às práticas cotidianas de machismo, racismo, sexismo, lesbofobia, homofobia, transfobia e travestifobia, que se repetem diariamente dentro da instituição. Não é natural ter medo de ir ao banheiro sozinha! Não é natural ter medo de ir sozinha ao gabinete do seu professor! Não é natural andar acuada pela Universidade com receio de frases ofensivas!
Reconhecemos que a UFG evoluiu significativamente, em especial no decorrer desta última gestão, diante do pioneirismo na aprovação da resolução que garante o uso do nome social por pessoas transexuais e travestis, bem como na aprovação de cotas para pessoas negras nos programas de pós-graduação. Mas reconhecemos também que há ainda um longo caminho a ser percorrido se queremos fazer da UFG um espaço onde as pessoas possam andar de cabeça erguida, sem medo de práticas discriminatórias, e de violência pela sua cor, sua identidade de gênero ou mesmo sua orientação sexual.
Claramente, e como por várias vezes ressaltados pelos colegas gestores, esse não é um problema apenas da UFG, é um problema de generalizado que assola toda uma sociedade que se estrutura hierarquicamente a partir de diferenças de classe, raça e gênero. Mas isso não exime a nossa responsabilidade sobre o espaço que ocupamos. Remetendo e indo mais além do pensamento de Lukács em seu pertinente e sincero texto, Meu Caminho Para Marx, a nossa posição nas lutas sociais determina amplamente a forma como assumimos o feminismo, o marxismo, e todas as vertentes críticas que se dedicam a uma compreensão da realidade social, mas por outro lado, todo novo progresso nessa adoção nos faz aderir cada vez mais a práxis das lutas emancipatórias e redunda beneficamente no aprofundamento da nossa relação com essas leituras críticas do todo social.
Ademais, não podemos desconsiderar a atual conjuntura política do país. Um golpe foi dado! E como bem enfatizado pelo nosso Pró-reitor de Graduação durante o Ciclo de Palestras na última quarta-feira, dia 01/06/2016, temos inimigos que estão fora da Universidade. Recentemente um estuprador confesso foi recebido pelo Ministro da Educação, e nesse mesmo contexto diversas pautas que visam o retrocesso das mais variadas conquistas sociais permeiam os espaços de tomada de decisão do nosso país.
O cenário nos assusta! E, portanto, não podemos desconsiderar a relevância do espaço universitário nesse contexto. Sabemos que ele foi fundamental para uma articulação estudantil entre os anos de 1960 e 1970, justamente durante um período em que o Brasil se situava em um regime ditatorial. Destarte, temos muito a perder se nos depararmos agora com uma universidade que não nos garante uma seguridade de livre pensamento, de livre articulação estudantil e, principalmente, que não deixe clara a sua posição em relação ao atual cenário político do país. Precisamos e queremos saber qual a posição da reitoria nesse momento.
Entendemos que uma gestão que se omite em relação à reprodução de práticas discriminatórias e que afirma, como nos afirmou o Pró-reitor de Graduação durante o já citado Ciclo de Palestras, que essas demandas não interessam toda a coletividade da UFG, que espaços como o curso de formação docente são disputados e que, por isso, é “difícil levar essas propostas ali”; ou mesmo que afirma que a universidade não pode se responsabilizar pela educação orientada para a paridade de gênero, isso nos preocupa!
Se os inimigos realmente estão lá fora, e aqui somos aliados, queremos que isso se torne claro aqui hoje. Mas que isso não se confunda. A Frente Feminista Contra o Assédio na UFG pretende, também, nesse momento, deixar claras suas orientações. Existe uma prática comum, e não menos discutida, que diz respeito a relação entre movimentos sociais e organizações estatais. Não estamos aqui para cobrar reuniões mensais com a reitoria. Não cabe a nós, movimentos sociais, resolver qualquer questão dentro da UFG. Não somos gestores e, por isso, respondendo à afirmação que nos foi colocada na última reunião, com toda razão, Sr. Pró-reitor, não entendemos de gestão e não é nosso dever nesse momento entender. Há um nome para reuniões mensais entre organizações estatais e movimento sociais, há um nome para quando movimentos sociais são direcionados a trabalhar “colaborativamente” com agências estatais, é denominada cooptação de movimentos sociais e sabemos exatamente a que isso leva. Basta relembrarmos aqui a famosa e brilhante tese proferida por Robert Michels denominada “Lei de Ferro da Oligarquia”, quanto mais próximo e arraigado a estrutura burocrática, mais a organização vai se tornando um fim em si mesma, e deixando de ser um meio para lutas sociais.
