Como apontamos recentemente, há dentro do judiciário diferentes visões sobre como conduzir a situação política. Gilmar Mendes segue procurando blindar o governo golpista, e portanto se mostra bastante descontente com as medidas tomadas pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot, tanto no que se refere a seu pedido de abertura de processo contra Aécio Neves quanto, principalmente, seu vazamento mais recente das gravações comprometedoras de Sérgio Machado e o pedido de prisão para a cúpula do PMDB.
Nesse momento, a bola está com Teori Zavascki, que deve decidir sobre o pedido de prisão aos caciques peemedebistas feito por Janot. Nas mãos de Janot há uma incógnita: se as gravações que revelou são todo o poder de fogo que tem contra os políticos do PMDB, isso não constitui material suficiente para derrubá-los. Mas existe a grande probabilidade que outros materiais ainda mais escandalosos estejam na manga do procurador, aguardando a decisão de Zavascki. E portanto, pesa sob a mesa de Janot decidir sobre avançar ou não sobre um pilar de sustentação de todos governos, e portanto do regime, desde 88.
Se a linha de Janot prevalece, e a Lava Jato avança sobre políticos de peso do PSDB e PMDB, então ela ganha mais credibilidade, mas a custo de um profundo debilitamento na própria credibilidade do governo golpista, que já está por seus próprios feitos metido em uma série de recuos e pequenos escândalos em um número impressionante para tão pouco tempo de atuação. Suas debilidades vêm dos escândalos de corrupção e da política diferenciada que parte do “partido judiciário” e da “mídia” tomam, pela velocidade dos ataques que implementa, e por suas contradições com o movimento de massas.
Enquanto isso, o “partido da mídia” se mostra também cauteloso quanto à saída aventada por Janot. E mesmo Merval Pereira, que destoando dos editoriais saudava um novo tempo político, logo depois se conteve e adotou um tom mais cauteloso; implodir o sistema político, seguir a Lava Jato mas não pela via de novas eleições, mas de sangrar e conter, fazer tudo e ao mesmo tempo preservar o governo Temer.
Renan, cobiçado por todos
O fato é que até o momento parece pouco provável que Zavascki decrete a prisão e, caso isso ocorra, menos provável ainda (salvo alguma “bomba” que Janot esteja segurando) que a prisão de Renan seja aprovada pelo plenário do Senado, sem o que o pedido do STF não se efetiva. Se consolidaria a manobra de Janot como um passo maior do que as pernas. Colocando em xeque uma instituição chave em todo último período, o Ministério Público, abrindo uma crise nesta instituição, ou por outro lado se Janot saí vitorioso, entre esta instituição e o congresso. Tudo isso em meio a uma batalha crucial em meio à crise nacional, a votação definitiva do impeachment no Senado, conduzida por Renan.
Sendo assim, seguiria sendo Renan o condutor do processo de impeachment e, como tal, uma peça valiosa tanto para o governo quanto para os petistas. Não à toa, logo que foi feito pedido de prisão contra o líder do Senado, petistas e peesedebistas se uniram para o desagravo de “vossa excelência”. Exemplo emblemático foi o pronunciamento do senador Jorge Viana (PT-AC), que assumiria o comando da casa em caso de afastamento de Renan: “Eu queria cumprimentar vossa excelência pela serenidade, firmeza e senso de responsabilidade com que vossa excelência, ainda há pouco, se dirigiu à nação e a todos nós, seus colegas aqui no Senado.” A demonstração pública não sendo suficiente, Viana esteve antes na casa de Renan para lhe prestar solidariedade, e este recebeu também um telefonema de ninguém menos que Dilma Rousseff.
É possível que, se a saída de Janot se fortalece, com uma punição a figuras de peso do PMDB, se fortaleça a alternativa de um retorno negociado de Dilma, com a possibilidade de negociar votos de senadores em troca de uma convocação antecipada de eleições presidenciais; nesse caso, o papel de Renan seria também de grande importância.
Um governo debilitado procura seus melhores amigos para se consolar
Enquanto se desenrola a batalha no partido judiciário pela condução da crise, Temer procurou “deixar de lado” o mau agouro de seus recuos, ministros caídos e vacilações em uma reunião com a FIESP e 150 empresários paulistas.
Esses são o “núcleo duro” de apoio aos ajustes de Temer e à política de austeridade já amplamente declarada pelo seu ministro principal, Henrique Meirelles, que nesse encontro não fez mais do que ressaltar seu compromisso de aplicar duros ataques aos trabalhadores e aos direitos sociais para garantir o salvamento dos lucros da burguesia.
Temer, por sua vez, deu um verniz retumbante com sua “bela oratória” ao discurso de ajustes de Meirelles, e louvou a “democracia da eficiência”, em outras palavras, das privatizações, do arrocho, da “pacificação” dos descontentes custe o que custar pelo “bem da nação” (leia-se, do empresariado).
PT e as centrais sindicais aliadas a ele continuam procurando o caminho da “oposição comportada”
Conforme já prevíamos e denunciamos diversas vezes, os petistas que choram as mágoas do golpe continuam procurando fazer de tudo para aparecer como uma “oposição responsável” para a burguesia. Mantém uma fachada minimamente “de luta” para tentar não aparecer como excessivamente passivos para um setor mais duro de sua base, mas a verdade é que ninguém mais além dos próprios burocratas sindicais dá a menor credibilidade para suas bravatas.
Uma nova prova dessa imensa passividade é a (não) preparação do 10J, um dia que supostamente seria de protestos contra o governo golpista em todo o país, mas no qual mal se ouviu falar pela boca dos sindicatos e centrais, poucos lugares de trabalho terão paralisações. Absolutamente nenhuma preparação para que a classe operária ou a juventude se colocasse em cena.
Em um cenário que vemos diversas lutas expressivas se colocando em ação, como as importantes lutas da educação protagonizadas por secundaristas ou a greve das universidades estaduais paulistas, e que o espírito de combate se mostra numa explosão por vezes espontânea, como nas dezenas de milhares de mulheres que foram às ruas contra a cultura do estupro, dizer que é criminoso o papel que vêm cumprindo as direções governistas chega a ser um eufemismo.
A entrada em cena da juventude e da classe trabalhadora de forma independente e com seus próprios métodos de luta seria a única forma de dar uma saída progressista para essa crise política, que passasse por cima das alternativas igualmente reacionárias das distintas alas do judiciário, dos planos de ataque do governo golpista ou de uma volta à miséria do governo petista e sua subserviência aos seus ex-aliados de direita, estratégia para qual todos os cálculos políticos de Lula se submetem, tudo para ganhar o voto de um punhado de senadores. Contudo, para isso é necessário passar por cima desse imenso obstáculo que são as burocracias sindicais e estudantis encasteladas em seus a CUT, CTB, UNE e outras entidades e que colocam todas as suas forças para paralisar as lutas.
A saída política de fundo deve partir das lutas contra os ataques, com a classe trabalhadora na linha de frente e a importante participação dos setores mobilizados hoje, como sem teto, indígenas, juventude e mulheres, para podermos construir uma Assembleia Constituinte Livre e Soberana pautada nessas lutas. Só assim poderemos varrer esse regime apodrecido e corrupto, que serve como "testa de ferro" dos interesses empresariais e é "julgado" por um judiciário tão podre quanto ele e com os mesmos interesses burgueses por trás de si. A derrota a esses ataques e a resposta aos nossos problemas só se dará com uma Assembleia Constituinte na qual possamos lutar por saídas nossas, em que coloquemos propostas que de fato atendam as necessidades do povo pobre e trabalhador.