Precisamos de 1,4 milhões de pessoal militar no activo e 850 mil reservistas quando o inimigo de momento – ISIS – conta escassas dezenas de milhares? Se assim é parece que há algo radicalmente errado na nossa estratégia. Deverão 55% dos gastos discricionários do governo federal irem para despesas militares e apenas 3% para os transportes quando há mais mortos e feridos americanos devido à falta de infraestruturas do que ao terrorismo? Será que a Califórnia necessita quase tantas bases militares ativas (31, de acordo com militarybases.com), como tem de universidades do Estado (33)? E o Estado precisa de mais pessoal militar em serviço ativo (168 mil, segundo a revista Governing ) que professores nas escolas públicas (139 mil)?"
Steve Lopez, Los Angeles Times.
Registem as minhas palavras: as despesas militares da América levarão a nação à bancarrota. Mas os gastos da América em guerras já levaram a nação a uma bancarrota de 20 milhões de milhões de dólares.
Agora, a administração de Trump está a pressionar por um orçamento 4,4 milhões de milhões de dólares no ano fiscal de 2019 . Um plano que irá acrescentar 7 milhões de milhões de dólares ao já insustentável défice federal durante os próximos dez anos, a fim de manter o império militar dos EUA no exterior e expandir dramaticamente o estado policial interno . Trump também quer que os contribuintes americanos paguem o custo de construção daquela infame muralha fronteiriça .
Na verdade, Trump pode vir a ser considerado, como o analista político Stan Collender advertiu, "o Presidente com maior aumento de défice e dívida de todos os tempos" .
Num rápido esclarecimento: " Um défice orçamental é a diferença entre o que o governo federal gasta e o que recebe . A dívida nacional, também conhecida como dívida pública, é o resultado de o governo federal pedir dinheiro para cobrir anos e anos de défices orçamentais".
Agora, o governo dos EUA está a operar no negativo em todas as frentes: gasta muito mais do que o que obtém (e cobra aos contribuintes americanos) e pede emprestado a governos estrangeiros e à Segurança Social para manter o funcionamento do governo e o financiamento das suas intermináveis guerras no exterior .
É desta forma que os impérios militares fracassam e caem: por expandirem-se até ao limite e consumirem-se até à morte. Assim aconteceu em Roma . Está a acontecer de novo.
Não satisfeito em meramente servir de polícia do mundo, nas últimas décadas os EUA gradualmente transformaram o seu próprio território num campo de batalha com polícias militarizadas e armas mais adequadas a uma zona de guerra.
Desde a tomada de posse, o presidente Trump – tal como os seus antecessores – tem marchado ao ritmo das forças armadas. Agora Trump quer 716 mil milhões de dólares para expandir no exterior o império militar da América e milhares de milhões de dólares mais para contratar polícias, construir mais prisões e financiar mais programas de guerra – às drogas/ ao terrorismo/ ao crime – que corroem a Quarta Emenda Constitucional e não deixam o país mais seguro.
Mesmo as verbas solicitadas para infraestruturas pouco farão para remediar a desintegração de estradas, pontes, ferrovias, rodovias, redes eléctricas e barragens do país.
Não importa em quanto irá recortá-lo, este não é um orçamento que vise aperfeiçoar a União, estabelecer justiça, garantir a tranquilidade interna, providenciar a defesa comum, promover o bem-estar geral ou garantir as bênçãos da liberdade para o povo americano .
Não, este orçamento que visa favorecer os poderosos interesses do dinheiro (militares, grandes empresas e segurança) que controlam o Estado profundo e mantêm o governo preso nas suas garras.
No entanto, a campanha de Trump prometera equilibrar o orçamento e drenar os pântanos da corrupção .
A gritante verdade económica é que basicamente é o complexo militar-industrial – e não os doentes, os idosos ou os pobres – que estão a empurrar os EUA para a falência.
Como mostra o jornalista de investigação Uri Friedman, já há mais de 15 anos que os Estados Unidos têm estado a combater o terrorismo com um cartão de crédito , "essencialmente a financiar as guerras por meio de dívidas, sob a forma de compras de títulos do tesouro dos EUA por entidades baseadas nos EUA como fundos de pensões, Estados e governos locais e por países como a China e o Japão.