Não poderíamos deixar de mencionar o quanto nos foi cobrado sobre o enfraquecimento do movimento estudantil e sobre uma necessidade de uma articulação conjunta da esquerda contra o atual avanço de um golpe no país. Mas gostaríamos de relembrá-los que a dita “falta de união” da esquerda não foi por acaso. A esquerda se divide, e isso pode ser enumerado pelos mais diversos exemplos históricos, quando ela não admite a interseccionalidade das demandas sociais.
Não se discute, desse modo, a relevância da necessidade de uma união entre a esquerda, mas de que modo se pretende que ela aconteça. Pois, é evidente que união não seria a palavra exata para descrever uma relação em que não se considera devidamente todas as formas de opressões e exploração social, ou que pretende simplesmente reduzir o poder de contestação dos movimentos sociais, de suma importância para estruturação de um ambiente democrático, a uma extensão do aparato burocrático.
Queremos, dessa forma, que a reitoria se disponha a avançar na resolução das demandas estudantis, pois isso afirma não só um relevante avanço na união entre a esquerda, mas principalmente contribui para a que universidade possa continuar exercendo um papel fundamental na realidade brasileira.
A Frente Contra o Assédio na UFG, dessa forma, reivindica que a reitoria atenda as seguintes demandas:
1. OUVIDORIA:
1.1. Uma melhor estruturação do site da ouvidoria, o completo anonimato não está explícito no site e precisa ser amplamente divulgado;
1.2. A UFG precisa se comprometer com o desenvolvimento e implementação de uma ampla campanha sobre assédio e de incentivo as denúncias;
1.3. É necessário um maior investimento na ouvidoria, visto que as propostas acima viabilizariam um aumento das demandas recebidas e ela precisa estar preparada para atende-las; e Sobretudo, queremos uma posição clara da reitoria no que tange à ouvidoria e um comprometimento imediato com a questão, pois, ao mesmo tempo em que nos afirmam que precisam de denúncias para tomar providências, nos dizem que se todas as denúncias forem feitas a ouvidoria não suportará as demandas.
2. SINDICÂNCIA:
2.1. Exigimos que a UFG se comprometa a estabelecer prazos sobre o processo de sindicância. Não há prazo entre fazer uma denúncia e a abertura de sindicância. É absurdo que uma etapa do processo não tenha prazo; e
2.2. Nós discentes, queremos acompanhar ativamente todas as etapas das sindicâncias. Não queremos ser passivos somente denunciando e aguardando uma resposta da reitoria. Entendemos, portanto, a necessidade da UFG se comprometer com uma mudança no processo de sindicância, principalmente em termos de transparência do processo.
3. PROJETOS DE PREVENÇÃO:
3.1. A reitoria deve fazer intervenções físicas em todas as salas de aulas através de cartazes, no combate ao assédio, bem como, falas sexistas, racistas, machistas, lgbttfóbicas, e toda e qualquer forma de discriminação, como já fazem nos banheiros com frases reflexivas. Para enfatizar a relevância dessa campanha, gostaríamos de relatar o caso da faculdade de filosofia, onde os cartazes colados pela Frente Feminista Contra o Assédio, com a seguinte frase proferida por um professor do departamento em sala de aula, “feminista até acha que é gente”, foram retirados e rasgados por diversas vezes. Entendemos que, esse caso é sintomático e explicita a situação a qual estamos expostas;
3.2. Consideramos uma medida razoável e importante a inclusão de placas em todos os banheiros da UFG identificando “Masculino Cis e Trans” e “Feminino Cis e Trans”;
3.3. Reivindicamos que a reitoria se comprometa com uma capacitação de seus funcionários, dentre técnicos e docentes, orientada para paridade de gênero e diversidade sexual; e 3.4. Exigimos, também, um comprometimento da UFG em orientar seus estudantes sobre paridade de gênero e diversidade sexual. Considerando o artigo 207 da Constituição brasileira que explicita que “as universidades gozam de autonomia didático-científica, administrativa e de gestão financeira e patrimonial, e obedecerão ao princípio de indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão”, entendemos que não existe qualquer inviabilidade jurídica por parte da Universidade Federal em acrescentar ao artigo 4 do RGCG um 4º inciso em que considere que, “em qualquer caso, os cursos de graduação estabelecerão, em seus respectivos PPCs, conteúdos disciplinares ou transversais orientados à paridade de gênero, à diversidade sexual e à erradicação de práticas de violência física ou simbólica contra as mulheres”.
Por fim, deduzimos que, se há viabilidade de ordem jurídica e administrativa para tais ações por parte da reitoria, os únicos motivos para que essas mudanças não ocorram são políticos. E mais uma vez, portanto, gostaríamos de ressaltar que, precisamos deixar clara qual a posição política desta gestão!
Goiânia, 08 de junho de 2016