Se os Democratas obtiverem a maioria na Câmara de Deputados dia 6 de novembro próximo, como muitos preveem que acontecerá, candidatos egressos do aparato militar e de inteligência podem chegar a corresponder a metade do número de deputados Democratas no Congresso. Controlarão o equilíbrio do poder na câmara baixa do Congresso: para onde penderem, para lá penderá todo o Congresso.
No Congresso, prossegue ativamente um puxa-empurra. Líderes do Partido Democrata recrutam ativamente candidatos com antecedentes de serviço militar ou na inteligência para os locais onde haja boa chance de um Democrata 'demitir' um Republicano, ou para preencher eventuais vacâncias, frequentemente limpando o terreno para alguma "celebridade" recém recrutada.
Caso destacado é o de Elissa Slotkin, ex-agente da CIA que serviu três vezes no Iraque, que foi diretora do Conselho de Segurança Nacional para o Iraque na Casa Branca de Obama e auxiliar top de John Negroponte, o primeiro diretor da inteligência nacional. Depois de ativa participação e envolvimento profundo nos crimes de guerra dos EUA no Iraque, Slotkin mudou-se para o Pentágono, onde, como principal vice-secretária assistente de defesa para assuntos de segurança internacional, suas áreas de responsabilidade incluem guerra de drones, "defesa da pátria" e ciberguerra.
O Comitê da Campanha dos Democratas para o Congresso (ing. The Democratic Congressional Campaign Committee, DCCC) designou Slotkin como uma de suas candidatas top, parte do chamado programa [trad. aproximada] "De Vermelho para Azul" [ing. "Red to Blue"], cujo objetivo é capturar as cadeiras de Republicanos em áreas vulneráveis (nesse caso, o alvo é o 8º Distrito Eleitoral de Michigan, que inclui Lansing e Brighton. O lugar correspondente a esse distrito é hoje ocupado pelo Republicano de dois mandatos Mike Bishop.
A liderança Democrata está promovendo agentes da CIA que sejam veteranos das guerras no Iraque e no Afeganistão. Ao mesmo tempo, esse pessoal tem escolhido o Partido Democrata como seu veículo preferido de manifestação política. Há hoje quantidade muito maior de espiões e soldados tentando obter a candidatura do Partido Democrata do que equivalentes interessados no Partido Republicano. Há tantos, que há um subsetor da campanha eleitoral dos Democratas que, com nossa reverência à revista Mad, bem se pode chamar de "spy vs. spy."
O 23º Distrito Congressional no Texas, que inclui vasto trecho da fronteira EUA-México ao longo do Rio Grande, é palco da disputa pela indicação Democrata entre Gina Ortiz Jones, oficial de inteligência na Força Aérea no Iraque, que depois serviu como conselheira para as intervenções dos EUA no Sudão do Sul e na Líbia, e Jay Hulings. No seu website, Hulings é apresentado como ex-assessor de segurança nacional no Capitólio e promotor federal, cujos pai e mãe foram ambos espiões de carreira a serviço da CIA. O atual representante Republicano, Will Hurd, é ele também ex-agente da CIA, o que implica que todos os eleitores/eleitoras naquele distrito eleitoral que votem serão obrigados a votar em representantes da CIA, tanto na primária Democrata como na eleição geral.
O programa "State of the Union" da CNN do dia 4/3 incluiu um perfil de Jones como uma das muitas candidatas que disputam a indicação do Partido Democrata na primária de 3ª-feira no Texas. A rede a apresentou discretamente como "funcionária pública de carreira". Mas a página de campanha de Jones na Internet praticamente ostenta a capacitação da candidata como espiã, observando que, depois da faculdade, "Gina abraçou a Força Aérea dos EUA como oficial de inteligência, função na qual serviu no Iraque na campanha'Don't Ask, Don't Tell' [o segmento final da frase informa aos interessados que Jones é gay].
Segundo a biografia de campanha da aspirante a candidata, Ortiz Jones teria trabalhado como "conselheira sênior para trade enforcement," cargo criado pelo presidente Obama por ordem executiva em 2012. Depois, foi convidada para o cargo de diretora de investimento no gabinete do presidente da Comissão da Câmara para Comércio dos EUA, onde comandou o grupo que revisou os investimentos estrangeiros para garantir que não houvesse ali qualquer ameaça à segurança nacional. Com tal currículo, se ela não for eleita, sempre poderá alistar-se nos esforços da guerra comercial a que se dedica o governo Trump.
Como esse artigo foi preparado
A Câmara de Deputados dos EUA é atualmente controlada pelos Republicanos, com maioria de 238, para 193 Democratas. Há quatro lugares vacantes, um deles que foi dos Democratas. Para chegar à maioria de 218 votos na próxima legislatura, os Democratas têm de conseguir mais 24 votos.
