Publicidade

Diário Liberdade
Quinta, 11 Outubro 2018 00:24 Última modificação em Quinta, 11 Outubro 2018 00:31

Kavanaugh, o privilégio também chora

Avalie este item
(0 votos)
António Santos

Clica na imagem para ver o perfil e outros textos do autor ou autora

A estratégia do Partido Democrata nos EUA é conhecida de todos: cercar Trump de escândalos e litígios legais para derrotá-lo nas eleições de 2020 ou, caso seja necessário, removê-lo judicialmente antes disso.


O problema é que a grande vingança democrata pelo caso Monica Lewinsky está a abrir brechas que não são apenas bipartidárias mas de classe.

Num comício no Missouri, esta semana, Trump reafirmou que o Senado deveria confirmar a sua nomeação de Brett Kavanaugh para o Supremo Tribunal dos EUA porque o juiz, acusado de assédio sexual e tentativa de violação, «nasceu para o cargo». É, até ao momento, a mais concisa explicação para a fractura, sem precedente histórico, que a nomeação abriu na sociedade estado-unidense. Kavanaugh «nasceu para o cargo» porque pertence a uma casta de privilegiados a quem todos os abusos são permitidos e que, desde o berço, estão destinados à riqueza e ao poder. O sórdido espectáculo de televisão, raiva e lágrimas que Kavanaugh ofereceu à América no Comité Judiciário do Senado, ilustra bem a frustração desta casta (que não está acostumada a ser questionada, muito menos responsabilizada) com o encalacrar de uma nomeação que era sua por direito de nascença.

Nas chamadas «elites» desta casta, o assédio sexual é, desde que Yale é Yale, um ritual de passagem e tomada de posse do privilégio. Relatos de ataques sexuais assombram as mais prestigiadas instituições universitárias da «liga da hera» há quase 300 anos e nunca a palavra de uma mulher impediu a nomeação de um juiz do Supremo. Mas também nunca, em 300 anos, a classe dominante esteve tão dividida.

Burgueses serão burgueses

A estratégia dos democratas é conhecida de todos: cercar Trump de escândalos e litígios legais para derrotá-lo nas eleições de 2020 ou, caso seja necessário, removê-lo judicialmente antes disso. O problema é que a grande vingança democrata pelo caso Monica Lewinsky está a abrir brechas que não são apenas bipartidárias mas de classe. A erosão dos velhos consensos tácitos entre democratas e republicanos não deve ser subestimada: enquanto Kavanaugh recordava chorosamente no Senado o dia-a-dia da juventude milionária da casta do poder, revoltado por alguém lhe vir dizer agora, 36 anos mais tarde, que não podia fazer o que todos faziam, dezenas de milhares de mulheres protestavam nas ruas de todo o país contra a cultura do assédio e da violência sexual: a cultura de Kavanaugh e de toda a classe dominante.

A nomeação acabou por ser adiada e Trump cedeu às pressões democratas, autorizando uma investigação do FBI à conduta de Kavanaugh. A principal acusadora, Christine Blasey Ford, já veio a terreiro denunciar negligências graves na investigação, sugerindo que se pode tratar de uma operação de Trump para ilibar Kavanaugh.

Pode, contudo, ser demasiado tarde para ilibar a cultura machista do grande capital. «Deve ser assustador ser homem e jovem nesta altura» atirou Trump no mesmo comício, numa lógica de «rapazes serão rapazes». O presidente questionou-se ainda sobre «o que aconteceria» se toda a gente começasse a ter de pagar pelas «parvoíces» que comete durante a juventude. Cerca de 700 mil reclusos estado-unidenses, a maioria de famílias pobres, todos eles presos por crimes que cometeram durante a adolescência, poderiam responder a essa pergunta.

*Este artigo foi publicado no “Avante!” nº 2340, 4.10.2018

Diário Liberdade é um projeto sem fins lucrativos, mas cuja atividade gera uns gastos fixos importantes em hosting, domínios, manutençom e programaçom. Com a tua ajuda, poderemos manter o projeto livre e fazê-lo crescer em conteúdos e funcionalidades.

Doaçom de valor livre:

Microdoaçom de 3 euro:

Adicionar comentário

Diário Liberdade defende a discussom política livre, aberta e fraterna entre as pessoas e as correntes que fam parte da esquerda revolucionária. Porém, nestas páginas nom tenhem cabimento o ataque às entidades ou às pessoas nem o insulto como alegados argumentos. Os comentários serám geridos e, no seu caso, eliminados, consoante esses critérios.
Aviso sobre Dados Pessoais: De conformidade com o estabelecido na Lei Orgánica 15/1999 de Proteçom de Dados de Caráter Pessoal, enviando o teu email estás conforme com a inclusom dos teus dados num arquivo da titularidade da AC Diário Liberdade. O fim desse arquivo é possibilitar a adequada gestom dos comentários. Possues os direitos de acesso, cancelamento, retificaçom e oposiçom desses dados, e podes exercé-los escrevendo para diarioliberdade@gmail.com, indicando no assunto do email "LOPD - Comentários".

Código de segurança
Atualizar

Quem somos | Info legal | Publicidade | Copyleft © 2010 Diário Liberdade.

Contacto: diarioliberdade [arroba] gmail.com | Telf: (+34) 717714759

O Diário Liberdade utiliza cookies para o melhor funcionamento do portal.

O uso deste site implica a aceitaçom do uso das ditas cookies. Podes obter mais informaçom aqui

Aceitar