No debate realizado ontem à noite, no PE, sobre o Fundo Fiduciário da União Europeia para África, a deputada espanhola Marina Albiol (Esquerda Unida) afirmou que este constitui uma medida de reforço da «Europa Fortaleza»: «A proposta da Comissão de criar um fundo para África de 1,8 mil milhões de euros até podia parecer uma boa ideia para muitos países, como o Uganda, o Mali ou o Senegal. Mas, quando percebemos para que serve o dinheiro, a ideia torna-se perversa e repugnante. Trata-se de gastar verbas destinadas ao desenvolvimento no controlo dos movimentos dos migrantes», disse.
O fundo foi criado em Novembro do ano passado com o objectivo de alcançar a «estabilidade e enfrentar as causas da migração irregular e das pessoas deslocadas em África». Os países visados pela medida são os da região do Sahel e do Lago Chade, bem como os do Corno de África, de onde parte um grande número dos migrantes que chegam à Europa.
A deputada espanhola reforçou as críticas acrescentando que, «em vez ser gasto em escolas, água potável ou cuidados de saúde, este dinheiro será atribuído à Eritreia, à Somália ou à Etiópia para que funcionem como guardas das fronteiras da Europa».
O objectivo deste fundo é «subornar os países para que impeçam os migrantes de partir ou para que os aceitem de volta quando forem deportados», disse Albiol, que entende estar na presença de uma prática de «chantagem – dinheiro em troca de travar os fluxos migratórios».
A deputada defendeu que a política europeia respeitante a África e à migração se devia centrar nas verdadeiras causas da pobreza, como a exploração e o saque de recursos naturais, os negócios de armas ou as consequências do pagamento da dívida externa.
«Pedras atiradas à cara da UE»
Na sua intervenção, João Ferreira, deputado do PCP no PE, afirmou que «os migrantes que todos os dias tentam pisar solo europeu, embatendo na desumana fortaleza que faz do Mediterrâneo um imenso cemitério, são como pedras atiradas à cara da União Europeia», que lhe lembram «as responsabilidades que teve e tem no subdesenvolvimento, na ingerência, na desestabilização e na guerra que estão na origem do fluxo migratório».
Recordando o «vergonhoso» acordo assinado com a Turquia, o deputado comunista português disse que, agora, a UE «quer alargar aos países africanos esta política de externalização de fronteiras e de gestão dos fluxos migratórios ao sabor dos interesses e necessidades de mão-de-obra do grande capital europeu».
João Ferreira considerou vergonhoso o facto de se pretender «condicionar a política de ajuda ao desenvolvimento à aceitação da política migratória da UE e à submissão aos seus princípios», e defendeu que «ir ao fundo das causas do fluxo migratório» implica alterações profundas das políticas da UE, bem como uma «reforçada cooperação para o desenvolvimento, respeitadora da soberania e do direito ao desenvolvimento dos povos africanos».