O original, em inglês, pode ser consultado em
http://www.democracynow.org/2016/7/25/exclusive_wikileaks_julian_assange_on_releasing
EXCLUSIVO: Julian Assange do WikiLeaks fala sobre o vazamento de e-mails na DNC que provocou a renúncia da congressista Debbie Wasserman Schultz
Fundador do WikiLeaks e editor-chefe Julian Assange se junta a nós a partir de Londres e fala sobre a liberação de cerca de 20.000 e-mails que revelam como o Partido Democrata favoreceu Hillary Clinton e trabalhou nos bastidores para desacreditar e derrotar Bernie Sanders. Estes vieram à tona em meio à festa que a Convenção Nacional Democrata comemorava hoje na Filadélfia, Pensilvânia, e causou uma enorme turbulência. A congressista Debbie Wasserman Schultz que ocupava uma cadeira da DNC (o Comitê Nacional dos Democratas), da Flórida, renunciou após o vazamento. Os e-mails também revelam uma estreita relação entre a grande imprensa imperialista e a DNC.
JUAN GONZÁLEZ: A Convenção Nacional Democrata está abrindo hoje (26 de julho de 2016) na Filadélfia, Pensilvânia, a convenção nacional em meio a uma enorme turbulência. A presidente do Comitê Nacional, a congressista da Debbie Wasserman Schultz, renunciou após o vazamento de cerca de 20.000 e-mails revelando os bastidores sobre como o Partido Democrata favoreceu Hillary Clinton e trabalhou nos bastidores para desacreditar e derrotar a candidatura de Bernie Sanders. Os e-mails foram divulgados na sexta-feira passada pelo site de Internet WikiLeaks.
Em um dos e-mails, o Chefe de Finanças da DNC, Brad Marshall, sugeriu que alguém perguntasse publicamente a Sanders sobre a sua religião nos debates em Kentucky e West Virginia. Brad Marshall disse: "Pode fazer nenhuma diferença, mas para Kentucky e West Virginia podemos arranjar alguém para pedir a opinião. Será que ele acredita em Deus? Ele vacilou em dizer que ele tem uma herança judaica. Acho que eu li que ele é ateu. Isso poderia trazer vários pontos de diferença. Com minhas suspeitas de um batista do sul, gostaria de chamar a atenção para a grande diferença entre um judeu e um ateu ". Em outro e-mail, Debbie Wasserman Schultz chamou o coordenador de campanha de Sanders, Jeff Weaver, "uma droga de mentiroso".
AMY GOODMAN: Outro e-mail mostra o Secretário Nacional de Imprensa Mark Paustenbach "querendo saber se há uma boa explicação de Bernie para a história de que ele nunca agiu de maneira organizada, de que sua campanha foi uma bagunça”. Vários e-mails mostram o Diretor de Comunicações Luis Miranda do DNC reclamando sobre a cobertura da rede MSNBC e fazendo citações por escrito sobre "F***ing [referência ao palavrão em inglês] Joe”. “Alegando que o sistema está viciado, partimos contra ele, precisamos reclamar com seu produtor," é inquestionável, referindo-se a Joe Scarborough. Outros e-mails sugerem que o DNC esteva reunindo informações sobre a atuação de Sanders e que um super PAC esteva foi destinado a pagar pessoas para combater os apoiadores de Sanders online.
No domingo, Bernie Sanders reagiu aos emails durante uma entrevista com George Stephanopoulos da rede de televisão ABC.
SEN. BERNIE SANDERS: Eu disse que há muito tempo que o DNC não estava funcionando justamente, que eles estavam apoiando a Secretária Hillary Clinton. Então, o que eu sugeri que podia ser verdade, há seis meses, aparece, no momento, como verdade. Não estou chocado, mas estou decepcionado. ... O que eu disse ainda há poucos meses é que, por múltiplas razões, Debbie Wasserman Schultz não devia ser presidente do DNC. E eu acho que esses e-mails reafirmaram que eu tinha razão, que ela não deveria ocupar a cadeira. Eu acho que ela deveria renunciar a seu mandato. Eu acho que precisamos de uma nova cadeira que vai nos levar para uma direção muito diferente.
AMY GOODMAN: WikiLeaks não revelou a fonte dos e-mails vazados, embora em junho um hacker usando o nome Guccifer 2.0 reivindicou a responsabilidade pela invasão da rede de computadores do DNC. No domingo, porém, o coordenador de campanha de Clinton afirmou que os e-mails vazaram, "pelos russos com o objetivo de ajudar Donald Trump".
Vamos agora a Londres para uma entrevista exclusiva com o fundador do WikiLeaks, Julian Assange, que se encontra asilado na embaixada do Equador há mais de quatro anos. Ele recebeu asilo político do Equador, mas teme que se tentar ir ao Equador, se tentar pisar fora da Embaixada equatoriana, ele será preso pela polícia britânica e, finalmente, extraditado para os Estados Unidos onde enfrentarria, possivelmente, acusações de traição por causa dos documentos que o WikiLeaks revelou.
