O cômputo das eleições federais deu como resultado o triunfo presidencial de Andrés Manuel López Obrador e uma maioria nas câmaras de deputados e senadores da coligação que o apoiou, que também obtém maioria no governo da Cidade de México e na maioria dos governos estatais que se encontravam em disputa.
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O resultado da votação popular está em concordância com a eleição que já tinham previamente efectuado a maioria dos monopólios no México, expressando o seu apoio de diferentes formas, e que ao longo da campanha eleitoral foram integrando os seus representantes, inclusive os monopólios de meios de comunicação Televisa e TV Azteca – anteriormente seus adversários e agora promotores da sua figura-, nesta coligação. Os grupos económicos e seus quadros políticos estão representados nas diferentes equipas que López Obrador foi apresentando, incluído o seu Gabinete: é claro, sem subterfúgios, que o poder dos monopólios está assegurado, que a ditadura de classe da burguesia continuará.
Com um discurso demagógico, com a velha receita – utilizada anteriormente desde 1936 até 1982 pelo PNR-PRM-PRI - da unidade nacional, ou seja, colocar-se acima dos antagonismos sócio-classistas, assumir-se como uma opção interclassista que representa por igual explorados e exploradores, ricos y pobres, burgueses e proletários, López Obrador catalisou o mal-estar gerado por 36 anos de políticas de choque privatizadoras que reduziram ao mínimo os direitos sociais, sindicais, democráticos. A gestão neoliberal dos governos de Miguel de la Madrid, Carlos Salinas, Ernesto Zedillo, Vicente Fox, Felipe Calderón e Enrique Peña Nieto, em conjunto responsável pela destruição das terras comunais (ejido), pelo despojo de terras, a destruição da educação pública e da segurança social, a privatização das empresas estatais, o empobrecimento acelerado da população que chegou aos 53 milhões, o aumento massivo dos emigrantes, o retrocesso constante do salário face ao aumento incessante do cabaz básico e o custo de vida, o desemprego, e também a violência generalizada desencadeada na chamada guerra contra o narcotráfico, que se estende já por mais de dez anos, com saldo de mais de 200.000 mortos e desaparecidos; Este cúmulo de agravos gerou uma latente insubmissão operária e popular, com diferentes manifestações nos últimos anos. Contudo, isto foi temporariamente controlado sob as ilusões de uma mudança da coligação obradorista. Mas a aspiração de solucionar os problemas essenciais da classe operária e dos sectores populares será defraudada; pois da mesma forma que no seu Projecto Alternativo de Nação, seus discursos e opiniões, suas alianças, já como Presidente Eleito López Obrador ratificou as medidas que definem um claro contorno ao seu sexênio: autonomia do BANXICO, disciplina financeira e fiscal, respeito pelos compromissos com os bancos e organismos financeiros internacionais, e nenhuma expropriação ou confiscação. Também confirmou que a sua luta contra a pobreza se baseará em paliativos, em medidas assistencialistas à velhice, aos deficientes e bolsas para os estudantes. O que o coloca na situação de quem quer atender com aspirinas um cancro em fase terminal. Não é casual que a garantia que avança em primeiro lugar é a liberdade empresarial, um selo distintivo do projecto de classe que representa.
Outro elemento demagógico do discurso de Obrador é que resolvendo o problema da corrupção se resolvem os grandes problemas nacionais. Mais ainda, López Obrador considera que a corrupção é a base da “desigualdade económica e social”. Insistindo nesta ideia em contraposição ao argumento científico de que a raiz do problema é a exploração do trabalho assalariado e a apropriação privada da riqueza socialmente produzida, ele sustenta como uma inovação teórica de sua criação que a corrupção é a raiz dos problemas do México. Com honestidade e austeridade poderá branquear, maquilhar o capitalismo, mas nenhum problema terá solução enquanto no conflito capital/trabalho a balança se incline pelo lucro e a acumulação a favor da burguesia. Atenuar os problemas, apagar o fogo, aplicar controlo de danos, é a tarefa com que se compromete López Obrador, para assim garantir a estabilidade do sistema num período de turbulências, desmobilizando aqueles que votaram por uma mudança e procurando um refluxo de largo alcance na luta social.
Outro assunto doutrinal que não podemos passar por alto é a sua concepção sobre o Estado e suas funções, reivindicando a ideologia burguesa da Revolução Mexicana do Estado acima das classes sociais, como expressão representativa da cidadania, de “ricos e pobres”. Essa fórmula já serviu anteriormente à burguesia para governar e construir consensos sociais, ou seja, identificar os explorados com os interesses dos seus exploradores.
Uma ideia que se reforça com o triunfo de Obrador é a da “transição democrática”. Na voz das centrais empresariais, dos seus escribas e órgãos, a ilusão de que o poder estatal exercido sobre os trabalhadores dimana do próprio povo tem a sua “demonstração” numa terceira mudança de Partido que determine a composição do gabinete e exerça o poder executivo. O Partido, o governo, a gestão mudaram, mas o Estado não. Este discurso esconde o facto de que independentemente da mudança de Partido as próprias Centrais empresariais concentram o poder económico, e que através desse poder económico determinam a realidade do país. Menção ainda a que dirigem através de uma miríada de quadros colocados ou cooptados por eles as funções do poder estatal, que este Estado não tomará medidas que substancialmente se oponham aos seus interesses e que sem afectar os seus interesses é impossível a melhoria para as condições de existência dos trabalhadores. Por exemplo, para além do entorno honesto do mandatário em questão, o que ocorrerá com uma manifestação palpável como o facto de o IMSS ou o INFONAVIT aceitarem que as empresas reportem salários mais baixos que os reais? Esta corrupção vai extirpar-se por decisão do executivo?
