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Diário Liberdade
Sexta, 11 Outubro 2019 01:20 Última modificação em Quinta, 24 Outubro 2019 01:12

Equador: Lenine contra Lenine

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País: Equador / Direitos nacionais e imperialismo / Fonte: Resistir

[Carlos Aznarez] A insurreição sempre foi uma arma dos povos humildes, desses condenados da terra dos quais falava Frantz Fanon.

É uma alternativa necessária e um espelho no qual há que olhar obrigatoriamente quando chega o momento em que se esgotam as possibilidades de diálogo com os de cima e os de baixo movem-se a partir da esquerda. Um belo dia, os humilhados e despojados gritam um contundente "já basta!". A partir desse momento tudo se torna possível, inclusive até mesmo a tomada do poder.

Em termos de prática política, também significa que a luta de classes passa a ocupar um lugar preponderante e, por mais que queira ocultar, explode com toda a sua força e abala os fundamentos dos "palácios de inverno". Isso é precisamente o que hoje está a ocorrer no Equador. Acabaram-se o panos quentes, as desculpas e a mentiras com que o governo de Lenine Moreno tentou "fazer tempo", enquanto preparava o pacote de medidas que lhe impôs o Fundo Monetário Internacional. Isso significa que, chegado o momento, aqueles aos quais se vende a alma exigem que se pague portagem e que não se hesite em por em marcha o pactuado.

Ajoelhado, submetido e vergonhosamente afastado dos seus princípios (se é que alguma vez os teve), Moreno executa o que lhe ordena Washington e, se tem que matar, mata com total impunidade. Por vezes fazem-no a tiros (o Haiti é um exemplo semelhante) e outras, como na Argentina e no Brasil, também acrescentam a agonia que provoca o desemprego, a pobreza extrema, a perda de soberania.

Contudo, o povo equatoriano é um osso duro de roer. Por coisas como estas que hoje ocorrem, já derrubou vários governantes, tão corruptos e criminosos como o referido Moreno. O último deles foi Lucio Gutiérrez que perdeu, por submeter-se ao império e seu ditames, a possibilidade de conduzir uma Revolução operária-indígena e camponesa. Terminou a sua gestão abruptamente, qual lacaio da burguesia, em meio a um grande levantamento popular que provocou sua fuga para os telhados do Palácio do Governo, de onde se afastou para sempre ao entrar num helicóptero. Algo que Moreno certamente deve ter na sua memória quando decidiu abruptamente mudar a Casa do Governo de Quito para Guayaquil, no calor da vanguarda de manifestantes que começaram a cercar o Palácio de Corondelet.

Agora as cartas estão lançadas para este mau governante, uma vez que dezenas de milhares de indígenas, operários, estudantes, vão ocupar Quito e também Guayaquil, exigindo não só que se revogue o pacote fundomonetarista como que se vá quem ordenou disparar contra o povo, quem assegurou a impunidade dos polícias que lançaram três jovens manifestantes da ponte de San Roque, no centro histórico de Quito. Esse homem que chegou ao governo graças à ingenuidade de Rafael Correa e a seguir traiu-o como um Judas vulgar.

Por outro lado, o levantamento popular e a consequente marcha indígena-camponesa gerou uma corrente de simpatia em todos os povoados pelos quais vai passado. Tanto é assim que, até os mais tímidos ou descomprometidos, lançam-se às ruas para demonstrar que estão dispostos a ser protagonistas deste momento histórico. Fazem-no com a alegria que decorre de juntarem-se aos seus iguais, entoar as palavras de ordem do movimento e demonstrarem uns aos outros que "o povo unido jamais será vencido". Mas também com a cólera suficiente que lhes permitem estarem convencidos de que já é hora de terminar com esses politiqueiros apoiantes de uma democracia burguesa com que a cada quatro anos os enganam.

Por isso não é estranho que, pelo menos os indígenas da CONAIE e os trabalhadores do FUT [Frente Unitario de los Trabajadores] acrescentem aos seus cânticos o muito conhecido "que se vayan todos". Para que isto realmente ocorra, há que ter alternativas que não conduzam uma eventual vitória a um beco sem saída, onde outros que não representam seus interesses fiquem – como aconteceu tantas vezes – com o ganho de muitas lutas e sacrifícios, ou de por sobre a mesa a perda da liberdade e até as mortes pela repressão. Isso e outro temas semelhantes é o que agora, provavelmente, estará em discussão entre as diligências desta gigantesca revolta na qual, entre outros, o legado do autêntico Lenine, o iluminador de tantas batalhas do proletariado universal, e também o do Comandante Che Guevara, possam ajudar a derrotar esta caricatura de governante cipaio. Um governante que não só não foi fiel ao seu nome como, pela sua cobiça e submissão ao império, quer condenar seu povo à miséria, causando-lhe a maior dor possível.

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