A fusão ilícita entre a indústria de armamentos e o Pentágono, contra a qual o presidente Dwight Eisenhower advertiu há mais de 50 anos, hoje talvez represente a maior ameaça à frágil infraestrutura da nação.
Tendo sido cooptada por gananciosos fornecedores de armamento, políticos corruptos e governantes incompetentes, os EUA ao expandirem o seu império militar estão a sangrar o país a uma taxa de mais de 15 mil milhões de dólares por mês (ou 20 milhões por hora) – e isto é só o que o governo gasta em guerras no exterior. Não incluindo o custo de manutenção e de pessoal militar dos EUA nas mais de 1 000 bases espalhadas por todo o globo .
Incrivelmente, embora os EUA constituam apenas 5% da população mundial, têm quase 50% das despesas militares totais do mundo , gastando mais em despesas militares do que as 19 maiores nações seguintes no seu conjunto .
Na verdade, o Pentágono gasta mais em guerra do que todos os 50 Estados federados juntos gastam em saúde, educação, bem-estar e segurança .
As guerras não são baratas.
Embora o governo federal obscureça tanto os seus gastos militares que números exatos são difíceis de obter, sabemos que desde 2001 o governo dos EUA gastou mais de 1,8 milhões de milhões de dólares nas guerras do Afeganistão e do Iraque (isto é, 8,3 milhões por hora ).
Isso não inclui guerras e exercícios militares travados por todo o globo, que se espera aumentarem a factura total para mais de 12 milhões de milhões de dólares até 2053 , incluído as despesas com veteranos e juros de dívidas.
Lembrem-se, estas guerras em curso – crivadas de corrupção, trapalhadas e incompetência – pouco têm feito para proteger o país, enquanto enriquecem o complexo militar-industrial e fornecedores privados da defesa, às custas dos contribuintes.
Recentemente, por exemplo, uma das principais empresas de contabilidade concluiu que uma das maiores agências do Pentágono "não contabiliza centenas de milhões de dólares dos seus gastos" .
Considere-se apenas o facto de que cada soldado deslocado no Afeganistão custa aos contribuintes americanos 2,1 milhões de dólares por ano . Imagine o que poderia ser feito com esse dinheiro se fosse gasto nas necessidades internas aqui no país.
Infelizmente, isso não vai acontecer tão cedo. Não enquanto os interesses do dinheiro em Washington continuarem a tomar as decisões e ter lucros com os despojos das guerras.
A guerra tornou-se uma enorme oportunidade de ganhar dinheiro e os EUA, com o seu vasto império militar, são um dos melhores compradores e vendedores. Não só têm o maior orçamento de defesa , também ocupam o primeiro lugar como o maior exportador de armas do mundo .
O complexo militar-industrial americano ergueu um império insuperável na história pela sua amplitude e alcance, dedicado à perpétua realização de guerras por toda a parte da terra.
Por exemplo, ao erigir um estado de vigilância securitária nos Estados Unidos, o complexo militar-industrial tem perpetuado um império mundial militar com tropas americanas estacionadas em 177 países (mais de 70% dos países do mundo). Neste processo, foram gastos milhares de milhões construindo instalações militares de luxo através do mundo.
Por exemplo, a embaixada dos EUA, construída no Iraque, apelidada de "Fortaleza Bagdade", abrange 104 hectares e possui uma "cidade dentro de uma cidade", o que inclui seis edifícios de apartamentos, um aquartelamento de Marines, piscina, lojas e paredes com a espessura de 4,5 metros O campo Anaconda no Iraque, como muitas bases militares americanas espalhadas por todo o globo, foi estruturado para se assemelhar a uma mini-cidade com piscinas, restaurantes fast-food, campos de golfe em miniatura e cinemas.
Enquanto a maioria dos americanos dificilmente pode arcar com o custo de aquecimento e arrefecimento de suas próprias casas, o governo americano gasta 20 mil milhões de dólares por ano só para fornecer ar condicionado a instalações militares no Iraque e no Afeganistão .
No essencial, o que estamos a fazer é "instalar ar condicionado lá nos desertos do Afeganistão, Iraque e outros lugares", observou o general de brigada reformado Steven Anderson, especialista em logística, antigo chefe logístico do general David Petraeus no Iraque.