Sob essas concepções, tomando em conta a experiência histórica e as leis do capitalismo, será necessário para garantir a “liberdade empresarial”, para cumprir os seus acordos com os monopólios e segundo o seu critério interclassista convocar pactos ou acordos operário-patronais, em que a classe operária terá que apertar o cinto para que o capital maximize os seus lucros. Segundo essas concepções, recuperar os direitos laborais e sociais não é prioritário e são reivindicações que devem ir para o arquivo. O PCM lutará juntamente com os trabalhadores por derrubar a reforma laboral aprovada pelo Pacto por México em 2012.
Carlos Salinas e López Obrador coincidiram em que é a hora da reconciliação nacional, e como um sucesso inédito aplaudido pela opinião pública, os candidatos Meade e Anaya reconheceram pronta e graciosamente o triunfo de Obrador. De que se trata nesta pantomima? Em primeiro lugar, que as disputas interburguesas se dirimem por agora em quadros institucionais, e de que é hora de cerrar filas para superar a crise económica e de dominação. Essas reacções não são uma surpresa para os comunistas, que anteriormente às eleições na nossa Conferencia Política expressamos que a burguesia tinha já escolhido permitir um governo da nova social-democracia para administrar os seus interesses e para superar os conflitos que enfrenta. O mal-estar, a inconformidade, as condições objectivas de fome, desemprego, miséria, exploração, insalubridade, baixos salários, emigração, feminicídios e centenas de milhares de mortos, tiveram expressões que demonstram que existe uma disposição da classe operária e dos sectores populares de ir mais além: os protestos por Ayotzinapa, os protestos contra o «gasolinazo», as centenas de conflitos que confirmam uma invariável e crescente tendência para a insubmissão. E esse é um dos significados da eleição de Obrador, a recomposição da hegemonia burguesa, conseguindo que uma parte importante da vontade popular identifique erroneamente os seus interesses com os dos seus opressores e exploradores, com a mediação da nova social-democracia, que a partir de agora assume a nova etapa da junta que administra os interesses do capital no nosso país: o Estado mexicano. Não se trata de uma derrota do “sistema político” por parte de AMLO é, pelo contrário, a sua tábua de salvação com a unidade nacional e a reconciliação nacional, que na realidade significa proteger a legalidade burguesa e o sistema de partidos actual ante a deslegitimação e o ódio que tinham granjeado.
Tomamos nota de que uma franja dos sectores populares decide pela primeira vez expressar-se politicamente; vários milhões que não tendo outra opção nos boletins de voto decidem exercer pela primeira vez o voto, participar de alguma maneira na vida política. Não é nosso interesse que desiludidos regressem ao apoliticismo. Somada a boa parte da massa de votantes em Obrador, expressam hoje assim uma vontade de mudança e manifestam que estão fartos, sem assumirem necessariamente o projecto de Obrador. Temos o dever de explicar massivamente a proposta comunista do poder operário como saída objectiva e necessária para os grandes problemas nacionais. Sobre essa franja de população proletária declaramos abertamente que o nosso interesse radica em que não se imobilize, que ultrapasse o pórtico da participação política e prossiga em frente com a luta por impor os seus interesses em conjunto com a classe operária.
Da mesma maneira que contra Peña Nieto, a nossa luta prosseguirá contra o Estado burguês continuado no governo de López Obrador. Apelamos aos trabalhadores:
• A lutar por reconquistar os contratos colectivos, a restabelecer pela via dos factos o direito à greve, o direito à sindicalização, à escala móvel de salários, a pôr fim aos impostos sobre o trabalho. A reverter a reforma laboral e a reforma educativa.
• A lutar por pôr fim ao sindicalismo subserviente, a terminar com as cacicagens no movimento operário, à sindicalização massiva, a unidade sindical, a reconstrução do movimento operário a partir de posições classistas.
• A lutar por recuperar aposentações e pensões dignas, e pôr fim às nefastas Afores. A fortalecer a segurança social.
• A lutar pela garantia por parte do Estado de habitação, segurança social e saúde para todos os trabalhadores, formais e informais.
• A lutar pela expropriação de todos os bens mal adquiridos, resultados do processo privatizador, e pelo controlo operário nos meios de produção concentrados. Pela nacionalização da banca, do comércio exterior, e pelo controlo de câmbios.
• A lutar pela extirpação de raiz de toda a rede económica e política base da indústria do narcotráfico, que assassina, faz desaparecer e destrói as famílias operarias.
• A lutar por romper com o TLCAN e com todo acordo com o FMI, BM.
• A lutar por cancelar a dívida externa.
• A exigir a apresentação com vida dos normalistas de Ayotzinapa e os milhares de desaparecidos, e castigo aos culpados, o que passa necessariamente por castigo a Peña Nieto e Ángel Aguirre, bem como os responsáveis por terem delegado no governo de Guerrero. Por justiça face a todos os crimes do Estado cometidos nas últimas décadas.
• A lutar pela defesa incondicional dos migrantes centro-americanos no México e mexicanos nos Estados Unidos.
• Pela unidade da classe operária com objectivos e bandeiras políticas independentes para configurar uma poderosa frente anticapitalista e antimonopolista pelo derrubamento do capitalismo, pelo poder operário e o socialismo-comunismo.
O Partido Comunista de México, reiterando a sua independência face a qualquer opção burguesa, refutando o engano de que se esteja produzindo uma mudança à esquerda, lutará cada dia pelos objectivos e interesses da classe operária, sem nenhuma ilusão no governo de Obrador.
Esta primeira análise sobre o novo governo será aprofundada no XVII Pleno do nosso Comité Central a reunir-se em breve e no nosso VI Congresso que se realizará na Cidade de México nos dias 3, 4 e 5 de Agosto.
Proletários de todos os países, uni-vos!
A Comissão Política do Comité Central