Micaela, de 21 anos, estudava Educação Física, vivia pelos párias, esses negrinhos que o classismo detesta. Foi violada e assassinado por um estuprador em série que foi deixado em liberdade por um juiz porque segundo este último, a única coisa que o estuprador tinha era uma “perversidade natural”.
No mesmo país, há apenas alguns meses, em outubro de 2016, Lucía Pérez, de 16 anos, foi drogada e assassinada. Os investigadores descobriram que havia sido violada pela vagina e pelo ânus, não só com o pênis, também lhe enfiaram um pau nas duas vias, que atravessou seu corpo. Morreu de tanta dor. A morte de Lucía encheu de cólera o povo argentino, que convocou a marcha de #NiUnaMenos e à qual se uniu o continente inteiro.
No México, nos últimos seis anos 900 foram assassinadas em feminicídios. No Chile, em 2016, o nome de Nabila saiu à luz pública quando foi encontrada na rua por um adolescente. Ao ser levada ao hospital, souberam que lhe haviam retirado os olhos e que tinha fraturado o crâneo e a mandíbula. O relato oficial conta que havia ido a uma festa com seu companheiro, pai de dois de seus quatro filhos, e que se “embebedou” e estava “descontrolado” e que ao chegar na oficina mecânica onde viviam, a golpeou. Foi acusado de feminicídio frustrado e mutilação.
Na Colômbia, em 2016, Juliana, menina indígena de 7 anos, foi violada e estrangulada até a morte em Bogotá. O culpado, um homem de classe social alta que “sob efeito das drogas” cometeu o delito. O resto já conhecemos.
Em Zacapa, Guatemala, Yohana, de 8 anos de idade, em 2016 foi violada por três homens e enforcada. Seus pais haviam saído da aldeia, para ir pegar dinheiro de um programa social e deixaram seus três filhos em casa, os homens entraram aproveitando a ausência dos pais. Cito somente alguns casos, porque são milhares.
Há alguns dias, um juiz no México deixou em liberdade um estuprador porque considerou que meter os dedos dentro da vagina da vítima não era violação. Algo que foi apoiado por um conhecido intelectual mexicano em um programa de rádio da UNAM, além de ter dito que as mulheres gostam de ser violadas.
Na América Latina, 98% dos casos de feminicídio ficam impunes. E os poucos que se consegue comprovar e se abre processos em cortes, têm um final triste, o culpado é declarado inocente. Por razões patriarcais: a vítima o provocou por se vestir de tal jeito, por sair tarde da noite, por passar por tal lugar, por não querer se deitar com ele. A razão das violações sexuais e os feminicídios é uma só: o gênero.
Juízes, homens e mulheres com mente patriarcal tomam decisões patriarcais e deixam em liberdade os culpados ou não levam os casos a sério por se tratar de mulheres violadas. É necessário que todos, em todos os lados, nos informemos sobre o patriarcado, desde a linguagem patriarcal passando pelas cantadas, que não são nada mais do que assédio, até chegar ao sistema de justiça, passando por meios de comunicação e sua forma de dar as notícias.
Nenhuma mulher é culpada e provoca que a violem, a golpeem e a assassinem. Nenhuma mulher pede para ser violada, o que lhe chamem de gostosa na rua, que lhe toquem nas nádegas e nos peitos dentro do ônibus. Se uma mulher diz não, é não; mesmo que seja com seu parceiro. Nós mulheres não somos objeto de ninguém e isso deve ser entendido pelos juízes, o sistema. Precisamos de um sistema de justiça com perspectiva de gênero, gente capacitada que tenha o conhecimento sobre o patriarcado, para que leve os casos e dite sentenças com todo o peso da lei.
Um exemplo da ineptidão de um sistema de justiça, patriarcal no caso das 41 meninas assassinadas, que foram queimadas vivas na Guatemala, os culpados estão sendo tratados com privilégios de classe e poder. O presidente deveria ser destituído imediatamente no mesmo dia que as meninas foram queimadas, com mais razão se elas já haviam denunciado que eram violadas pelo pessoal do local.
Mas mudar o sistema não é coisa fácil, para isso todos temos que nos envolver, em todos os âmbitos da sociedade – quando vamos começar? A luta contra os feminicídios, a violência de gênero e o patriarcado tem que ser de todos – quem se candidata?