Não se trata apenas do esforço de Trump contra os mexicanos e contra todos os imigrantes, injetando uma profunda xenofobia entre os trabalhadores estadunidenses frente a seus irmãos de classe, baseados nos piores sentimentos comuns. As promessas de campanha do candidato republicano constituíam, em seu conjunto, uma séria ameaça no plano econômico ao status quo vigente entre ambos os países. Relação que também tem favorecido negócios de corporações estabelecidas de um lado a outro da fronteira.
Renegociar (e até desfazer) o Tratado Norte-Americano de Livre Comércio (NAFTA), aumentar tarifas de importação, confiscar remessas dos trabalhadores mexicanos para pagar a construção de um muro fronteiriço, deportar 11 milhões de imigrantes sem documentos, são medidas que afetariam diretamente o México.
O padrinho de Trump no México, Carlos Slim Helú, proprietário da Telmex, América Movil e muitas outras companhias, advertia de alguma forma que a fúria contra o México por parte do magnata (Trump) respondia às necessidades de campanha eleitoral mais do que a programas reais (ou realistas).
Trump finalmente venceu e tornou-se uma necessidade iminente revisar os possíveis efeitos de seu triunfo sobre a economia mexicana.
Vamos por partes
O que era esperado aconteceu: falaram os “mercados”. Na noite de terça-feira, 8, em que Trump venceu, a moeda mexicana chegou a depreciar-se mais de 13%, saltando para uma cotação de $M 18,32 para $M 20,74. Porém, não é a primeira vez. O peso mexicano tem enfrentado muitos altos e baixos durante a campanha de Trump. De fato, a moeda mexicana perdeu 10% de seu valor frente ao dólar no último ano, isto porque as flutuações do câmbio foram drásticas. Enquanto isso a atividade manufatureira cresceu apenas 0,1% em setembro, segundo o Inegi.
Pela manhã da quarta-feira, 9, a Bolsa Mexicana de Valores caiu em quase todos os indicadores e os grandes bancos como Citibank, Banorte e JP Morgan reduziam bruscamente os já baixos prognósticos de crescimento da economia nacional: de 2,3% para 1,8% até chegar em míseros 1,1%.
Consultoras, como a Capital Economics, previram que o câmbio poderia alcançar $M 25 por dólar. Juan Carlos Moreno-Brid, acadêmico da Universidade Nacional Autônoma do México (UNAM), afirma que seria um “um choque extremamente forte” para uma economia aberta como a do México, ao ponto de bloquear os investimentos em outros países e afetar as exportações.
No entanto, o que expressam os mercados sobre esta valorização do dólar frente ao peso mexicano? Vale dizer, uma importante desconfiança na fortaleza do peso (e com ela, da economia mexicana) de fazer frente às medidas econômicas isolacionistas do futuro governo de Trump, se todas elas, ou mesmo uma parte importante, forem levadas a cabo.
Remessas mexicanas
Outra consequência para a economia mexicana seria a possível aplicação de um imposto sobre remessas, que Trump prometeu levar adiante. Segundo especialistas como Issac Katz, professor do Instituto Tecnológico Autônomo do México (ITAM), a apreensão ou cobrança de impostos sobre as remessas enviadas pelos migrantes constituem a segunda fonte de receita do México, que atingiu U$S 20.046 milhões entre janeiro e setembro deste ano, segundo dados do Banco do México.
As remessas que Trump diz querer confiscar são realizadas pelos trabalhadores mexicanos e latino-americanos no Estados Unidos para ajudar suas famílias em seus países de origem. Trump propôs a redução de impostos, porém pensa em beneficiar com isto o capital. Pelo contrário, impor travas às remessas é aumentar os impostos sobre os trabalhadores mexicanos, que com seu trabalho produzem 11% do BIP estadunidense e sustentam a ganancia dos empresários.
Os limites do giro isolacionista contra o México
A ameaça mais profunda que posou sobre o México, a partir do ascenso que expressou Trump é a possível renegociação do Tratado de Livre Comércio (sob condição de abandoná-lo caso seja “conveniente para o EUA” e a não aprovação do Acordo Transpacífico.
O Estados Unidos é o principal mercado de exportações mexicanas, com 80% das operações comerciais com o vizinho do norte. Nada menos que U$S 582,6 milhões no ano de 2015. Somente as plantas automotivas exportam U$S 44 milhões por ano. O equivalente a 58,7% da indústria “maquiladora” está localizada em seis estados que fazem fronteira com o norte mexicano.
No jornal New York Times, especialistas afirmam que as propostas de Trump afetariam os tratados comerciais a um nível que recorda os piores momentos das crises econômicas mexicanas, como aconteceu com o “Efeito Tequila” em 1994, sob a presidência de Ernesto Zedillo, e em 2008 sob o governo de Felipe Calderón.
Isaac Katz, declarou que qualquer tentativa de derrogar o NAFTA afetaria mais de 7 milhões de empregos que dependem do tratado, assim como a fabricação de muitos produtos estadunidenses que contam com insumos manufaturados mexicanos.
No entanto, é justamente este entrelaçamento produtivo que poderia impor limites à execução dos planos de campanha, uma vez que colocaria em cheque o conquistado pela classe dominante dos Estados Unidos.
As empresas de telecomunicação manifestaram seu chamado para que “se mantenha a relação bilateral”, e as montadoras seriam umas das mais afetadas por integrarem completamente o México à sua rede de produção. No ano passado cruzou a fronteira o valor estimado de U$S 118 bilhões em veículos e peças de automóveis, segundo dados do Departamento De Comércio dos Estados Unidos.
Como publicado no Esquerda Diário, o fluxo comercial entre ambos os países e o entrelaçamento produtivo cresceu exponencialmente sob o Tratado de Livre Comercio, desde 1995 o crescimento foi de 70%.O benefício desta “integração” foi apropriado pelas transacionais estadunidenses que aumentaram investimento na fronteira norte do México aliadas à burguesia local, e atraídas pelo diferencial do salário 8 vezes mais baixo que o pago pelos Estados Unidos e pelas liberdades fiscais e tarifárias propiciadas pelo NAFTA.
Uma saída do NAFTA sem dúvidas provocaria um terremoto sobre e economia mexicana, porém as ondas expansivas alcançariam o próprio EUA e não se pode afirmar que não seriam ainda mais danosas.
Protecionismo vs integração
Para os trabalhadores de ambos os lados da fronteira nada de bom pode vir das ofertas entre o protecionismo e o livre câmbio. Os empresários aproveitam momentos de instabilidade para abaixar os salários, degradar as condições de trabalho e não lhes treme os pulsos para fechar fábricas e demitir. Seu objetivo é preservar e acrescentar taxas de ganancia às despesas da classe trabalhadora.
O protecionismo não é uma opção para melhorar as condições de vida dos trabalhadores tampouco engloba a continuidade do modelo “integracionista” de exploração de trabalhadores mexicanos “imigrantes” nos Estados Unidos e em seus próprios países pelas empresas estadunidenses.
Por isto, é necessário estabelecer laços de unidade entre a classe trabalhadora internacionalmente, independente de toda variante da burguesia, de ambos os lados da fronteira e enfrentar a dominação imperialista sob a qual se pactuaram os tratados e acordos que apenas beneficiam as transnacionais e seus sócios locais; erguer organizações socialistas e revolucionarias que apontem uma perspectiva estratégica com o objetivo de expropriar as transnacionais e os grandes capitalistas que dominam a América do Norte para assim terminar com este sistema baseado na exploração e opressão das grandes maiorias.