Através dos discursos e frases que se preocupam em forjar uma verdade, mesmo sem consegui-la, Michel Temer se fundamenta em torno de certa palavra repetida em seus breves e pitorescos discursos: eficiência. De antemão, é preciso afirmar que o neoliberalismo se firma diante da sociedade por meio de geleias-gerais discursivas. No Brasil, buscou-se um "slogan’’ ainda da república nada republicana, como "Ordem e Progresso’’, unida ao traje de uma ética do trabalho para não se pensar em crise e delineada com a ideia de que seu governo seria a “democracia da eficiência”. Ora, o que vimos durante alguns meses de seu mandato foi a máxima força para tornar o processo do golpe algo efetivo, não importando o alargamento desse fosso rumo ao fim dos limites dos poderes do Estado, flertando com o Estado de exceção nas perseguições a lideranças políticas, perseguições essas travestidas de legais, mas fora da norma, munidas somente por decisões de juízes, promotores e parlamentares. Por um lado, o simbolismo das geleias-gerais teve algo de verdadeiro, ao menos a intenção fora esta, pois é imaginável que para sustentar um processo duro e rápido como o afastamento da presidenta era preciso ao menos ser eficaz em seus meios. Porém, em certa medida os resultados foram inversos, as tensões políticas geradas pós-golpe demonstraram que as forças dominantes que aceitaram o processo não tinham unidade na ação, do tipo como dividir o dinheiro após do roubo?
Do outro lado da moeda, o povo. Através de uma política novelizada por uma mídia que tenta a pesados custos sustentar a imagem já morta do presidente, assistimos o pontapé na constituição através das emendas (PEC’s), pontapés mais uma vez travestidos de constitucionais e democráticos. A força da eficiência entra em questão: para garantir aos rentistas os seus juros, além do pagamento já certo da dívida ainda querem a certeza dos exorbitantes juros, o governo consegue aprovar seu primeiro pacote, mesmo alertado nacionalmente e internacionalmente do caráter perverso e contrário aos interesses nacionais e até mesmo ao “crescimento econômico” que a tal PEC 55 traria. Independente das manifestações, das diversas ocupações estudantis e protestos, o Congresso aprovaria a medida, justificando como necessária, independente da contrariedade popular, assim fez também Temer, que utilizou de sua impopularidade a ferramenta essencial para os atropelos de seu governo, uma vez que não seria mais candidato, era a hora de cumprir os propósitos do golpe.
A ilegitimidade política que corre mundo afora, nos países centrais a extrema-direita com reais possibilidades eleitorais, e um ressurgimento endurecido do neoliberalismo na América Latina, dialoga diretamente com a proposta política globalizatória desde fim do século XX. O povo, que não encontra meios de falar por si próprio, vislumbra em certos países um endurecimento nacional, buscando nos antepassados quase míticos ideias como: grande América; o retorno da categoria povo nacional, apesar de esvaziada; a xenofobia, etc. Por aqui a ilegitimidade se dá pela não identidade com o governo atual, onde há uma tentativa de forjar uma verdade, porém o diálogo e conexão com os interesses populares se mostram vazios. Vê-se, portanto, uma opinião pública forçada que cada vez mais não se confunde com as pautas populares. Os jornais forçam a previdência privada, tentam por fim a tecla de que 2017 seria um ano de recuperação brasileira, quando na verdade todas as apostas do governo nas medidas nos distanciam cada vez mais disso.
Com um desemprego crescente, um arrocho salarial ainda maior, com vistas para uma reforma trabalhista severa, nem o mais liberal dos economistas clássicos apostaria numa recuperação do país. Enquanto o fosso se alarga, o distanciamento político do governo frente aos interesses nacionais se demonstra já suicida, cabe agora não permitir que o suicídio se dê em prol de interesses ainda mais duros e dominantes, falo de uma eleição indireta. Esperamos, dessa forma, que as tensões de 2017 culminem em muita luta popular contra o golpe e os golpistas.