Há uma boa razão para que "excessivo", "corrupto" e "ineficiente" estejam entre as palavras mais comummente aplicadas ao governo, especialmente ao departamento de defesa e seus fornecedores. Por exemplo, um estudo do Government Accountability Office descobriu US$70 mil milhões de sobrecustos do Pentágono causados por falhas de gestão. Para colocar isto em perspectiva, equivale a uma vez e meia todo o orçamento anual do Departamento de Estado, de 47 mil milhões de dólares.
A fraude é galopante.
Uma auditoria do governo, por exemplo, descobriu que o fornecedor militar Boeing tem maciçamente sobrecarregado os contribuintes com os custos das peças sobresselentes, resultando em dezenas de milhões de dólares de gastos excessivos. Como observado no relatório, o contribuinte americano paga :
US$71 por um pino de metal que deveria custar apenas 4 cêntimos; US$644,75 por uma pequena engrenagem menor que uma moeda de dez centavos vendida a US$12,51, um aumento de preço superior a 5 100 por cento; US$1 678,61 por outra minúscula peça, também menor que uma moeda, que poderia ter sido comprada internamente no Departamento de Defesa por US$7,71: um aumento de 21 mil por cento; US$71,01 para um delgado pino de metal que o Departamento de Defesa tinha em stock, não utilizados às dezenas de milhares, por 4 centavos, um aumento de mais de 177 000 por cento.
A burla nos preços tornou-se uma forma aceite de corrupção dentro do império militar americano. E se os contribuintes acham que os preços dos combustível são altos, considere-se apenas o que estão sendo forçados a desembolsar, uma vez que as despesas de entrega de combustível para as tropas no exterior são facturadas internamente entre 18 e 30 dólares por galão (4,76 a 7,93 dólares por litro) no Iraque e Afeganistão .
Incrivelmente, apesar dos relatos de corrupção, abuso e desperdício, às mega-corporações por trás de grande parte desta inépcia e corrupção continuam a ser adjudicados contratos militares de milhares de milhões de dólares.
Os argumentos podem mudar para justificar as razões pelas quais forças militares americanas estão no Afeganistão, no Iraque ou em quaisquer outros lugares, mas o que permanece constante é que aqueles que governam estão a alimentar o apetite do complexo militar-industrial.
O que começou em 2001 como parte de um alegado esforço para eliminar a al-Qaeda transformou-se numa mina de ouro para o complexo militar-industrial e o seu exército de fornecedores privados.
Considere-se que o Pentágono em 2008 gastou mais dinheiro a cada cinco segundos no Iraque do que o salário médio anual nos EUA . Mesmo assim o Congresso e a Casa Branca querem que os contribuintes aceitem que a única maneira de reduzir a subida do défice da nação é cortar em programas como a Segurança Social e o Medicare.
Como Martin Luther King Jr. reconheceu, sob um império militar a guerra e os seus lucros tomarão sempre a precedência sobre as necessidades básicas do povo.
Simplesmente, não podemos manter o nosso excessivamente extenso império militar.
"O dinheiro é o novo gorila de 400 quilos" , comentou um oficial sénior da administração envolvido no Afeganistão. "Isto desloca o debate de: "está a estratégia a funcionar?", para "Podemos poupar isto?" Quando se vê as coisas desta forma, o âmbito da missão que temos agora é muito, muito menos defensável".
Ou como um comentador observou: "Hipotecar o futuro do nosso país não deve ser confundido com defendê-lo."
Inevitavelmente, os impérios militares entram em colapso.
Como escreve Cullen Murphy, autor de Are We Rome? e editor-geral da revista Vanity Fair:
" Daqui a um milénio, a América será difícil de reconhecer . Pode não existir como um Estado-nação na forma como existe atualmente – ou até mesmo não existir. Serão as transições futuras graduais e pacíficas ou abruptas e catastróficas? Nossos descendentes irão viver vidas produtivas numa sociedade melhor do que a que vivemos agora? Aconteça o que acontecer, irão os valiosos aspectos do legado da América permanecer através do tecido das civilizações que virão? Será que os historiadores, um dia, terão razão para perguntar: o que fez a América realmente cair?
O problema com que lutamos não é senão um império americano distorcido, com mega-empresas, complexos industriais-militares e de segurança e crescente militarização. Com os olhos postos no domínio absoluto.
Contudo, todos os impérios militares acabam por cair.
