Se algum mérito tem este panorama tão sombrio, esse é o de ele vir pôr ainda mais em evidência a, há muito óbvia, irrelevância política da CPLP. O “primado da paz, da democracia, do estado de direito, dos direitos humanos e da justiça social”, incluído nos objetivos fundadores da CPLP, é cada vez mais uma brincadeira retórica, posta na oficialidade formal, dita com língua de pau por chancelarias sem vertebração e crescentemente distante da realidade das coisas.
Quando se deparou com a encruzilhada entre os sonhos de um imenso Portugal (ou de um imenso Brasil…) mimético da Francofonia ou da Commonwealth e a frieza de um capitalismo em roda livre ganhador de um nicho qualquer no casino global, a CPLP, pela mão de banqueiros e de construtores civis de aquém e de além mar, escolheu o arrivismo sem alma. A admissão da Guiné Equatorial, uma das mais antigas e odiosas ditaduras do continente africano, como membro de pleno direito da organização em 2014, foi o símbolo maior dessa escolha. A verdade é que esta não era a única alternativa possível à génese lusotropicalista da CPLP. Para além desses dois caminhos, havia também o do estreitamento de laços entre sociedades democráticas capaz de gerar um polo de abordagem civil das crises e de trabalho pela paz estrutural em cada um deles e entre si. Mas essa possibilidade nunca passou disso mesmo.
A prisão política de Luaty Beirão e dos seus companheiros, a podridão institucional de Bissau, as valas comuns da Gorongosa e o ódio de classe do tchau querida tornam o silêncio da CPLP diante da degenerescência da democracia no seu seio numa atitude carregada de significado político. É a confissão de que este passou a ser definitivamente um espaço em que a democracia e a cultura são luxos marginais que as elites dispensam. Obiang, no palácio de Malabo, sorri.
Artigo publicado no diário “As Beiras”, em11 de junho de 2016