Nesta série especial, publicada a partir desta segunda-feira (27), o Brasil de Fato discute – em “quatro atos” – diferentes abordagens para pensar o mundo do trabalho na atualidade. Transformações, tecnologia, juventude e saúde foram os temas escolhidos para este conjunto de reportagens.
Com o aumento do desemprego, o nível de cobrança para quem está empregado se intensifica. “Hoje, a exigência ao trabalhador é feita com base na produção, o que gera muita sobrecarga”, avalia a professora Elaine Rabelo Neiva, do Departamento de Psicologia Social e do Trabalho da Universidade de Brasília (UnB).
Nesse contexto, Elaine considera que a informatização e a entrada da tecnologia em todas as áreas trouxeram ganhos reais, como flexibilização dos horários, oportunidade de trabalho remoto (como o home office – trabalho em casa), entre outros, mas também precarizaram a qualidade de vida do trabalhador.
“No final do século passado, as pessoas acreditavam que, hoje, teríamos mais momentos de lazer e menos horas trabalhadas, o que não aconteceu. Trabalham-se cada vez mais horas, não as computadas pelo relógio, mas fora do ambiente de trabalho, levando tarefas para casa, ficando depois do expediente para finalizar projetos. A tecnologia é primordial nisso ao permitir que o trabalho invada a vida das pessoas”, comenta ao citar os grupos do WhatsApp das empresas que permitem que, a qualquer hora e local, o trabalhador esteja “disponível”.
A precarização também é uma marca da atualidade. De acordo com levantamento da Confederação Nacional dos Dirigentes Lojistas (CNDL), quatro em cada dez brasileiros têm emprego informal no Brasil e 71% têm mais de 35 anos. “A informalidade que concede liberdade, mas retira direitos; e a precarização, que faz com que o indivíduo trabalhe com cada vez menos suporte para realizar suas funções também fazem parte desse cenário de novas exigências do mercado, vide a terceirização que nada mais é do que uma forma de precarizar a atividade do trabalhador”, pondera Elaine.
Tecnologia e formação
Cada vez mais se exige agilidade e comprometimento dos colaboradores – como os trabalhadores são comumente chamados –, pois o erro ou a inadequação ficam mais visíveis com a tecnologia.
“Desde o processo seletivo, onde, por meio das redes sociais, um avaliador da empresa consegue determinar as características dessa pessoa, até no dia a dia do trabalho, a tecnologia tem papel fundamental fazendo com que as pessoas sejam mais produtivas e com que as empresas consigam acessar pessoas de regiões mais distantes para solucionar problemas específicos sem maior custo”, diz Glauber Pasqualini, instrutor de informática da Escola Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial de São Paulo (Senai-SP) na Área de Desenvolvimento e Programação de Sistemas. Para ele, em tempos de crise, “a oportunidade está na área da tecnologia”, pois o mercado busca, a todo o momento, melhorar processos para economizar.
Em relação às exigências das empresas, o supervisor de Avaliação Educacional do Senai-SP, Fabrício Ramos da Fonseca, entende que o novo paradigma produtivo requer o desenvolvimento de competências profissionais que superem o modelo fordista de uma educação, voltado à formação para tarefas e postos de trabalho. “Certas características, como ser capaz de se comunicar satisfatoriamente, trabalhar em equipe, decidir com autonomia, pensar estrategicamente, interpretar e lidar com situações novas e resolver problemas, passaram a ser muito valorizadas em adição à expertise técnica”, comenta.
Denis da Silva, 28 anos, formado em 2009 pelo Senai Roberto Simonsen no curso de Eletricista de Manutenção, conta que um dos carros-chefes da escola é justamente a formação do profissional como um todo e, por essa razão, costuma reconhecer outras pessoas formadas na mesma instituição por conta da postura e da qualidade apresentada, para além dos quesitos técnicos. Além disso, ressalta a importância do curso em sua carreira. “Devo toda a minha vida profissional e crescimento ao curso, por conta dele consegui meu primeiro trabalho e oportunidade de ir me estruturando financeiramente para crescer ainda mais”, conta.
A exemplo de Denis, os profissionais vindos de cursos técnicos e profissionalizantes costumam ser absorvidos mais rapidamente pelo mercado por preencherem uma demanda imediata da empresa. “Enquanto o colaborador precisa ser aceito como estagiário ou aprendiz para ter oportunidade de crescer dentro da empresa, ela, por sua vez, quer alguém mais ambientado e preparado”, explica Pasqualini, do Senai.