No auge de seu poder, até mesmo o poderoso Império Romano não poderia ignorar uma economia em colapso e militares florescentes. Períodos prolongados de guerra e falsa prosperidade económica levam à derrocada. Como o historiador Chalmers Johnson prevê:
"O destino de impérios democráticos anteriores sugere que tal conflito é insustentável e será resolvido numa das duas maneiras. Roma tentou manter seu império e perdeu sua democracia . Grã-Bretanha optou por permanecer democrática e no processo perdeu o seu império. Intencionalmente ou não, o povo dos Estados Unidos já foi levado bastante longe na via de um Império não-democrático".
Gostaria de sugerir que o que temos é uma confluência de fatores e influências que vão além de meras comparações com Roma. É uma união do 1984 de Orwell com o seu sombrio governo totalitário – isto é, fascismo, a união do governo com os poderes corporativos – e um estado de vigilância total com um Império militar que se estende por todo o mundo.
Como temos visto com a militarização da polícia, o crescimento da confiança no militarismo como solução para nossos problemas tanto no interior e como no exterior afecta os princípios básicos sobre os quais a sociedade americana deve funcionar. Devemos ter em mente que um império militar será governado não por nobres ideais de igualdade e de justiça, mas pelo poder da espada. Os militares estão treinados principalmente para conduzir a guerra, não para preservar a paz.
Aqui bate o ponto: se o império americano cair e a economia americana entrar em colapso – e com isto os últimos vestígios da nossa República constitucional – a culpa será o governo e seus orçamentos de guerra de milhões de milhões de dólares. Claro que o governo já antecipou esta ruptura.
É por isso que o governo transformou a América numa zona de guerra, a nação num Estado de vigilância e rotulou "nós, o povo" como combatentes inimigos. Durante anos, o governo tem trabalhado com os militares a preparar-se para agitação civil generalizada provocada por "colapso económico, perda do funcionamento político e da ordem legal , resistência ou insurgência interna deliberada, intensificação de emergências na saúde pública, desastres naturais e humanos catastróficos".
Tendo passado mais de meio século a exportar guerra para terras estrangeiras, a lucrar com a guerra e a criar uma economia nacional aparentemente dependente dos despojos de guerra, os falcões da guerra há muito voltaram sobre nós os seus apetites pelo lucro, trazendo para casa os materiais de guerra – tanques militares, lançadores de granadas, capacetes de Kevlar, metralhadoras de assalto, máscaras de gás, munições, aríetes, binóculos de visão noturna, etc. – e entregando-os à polícia local, transformando assim a América num campo de batalha.
Como deixei claro no meu livro Battlefield America: The War on the American People , esta é assim que a polícia vence e "nós o povo" perdemos.
Há mais de 50 anos, o presidente Dwight Eisenhower advertiu-nos para não deixar que a máquina de guerra conduzida pelo lucro pusesse em perigo as nossas liberdades e processos democráticos. Fracassámos em prestar atenção a esta advertência.
Como Eisenhower reconheceu num discurso na American Society of Newspaper Editors, em 16 de abril de 1953, as consequências de permitir que o complexo militar-industrial empreendesse guerras, exaurisse os nossos recursos e ditasse as nossas prioridades nacionais, vão além da vida.
"Todas as armas que são fabricadas, cada navio de guerra lançado, cada foguetão disparado, representa, no seu significado final, um roubo aos que têm fome e não são alimentados, àqueles que têm frio e não são vestidos. Este mundo em armas não está a gastar dinheiro sozinho. Está a gastar o suor dos seus trabalhadores, o génio dos seus cientistas, as esperanças dos seus filhos. O custo de um bombardeiro pesado moderno é isto: uma escola moderna em mais de 30 cidades. São duas centrais elétricas, cada uma servindo uma cidade de 60 mil habitantes. São dois hospitais totalmente equipados. São umas cinquenta milhas de estradas alcatroadas. Pagamos por um único avião de combate meio milhão de alqueires ( bushels ) de trigo. Pagamos por um único destróier com casas novas que poderiam ter abrigado mais de 8 000 pessoas... Isto não é um modo de vida, no sentido verdadeiro. Sob as nuvens de guerras ameaçadoras, a humanidade está suspensa numa cruz de ferro".
17/Fevereiro/2018
[*] Procurador constitucional dos EUA, fundador e presidente do Rutherford Institute. Seu último livro é Battlefield America: The War on the American People .