As empresas subsidiárias dos Estados Unidos continuam a retirar anualmente de Porto Rico 33 por cento da riqueza produzida no país, o que tem o efeito de bloquear efectivamente as tentativas de estabilização e recuperação económica, sem que a junta de controlo ou o governo anexionista tomem medidas para atalhar a situação.
Segundo decorre das contas sociais oficiais, essas corporações retiraram de Porto Rico em dez anos cerca de 330.000 milhões de dólares – desde que teve início a crise económica – e o montante aumenta em proporção com o produto interno bruto (PIB).
Mas o plano decretado pela junta de controlo designada por Washington para reger Porto Rico procura o empobrecimento sistemático das pessoas, com o objectivo declarado de que desse modo os porto-riquenhos produzirão mais riquezas que tornem o país atractivo para os investidores. A ter êxito, o que o plano da junta – que o governo anexionista reclama como fundamentalmente seu - conseguiria seria que aumentassem os lucros repatriados para os EUA.
Não se trata de um problema que tenha permanecido sempre igual durante todo o tempo sob a dominação dos EUA sobre esta pequena nação insular do nordeste do Caribe. Pelo contrário, durante os primeiros vinte anos do impulso económico autonomista – de 1950 a 1970- a relação entre investimento e repatriação de capitais era normal e notou-se na construção de um país que dava a aparência de prosperidade.
Uma situação um tanto similar das consequências da fuga de capitais registou-se na vizinha República Dominicana sob a ditadura de Rafael Leonidas Trujillo. O historiador Arturo Martínez Moya calculou que essa fuga de capitais, que de 1956 a 1961 chegou a acumular o equivalente a quase 20 por cento do produto interno bruto do último ano, “não foi pontual mas sim um processo que se desenvolveu com a crise política a nível internacional e local até precipitar a queda da ditadura de Trujillo”.
No caso de Porto Rico, o respeitado economista Francisco Catalá calcula que, ainda que o país tenha estado submetido à colonização directa dos EUA desde 1898, até 1970 a produção total de riqueza estava principalmente em mãos de empresários residentes, pelo que se verificava um certo nível de acumulação de capitais. Nas últimas três décadas do século passado isso mudou, com a apropriação crescente e directa por parte de investidores dos EUA.
Outro aspecto do problema é que essas mesmas corporações, que levam de imediato os lucros praticamente livres de impostos, se dedicaram além disso a emprestar dinheiro ao governo colonial mediante títulos no mercado de Wall Street, com o que se montou uma dívida que agora resulta impagável em resultado da indigência em que deixaram a economia de Porto Rico.
Mas o endividamento superior à capacidade de pagamento – que foi a política pública dos EUA na administração da colónia pelo menos desde 1900 e que provocou que já em 1917 a dívida de Porto Rico fosse o dobro do orçamento governamental – ultrapassou os níveis sustentáveis em 2012. Em 2014, Wall Street avaliou os títulos de Porto Rico no nível conhecido como “lixo”, mas a crise não afecta as corporações estado-unidenses.
O referido processo está amplamente documentado no Apêndice Estatístico do Relatório Económico ao Governador, preparado pela Junta de Planificação, que mostra a diferença entre o produto nacional bruto (a riqueza em mãos de residentes) e o produto interno bruto (a produção total de riquezas).
Segundo esse relatório, em 2007, ano em que eclodiu a crise, essa diferença foi de 28.882 milhões de dólares e no ano seguinte subiu para 30.936 milhões, 32.768 em 2009, 33.768 em 2010 e 34.661 em 2011. Uma leve melhoria económica foi acompanhada por uma leve baixa também na fuga de capitais, com 33.479 milhões em 2012, mas de imediato retomou o sentido ascendente com 33.506 em 2013 e 33.648 em 2014 e, embora em 2015 tenha sido de 33.578, a projecção para 2016 foi de 34.900.
Como era de se esperar, a saída para os EUA de praticamente todos os lucros reflectiu-se em que o investimento interno de capital fixo tenha evidenciado uma tendência para a baixa desde 2006 e reduziu-se de 11.900 milhões de dólares em 2005 aos 8.262 milhões estimados para 2016. O que é o inverso do largo período de 1971 a 2005, quando o investimento bruto de capital fixo aumentou quase todos os anos.
Isso acompanhado de uma quebra constante no índice de actividade económica desde 2005, quando alcançou 59 pontos sobre a base de 100 estabelecida em 1980. A partir daí baixou até 21 sobre cem, o nível verificado em 1991.
O problema captou desde há anos a atenção de observadores internacionais e durante o primeiro quadriénio deste século a Comissão Económica para a América Latina (CEPAL) da Organização das Nações Unidas utilizou o caso de Porto Rico para mostrar aos demais países os perigos dessa situação.
O fosso começou a notar-se em 1972, quando houve uma diferença de dez por cento entre o PNB y el PIB, fosso que continuou crescendo cada ano até chegar em 1996 aos mencionados 33 por cento. Desde então tem-se mantido a esse nível e, embora se tenham verificado algumas variações menores, nos últimos cinco anos tem estado constante nos 33 por cento.
O resultado foi que, desde 1972 até ao presente, as subsidiarias das corporações dos EUA levaram de Porto Rico mais de 716.000 milhões de dólares, 46 por cento dos quais foram repatriados nos últimos dez anos. O efeito acumulado desse comportamento das corporações dos EUA colocou já o país à beira do colapso.
Esses números, todavia, são conservadores, dado que uma revisão do relatório de pagamentos ao exterior por rendimentos de capital mostra valores ainda mais preocupantes.