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Quinta, 30 Junho 2016 00:34 Última modificação em Domingo, 17 Julho 2016 17:02

A burguesia e sua atuação ideológica por meio da educação: o Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP)

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País: Brasil / Reportagens / Fonte: Diário Liberdade

Por João Guilherme Alvares de Farias*

Um exemplo flagrante de disseminação de uma ideologia e da concretização daquilo a que ela propõe expressar se deu, por aqui, com a criação do Instituto Brasileiro de Ação Democrática (IBAD) e do Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais (IPES) [1].

Se tais instituições podem ser caracterizadas como a potencialização daquilo que mais havia de perverso e conservador, nos tempos atuais, a criação de “novos” institutos, sob uma roupagem “pluralista” e “democrática”, representam a mais pura manifestação do refinamento pelo qual o liberalismo filtra suas intenções, para colocá-las em prática sem muito alarde, utilizando-se, inclusive, de “respeitados” nomes.

São, em verdade, meios de catalisar a atmosfera de incertezas atuais e dar tratamento às inúmeras questões (crise política, crise econômica, etc.), buscando não favorecer aqueles que mais sofrem com o aprofundamento das desigualdades, mas de capturar essa classe para realizar, com seu apoio, os projetos que beneficiam apenas a burguesia nacional e estrangeira.

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É no recrudescimento da luta de classes que essas organizações buscam manter a acumulação do capital, reproduzindo e aprofundando, ideologicamente, as mazelas do capitalismo, incutindo na classe trabalhadora a necessidade de incorporar e naturalizar as dificuldades e o processo de pauperização constante que atingem esta classe.

Como citou Roger Reys num artigo oportuno referenciado em Gramsci, os intelectuais que agem nessas instituições buscam “impedir o despertar das consciências antes que elas se unifiquem num bloco de poder para a transformação” [2].

Esses institutos cresceram nas últimas décadas no Brasil, financiados, majoritariamente, por grandes monopólios, e não raramente ostentam parcerias com as potências do imperialismo [3].

Alguns deles são mais facilmente verificados, como o Instituto Millenium, o Instituto de Estudos Empresariais, cujo fundador Willian Ling é também um dos diretores do Instituto Ling, e o Instituto Liberal, este último comandado por Rodrigo Constantino.

Outros, porém, atuam de maneira mais sorrateira, de modo que suas ações exigem uma carga maior de atenção e “olhos abertos”.

Dentre aqueles que enquadram-se nessa segunda característica está, por exemplo, o Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP), que cumpre com destreza ímpar o direcionamento social do saber [4].

Fundando em 1988 como um ambiente destinado a refletir sore temas de Direito e Administração Pública, o IDP diz objetivar contribuir com as transformações sociais do país. Como essa contribuição se dá é a questão com que devemos nos preocupar.

O IDP já foi alvo de matérias por sua relação nada esclarecida com o conturbado e controvertido Ministro do Supremo Tribunal Federal, Gilmar Mendes, e sua antiga assessora de gabinete e atual diretora-geral do IDP, Dalide Barbosa Alves Corrêa [5].

Atualmente, Gilmar Mendes é coordenador científico da Escola de Direito de Brasília (EDB), instituição diretamente vinculada ao IDP.

Como dissemos acima, tais institutos ambicionam catalisar a atmosfera de incertezas atuais para imprimir ideologicamente as pretensões próprias da classe que os financiam: universalizar as vontades da burguesia, atuando na alienação das trabalhadoras e dos trabalhadores, promovendo, em última instância, a indiferença desta classe na defesa dos seus próprios interesses.

Em termos concretos, com a erudição que é própria dos “elementos não trabalhadores” [6] e respeitados da burguesia, tais institutos propagam através de fórmulas e citações científicas puras a “necessidade” das trabalhadoras e dos trabalhadores de abdicarem de determinados direitos, sobretudo trabalhista e previdenciário, em momentos de crise do capitalismo, para que “toda a sociedade” possa se salvar dos perigos que dela decorrem.

Nesse sentido, a determinação econômica dá lugar à determinação moral. Como se aceitar as mazelas da crise e a restrição de direitos sociais exigisse a realização, pela classe trabalhadora, da máxima solidariedade. Todavia, essa solidariedade está assentada numa cisão insanável, não passando de uma fantasia.

Assim como os ganhos do capital nos momentos de estabilidade do capitalismo não são compartilhados entre "toda a sociedade", os efeitos da crise também não afetam a todos. Afinal, a tal sociedade não passa de uma representação imaginária que oculta dois grandes termos antagônicos: aqueles que possuem apenas a força de trabalho para vender no mercado versus aqueles que detêm o domínio absoluto dos meios de produção. Por isso, qualquer ideia que verse sobre o desenvolvimento da contradição trabalho X capital, sem colocar em pauta a sua superação, está fadada a potencializar as desigualdades e manter em funcionamento o capitalismo e a exploração do indivíduo pelo trabalho assalariado.

É com essas precauções e cautelas que deve ser recepcionado o Grupo de Pesquisa de Direito do Trabalho recentemente criado pelo IDP, que terá como coordenador o Ministro Ives Gandra Martins Filhos, atual presidente do Tribunal Superior do Trabalho (TST), e sobre quem já discorremos em outra oportunidade por sua nomeação representar elevadíssima ameaça aos direitos trabalhistas [7].