O Comitê Eleitoral Democrata (DCCC) estabeleceu 102 assentos como prioritários, ou competitivos, incluindo 22 nos quais os atuais deputados não concorrem à reeleição (cinco Democratas e 17 Republicanos), e 80 assentos cujos atuais deputados Republicanos podem ser derrotados na tentativa de se reelegerem, no caso de se confirmares as previsões de pesquisa, de considerável movimento pró-Democratas em Novembro.
Esse website, World Socialist Web Site analisou os relatórios da Comissão Eleitoral Federal preenchidos por todos os candidatos Democratas nesses 102 distritos competitivos, com especial atenção aos candidatos que informaram no registro mais recente, de 31/12/2017, que haviam levantado, pelo menos, cem mil dólares para as respectivas campanhas, o que lhes daria poder financeiro suficiente para concorrer numa disputa apertada em eleições primárias. Além desses, há alguns poucos casos nos quais o candidato tem menos de cem mil dólares, mas não enfrenta desafiante para a mesma indicação, ou o candidato, sempre nome conhecido, lá está por efeito de alguma desistência de última hora, o qual, por isso ainda não tem seu relatório de doações incorporado na Comissão Eleitoral Federal. Esses casos também foram analisados por nós.
No total, são 221 esses candidatos à indicação pelo Partido Democrata à eleição de meio de mandato, dia 6/11, para o Congresso dos EUA nos 102 distritos eleitorais. Cada um deles tem uma página na Internet que oferece detalhes biográficos, que coletamos e examinamos para esse artigo.
Chama a atenção que os candidatos com registro no aparelho militar-de inteligência e de serviço como funcionário civil do Departamento de Estado, no Pentágono ou no Conselho de Segurança Nacional não escondam que estiveram envolvidos – como a maioria deles – nas guerras do Iraque e do Afeganistão. Evidentemente, todos consideram que ter operado como agente da CIA em Bagdá, ou como assassino das Op-Esp do Exército no Afeganistão, ou como planejador de guerra com drones na Casa Branca ou no Pentágono sejam ponto altos de seus currículos, ações louváveis a serem ostentadas, não ocultadas.
¼ de todos os desafiantes do Partido Democrata em distritos nos quais há competição acirrada pelo posto na Câmara de Deputados tem antecedentes nos serviços militares e de inteligência, no Departamento de Estado ou no Conselho de Segurança Nacional. Esse subgrupo ultrapassa em muito todos os demais subgrupos no conjunto dos candidatos Democratas. Agentes da segurança nacional (57) superam os funcionários de governos locais e dos estados (45), advogados (35), executivos de grandes corporações, empresários e indivíduos ricos pessoalmente ou por família (30) e outros profissionais (19) dentre os candidatos à indicação como candidato a Representante, do Partido Democrata, ao Congresso dos EUA.
Das 102 eleições primárias para escolher os candidatos do Partido Democrata nesses distritos onde há disputa acirrada, 44 são candidatos com antecedentes nos serviços militar e de inteligência ou no Departamento de Estado; 11 distritos não têm candidatos desse tipo e um distrito tem três. Na maioria das disputas, os candidatos militares e da inteligência estão bem posicionados para obter a indicação do Partido Democrata e, se os Democratas vencerem na eleição geral, serão novos membros do Congresso, como representantes na Câmara de Representantes.
Há algumas diferenças regionais. No nordeste, 21 dos 31 assentos que são alvos dos Democratas têm candidatos militares ou da inteligência. Essa área, não ou sul nem o meio-oeste, apresenta a mais alta proporção de candidatos militares ou da inteligência que buscam ser indicados como candidatos do Partido Democrata.
No Oeste, apenas sete, de 23 assentos que são alvos dos Democratas têm candidatos militares ou da inteligência; e para meia dúzia de assentos o candidato que está na liderança é milionário que financia a própria campanha, principalmente de empresas de Tecnologia da Informação. Houve uma onda de aposentadorias de Republicanos na Califórnia, e pessoas muito ricas candidataram-se ao Congresso.
Os candidatos militares e da inteligência são desproporcionalmente promovidos pelo aparelho do Partido Democratas, encorajados a concorrer em distritos onde é mais alta a probabilidade de o candidato Republicano ser derrotado.
Candidatos militares e da inteligência respondem por 10 dos 22 distritos selecionados para receber atenção mais dedicada do programa "De Vermelho para Azul", quase a metade. Em alguns casos, os candidatos militares e da inteligência reuniram quantias enormes de dinheiro de campanha, que efetivamente tiraram do páreo quaisquer rivais potenciais, sinal claro de que os milionários que pagam pela eleição de Democratas estão alinhados no apoio a desses candidatos. [Continua]