Julian Assange, editor-chefe do WikiLeaks, bem-vindo ao Democracy Now! Você pode falar sobre estes e-mails, esses 20.000 e-mails que foram revelados?
JULIAN ASSANGE: Sim, é bastante notável o que aconteceu nos últimos dias. Eu acho que esta é uma versão bastante clássica, que mostra o benefício de reunir conjuntos de dados cristalinos, apresentando-os ao público, com igualdade de acesso a todos os jornalistas e o público em geral interessados em conhecê-los, em poder citá-los, para que possam ser usados para sustentar certas críticas ou argumentos políticos. Muitas vezes, acontece que nós temos que fazer muita pesquisa e negociação do material que publicamos para conseguir obter um impacto político grande. Mas, neste caso, se sabia que, por causa do DNC, por causa do grau de interesse nas eleições nos Estados Unidos, nós não precisaríamos estabelecer parcerias com o The New York Times ou The Washington Post. Na verdade, isso seria contraproducente, porque eles são apoiadores de um ou outro grupo. Em vez disso, tomamos o conjunto dos dados, os analisamos, os comprovamos e os divulgamos de uma forma ampla, pesquisável, e os apresentamos para todos os jornalistas e o público em geral. E isso é exatamente o que aconteceu.
JUAN GONZÁLEZ: Julian, qual foi sua reação à renúncia anunciada de Debbie Wasserman Schultz logo após o lançamento desses e-mails?
JULIAN ASSANGE: Bem, quero dizer, que isso é interessante. Vimos que, como muitas outras publicações, há uma pergunta pendente: O que significa isso para o Partido Democrata dos Estados Unidos? É importante que haja exemplos de prestações de contas. A renúncia foi um exemplo disso. Agora, é claro, Hillary Clinton tentou produzir imediatamente uma contraofensiva, emitindo um comunicado, em poucas horas, dizendo que Debbie Wasserman Schultz é uma grande amiga, que ela a está incorporando na sua campanha e que ela vai impulsionar sua candidatura para a reeleição no Congresso.
Então isto representa um sinal muito interessante de que Hillary Clinton agiu de uma forma corrupta em benefício da própria Hillary Clinton, e que deverá ter cuidado. Por que ela precisa colocar isso? Certamente, não é um sinal que a aproxime dos eleitores. Não é um sinal que a ajudará com a unidade no DNC, na Convenção. É um sinal para que os partidários de Hillary Clinton seguem em frente, mas precisarão tomar cuidado. É um sinal muito destrutivo para uma futura presidência porque, efetivamente, está expandindo a janela da corrupção. Realmente, não importa o que você faz, como você se comporta; contanto que beneficie Hillary Clinton, você será protegido.
AMY GOODMAN: Quero dizer que é muito interessante porque Hillary Clinton e Tim Kaine apareceram juntos, como Mike Pence e Donald Trump o fizeram na semana anterior, no programa 60 Minutos. E Hillary Clinton se defendeu de todos esses e-mails, perante o DNC, dizendo: "Essas pessoas não representam nada para mim." E, no entanto, imediatamente, após a renúncia forçada de Deborah Wasserman Schultz, ela disse que é uma boa amiga, e imediatamente a contratou. Mas, Julian, eu queria saber se você poderia dizer quais, do seu ponto de vista, são os e-mails mais importantes que foram revelados?
JULIAN ASSANGE: Bem, na verdade, eu acho que os mais significativos não foram divulgados, embora The Washington Post, na noite passada, e McClatchy fizeram uma primeira tentativa inicial para isso. E estas são as planilhas que nós tornamos públicas cobrindo as questões financeiras do DNC. Esses são documentos muito ricos. Há uma planilha chamada "Planilha de todas as coisas", e inclui todos principais doadores americanos do DNC, mostra as doações que foram feitas, quem são os doadores, os montantes totais que eles doaram, tanto para os eventos públicos como para as doações genéricas, qual evento estava sendo impulsionado pelo presidente ou por outra pessoa. Ela mapeia de forma eficaz a influência do Partido Democrata nos Estados Unidos, mas de forma mais ampla porque, com poucas exceções, os bilionários nos Estados Unidos têm consciência sobre a importância de doar para ambas as partes. Isso vai proporcionar uma estrutura para o futuro do jornalismo investigativo tanto sobre a influência dentro dos Estados Unidos como em geral.
JUAN GONZÁLEZ: Julian, sobre essa questão, claramente, uma grande quantidade de e-mails falam sobre as quantidades reais de dinheiro que estavam sendo oferecidas aos doadores para que tivessem a oportunidade, como dizer, para que os doadores tivessem a oportunidade de se sentar em diferentes eventos, ao lado Presidente Obama, especialmente, para usar o Presidente Obama como um arrecadador de fundos. Agora, a maioria das pessoas, no mundo político, irá considerar este negócio, como normal, mas a mecânica de como isso funciona e o grau em que o DNC se coordena com o Presidente, a sua comercialização, eu acho que jamais tinha sido revelado com tantos detalhes. Você concorda?