Ives Gandra Martins Filho vem causando polêmica desde o início de sua presidência do TST, sendo objeto de Nota pela Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (ANAMATRA) [8]. Entre suas teses, está a defesa da ampliação dos acordos na Justiça do Trabalho e a reforma ou flexibilização da legislação trabalhista [9].

Entre os financiadores da IDP está a Federação Brasileira de Bancos (FEBRABAN) à qual está vinculada estruturalmente a Federação Nacional dos Bancos (FENABAN), esta última responsável por representar, no âmbito sindical, os interesses patronais.

Para quem não se lembra, foi a FENABAN que ajuizou Reclamação contra a decisão do TST que determinou a utilização do Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial (IPCA-E) em substituição à Taxa Referencial Diária (TRD) nas Ações Trabalhistas, em razão daquela refletir, de fato, “a exata recomposição do poder aquisitivo decorrente da inflação do período” [10].

Em outras palavras, foi a FENABAN, órgão sindical patronal ligado à FEBRABAN, instituição financiadora do IDP, que questionou a aplicação do índice de reajuste monetário mais benéfico para trabalhadoras e trabalhadores que possuem Ações Trabalhistas em tramitação.

Mas não é apenas isso. Em setembro de 2015, o IDP promoveu em sua sede o “II Seminário Internacional de Direito do Trabalho”, evento financiado, entre outros, pelo Grupo JBS Friboi e suas empresas (Vigor e Seara), conglomerado empresarial que é titular do maior número de acidentes de trabalho do país, registrando em 2014 1.800 acidentes, apenas em números oficiais [11].

Que curiosa contradição!

Na mesa, estavam, por coincidência (ou não), os Ministros Gilmar Mendes e Ives Gandra Martins Filho.

Ora, a partir dessas constatações é possível questionar se a pretensão desse tal Grupo de Pesquisa de Direito do Trabalho, de fato, não se alinha à abordagem ideológica a que nos referimos no início dessa matéria.

O lançamento do Grupo de Pesquisa de Direito do Trabalho do IDP está previsto para hoje (30/06), mas o seu programa é tão velho quanto às histerias do Caminho da Servidão e das ilusões de Capitalismo e Liberdade.

*João Guilherme é Integrante do Grupo de Pesquisa Trabalho e Capital/USP. Coordenador do Grupo de Pesquisa Marxismo e Direito.

Notas:

[1] Conferir “Esclarecer e Doutrinar: o Projeto Ideológico do Ipês” http://www.ufrgs.br/alcar/encontros-nacionais-1/encontros-regionais/sudeste/3o-encontro-2014/gt-1-2013-historia-do-jornalismo/esclarecer-e-doutrinar-o-projeto-ideologico-do-ipes/view

[2] “Intelectual burgués e intelectual orgánico: vieja discusión, nuevos problemas” http://rebelion.org/noticia.php?id=195765

[3] Para introdução básica e elementar ao significado de “imperialismo”, ver Vladmir Lenin “Imperialismo: a fase superior do capitalismo”

[4] Sobre o tema Cf. “La educación universitaria en Paraguay en el contexto del modo de producción capitalista: un análisis de caso” https://dspace.unila.edu.br/browse?value=Acu%C3%B1a%2C+Catalina+Isabel+Britez&type=author

[5]“Gilmar, o IDP e o Tribunal de Justiça da Bahia” http://www.cartacapital.com.br/economia/gilmar-o-idp-e-o-tribunal-de-justica-da-bahia-3103.html/ “Vídeo com assessora de Mendes na CPI pode ampliar crise no STF” http://www.vermelho.org.br/noticia/51570-1

[6] Termo disseminado no longa “O Sétimo Satélite”, do diretor Aleksei German, para referir-se às pessoas que compunham a burocracia czarista antes da Revolução de 1917

[7] “Estado, capitalismo, precarização e um ideólogo burguês no Tribunal” http://www.diarioliberdade.org/artigos-em-destaque/404-laboraleconomia/60521-estado,-capitalismo,-precariza%C3%A7%C3%A3o-e-um-ide%C3%B3logo-burgu%C3%AAs-no-tribunal.html

[8] “Entrevista de Ives Gandra da Silva Martins Filho gera nota da Anamatra” http://www.anamatra.org.br/index.php/anamatra-na-midia/entrevista-de-ives-gandra-da-silva-martins-filho-gera-nota-da-anamatra

[9] “Presidente do TST defende flexibilização das leis trabalhistas” http://oglobo.globo.com/economia/presidente-do-tst-defende-flexibilizacao-das-leis-trabalhistas-18766412

[10] “Decisão liminar proferida no STF suspende a aplicação do índice IPCA na atualização de débitos trabalhistas” http://www.migalhas.com.br/dePeso/16,MI228619,91041-Decisao+liminar+proferida+no+STF+suspende+a+aplicacao+do+indice+IPCA

[11] “Friboi, a campeã nacional em acidentes” http://apublica.org/2015/06/friboi-a-campea-nacional-em-acidentes/

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