterior, nom há acaso na desconsideraçom generalizada com que o mundo académico trata as teses do fundador do socialismo científico. Poucas faculdades de Economia, Filosofia, Direito, Sociologia, Antropologia, História... resultantes do esquartejamento das ciências sociais, reconhecem a vigência teórica do marxismo, servindo esse desprezo explícito como confirmaçom da sua potencial ameaça até hoje. De facto, som critérios ideológicos e de classe os que marcam a orientaçom académica conservadora dos estudos superiores sobre a sociedade em todo o mundo.

A Galiza nom é umha exceçom e este ano, que poderia servir para corrigir essa grave carência com motivo da efeméride, só virá confirmar o desinteresse da academia burguesa em se rever através do seu mais sólido e contundente crítico.

Assi sendo, e com umha Academia esterilizada para tam necessário labor, deverám ser os sectores interessados os que o assumamos, como eu tentarei fazer com umha série de breves artigos que hoje começo.

Ainda assumindo as próprias limitaçons, e declarando o modesto objetivo de incitar ao seu mais aprofundado estudo, aproveito o ensejo para reivindicar o património que a obra de Karl Marx representa para a humanidade que luita pola sua emancipaçom. Em tempos de decadência pós-moderna, ele representa a modernidade que foi mais longe do que a burguesia revolucionária e iluminista pudo chegar, umha vez constituída como classe dominante. Tam longe, que com a hegemonia burguesa ainda em processo de construçom, Marx estudou a sua natureza e avançou as condiçons da sua derrota por parte da nova classe em ascenso: o proletariado.

Ao longo desta série de textos, tentarei compartilhar com quem me lê pequenas pílulas sobre o significado das principais categorias críticas desenvolvidas polo autor do Capital e sobre a sua validade atual. Serám só simples evidências para qualquer pessoa interessada na matéria, mas que talvez consigam interessar outras pessoas leigas no assunto.

Karl Marx, estudante de Direito e Filosofia, partiu de posiçons democráticas radicais na sua mocidade, como jornalista, a inícios da década de 40, na sua terra natal da Renánia (tinha nascido em 1818 em Tréveris, a mesma cidade onde fora executado, no século IV d.n.e. Prisciliano, o grande herege galaico).

O estudo do processo histórico que levou à despossessom do campesinato renano em favor dos donos das florestas (o famoso episódio do roubo da lenha no vale prussiano do Reno), conduziu o jovem Marx ao estudo, inicialmente ocasional e, finalmente, profundo, crítico e permanente, da Economia Política burguesa, verdadeiro arcabouço autojustificativo da ainda ascendente hegemonia capitalista.

Marx nom realizou muitas descobertas particulares na sua crítica da Económica Política. Mais do que isso, analisou a fundo e com pretensom de totalidade o modo capitalista de produçom, indo mais longe do que os clássicos burgueses anteriormente tinham ido. Dentre os contributos da sua análise, salienta a centralidade da categoria “exploraçom” como ámago da contradiçom social que funda o capitalismo.

A exploraçom, a traço grosso, consiste na extraçom privada de mais-valor à classe trabalhadora por parte da classe burguesa dominante. Umha extorsom que permite, mediante a compra-venda “livre” de força de trabalho, um progresso acelerado das forças produtivas, como nunca antes se tinha produzido na história das sociedades humanas desde o surgimento da divisom social do trabalho, da propriedade privada e das classes sociais.

Umha característica do capitalismo, tal como antes outros modos de produçom dominantes, é a naturalizaçom das suas formas de relaçom social, ao ponto de serem confundidas com a própria “essência humana”. Só um estudo consciente e crítico com perspetiva de classe permite ir além da aparência e descobrir o mecanismo fundante do que é só um modo de produçom histórico: nem natural, nem eterno.

O estudo do mecanismo da exploraçom, que nom faremos aqui por nom ser esse o objetivo deste texto, é de fundamental importáncia por dous motivos: primeiro, porque só compreendendo-o é que percebemos a lógica lucrativa que inevitavelmente rege a reproduçom social no capitalismo; e segundo, porque sem esse conhecimento, acabaremos, como a nossa esquerda atual já fai, derivando a eventual soluçom dos graves problemas sociais que caracterizam as sociedades capitalistas para questons morais (justiça-injustiça, bondade-maldade...), ou para pseudoalternativas de tipo parcial (progressividade fiscal, políticas redistributivas e por aí fora).

As chamadas “reformas”, quer dizer, a defesa de melhorias parciais para a única classe que sustenta a maquinaria de reproduçom social capitalista, a trabalhadora, som necessárias: a defesa das pensons públicas, do aumento salarial, de rendas, subsídios e impostos compensatórios da crescente desigualdade... Porém, atribuir a um processo cumulativo de reformas parciais a virtualidade de conduzir para um novo sistema, mais justo ou humano, é umha pura ilusom que, historicamente, estivo na origem do chamado reformismo. A sua incapacidade está na renúncia a questionar a natureza do capitalismo, deixando intacto o mecanismo de exploraçom a que acima nos referimos.

A partir do mais apurado estudo do sistema capitalista, que foi realizado por Marx, fica claro que só o fim do trabalho assalariado, mediante o qual umha classe se enriquece à custa do trabalho de outra, poderá pôr as bases da apropriaçom social da riqueza. A enorme socializaçom da atividade produtiva e os grandes avanços tecnológicos já há muito situárom a nossa espécie, pola primeira vez na história, em condiçons de abundáncia que permitem umha boa vida, digna de ser vivida por toda a humanidade.

No entanto, essa nova vida, que Marx considerava o fim da pré-história e o início da verdadeira história humana, é incompatível com a continuidade do atual modo de produçom. Depende de um processo revolucionário que podamos mandá-lo para o lixo da história e corresponde à classe responsável pola produçom de toda a riqueza social, a classe trabalhadora, a liderança em tam necessária tarefa.

Talvez o principal mérito do atual sistema, 200 anos depois do nascimento de Karl Marx, seja ter convencido a classe trabalhadora de que a realizaçom dessa tarefa histórica é impossível e de que o capitalismo será eterno. A prova disso é que agora a esquerda fala em gestom do sistema, combate à pobreza, redistribuiçom de renda, proteçom social, democracia radical... mas raramente de luitas de classes, fim da exploraçom ou revoluçom socialista.

Enquanto a alienante ideologia burguesa conseguiu naturalizar as relaçons sociais de produçom capitalistas a partir de um suposto impulso humano a-histórico para a troca (Adam Smith), sendo nessa medida conservadora, Karl Marx mostra o seu caráter histórico, estudando as condiçons de possibilidade para a sua superaçom. É a prática revolucionária compassada com o estudo dessas condiçons que poderá permitir-nos retomar o fio vermelho da emancipaçom humana.

Fonte: Sermos Galiza.

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