JULIAN ASSANGE: É isso mesmo. E não é apenas que o Presidente detém a captação de recursos. Isso também não é nada novo. Mas sim, o que você tem para cada doação de uma espécie particular. Há até mesmo uma frase usada em um dos e-mails sobre "pagar para jogar". Então, sim, eu acho que é extremamente interessante. Há também e-mails entre a campanha de Hillary Clinton e o DNC. Então, você vê montantes bastante significativos de dinheiro a ser canalizado para declarar oficialmente como sendo destinados ao Partido Democrata e, em seguida, relançados para atrás, aparentemente para manipular certas estatísticas, talvez para fugir de certas restrições do financiamento da campanha.
Em relação ao que se tornou a discussão política mais significativa como resultado da publicação, a de que as figuras mais importantes do DNC incluindo Debbie Wasserman Schultz, foram claramente contra Bernie Sanders e tentaram subverter a sua campanha com toda uma série de manobras, isso é verdade. Essa é a atmosfera que é revelada por centenas dos e-mails e que é perfeitamente aceitável para produzir críticas internas incisivas de Bernie Sanders. São discutidas maneiras sobre como minar sua campanha.
Debbie Wasserman Schultz contatou o presidente da [rede de televisão] MSNBC para controlar F***ing Joe [Joe Scarborough], o que foi efetivamente feito num programa de TV. Mas, na verdade, eles não mencionam o contato com o presidente. Isso foi algo que ainda não foi descrito. Mas houve uma mudança de 180 graus na cobertura.
E você sabe que há conspirações bastante claras contra Bernie Sanders. Aconteceram algumas discussões, por exemplo, sobre que havia um plano para usar, para expor Bernie Sanders como um ateu, ao contrário de ser um judeu religioso, e usar isso contra ele no sul e minar seu apoio lá. Houve uma instrução dada pelo chefe de Comunicações, Luis Miranda, para tornar uma estória de Sanders, que tinha aparecido na imprensa, anti Bernie e anônima, não deixando impressões sobre ela. E isso foi uma instrução dada a funcionários da campanha. Assim, não foi apenas, um plano que poderia ou não ter sido realizado. Esta foi uma instrução que foi mandada para a equipe do DNC para lançar estórias anti Bernie Sanders na mídia.
AMY GOODMAN: No domingo, o gerente de campanha de Hillary Clinton, Robby Mook, citou especialistas dizendo que os e-mails do DNC foram vazados pelos russos em uma tentativa de ajudar o candidato presidencial republicano Donald Trump. Mook falou à CNN. Isto é o que ele disse.
ROBBY MOOK: O que é preocupante para nós é que especialistas estão nos dizendo que as autoridades estatais russas invadiram o DNC, roubaram esses e-mails, e outros especialistas estão dizendo agora que os russos estão liberando esses e-mails com o propósito de realmente ajudar Donald Trump. Eu não acho que seja coincidência que esses e-mails tenham sido divulgados na véspera da nossa Convenção. Nós também vimos na semana passada na Convenção Republicana que Trump e seus aliados fizeram alterações na plataforma republicana para torná-la mais pró-Rússia. E nós os vimos falando sobre que a OTAN não deve intervir para defender os nossos aliados da Europa do Leste, se eles forem atacados pela Rússia. Então, eu acho que quando você coloca tudo isso junto, é um quadro preocupante.
AMY GOODMAN: Então, esse foi Robby Mook citando especialistas que dizem que os e-mails do DNC foram vazados pelos russos. Você foi o único que lançou esses 20.000 e-mails, Julian Assange. Onde você os obteve?
JULIAN ASSANGE: Bem, o que o clipe não disse, é que Robby, pouco tempo depois, ele foi perguntado por Jake Tapper, "Quem são esses especialistas? Você pode nomeá-los?" A resposta foi não; há a recusa de nomear os especialistas. Mas vimos um dos peritos dizendo que o Partido Democrata está tentando lançar a sua teoria da conspiração, incrível, sobre o WikiLeaks. É isto o que chamamos de brincadeira, como “o cara de pau da NSA”. Ele é um ex agente da Agência de Segurança Nacional, que começou a produzir teorias da conspiração sobre nós em 2013, quando estávamos envolvidos no resgate de Edward Snowden, como um meio para tentar minar as publicações de Snowden, e que foram posteriormente envolvidos em algum escândalo de pornografia amadora. É por isso que eles não querem que o nome de seus especialistas sejam divulgados, porque eles são pessoas como ele.
Em relação às fontes posso dizer algumas coisas. A primeira é que nós nunca revelamos as nossas fontes, obviamente. Disto nós nos orgulhamos. E não apenas neste caso, mas em qualquer um. Mas ninguém sabe quem é a nossa fonte. É pura especulação. Eu acho que deve ser interessante e agradável especular sobre quais são as nossas fontes. Mas se nós estamos falando sobre o DNC, há muitos consultores que têm acesso, muitos programadores. E o DNC foi invadido dezenas e dezenas de vezes. Mesmo de acordo com os seus próprios relatórios, as invasões têm acontecido numerosas vezes ao longo dos últimos anos. As datas dos e-mails que nós publicamos são de datas posteriores das invasões alegadas, pelo menos de todas menos uma delas que o DNC disse ter sofrido.