A motivaçom pessoal para assistir a manifestaçons que fam parte das citas estáveis do calendário de mobilizaçons, é complicada e máxime quando fas parte de umha facçom minoritária de um movimento social e os teus posicionamentos estám muito alonjados do discurso hegemônico desse movimento. Quando umha manifestaçom se parece demasiado à anterior, e com quase absoluta certeza se parecerá também à do seguinte ano, é complicado sentir-se com vontade de assistir. Quando militas nalgumha organizaçom ou entidade, a militança obriga. Quando nom, a costa acima é muito mais pronunciada.
Um dia feriado oferece demasiadas possibilidades de passar umha boa jornada antes do que plantejar-se ir a Compostela e percorrer por enéssima vez o mítico circuíto que leva da Alameda à Quintana, por Santiago de Chile, Doutor Teixeiro, Rua do Hórreo, Rua das Orfas, Rua Nova ou Rua do Vilar...o tracejado histórico que já nos tem aborrecidos aos que levamos muitas manifestaçons nacionais de todo tipo às nossas costas. E agüentar chúvia, ou a calor abafante, e aglomeraçons de gente, antes, durante e depois da manifestaçom, e meia hora interminável de intervençons desde o palco...tudo é repetitivo até tornar-se insuportável, sobre tudo se paras a pensar nas ocasions que ao longo da tua vida repetiches o mesmo ritual e tu avelhentas, mas a realidade do país nom muda ou vai a pior. Isso tudo amarga a qualquer pessoa e, se é fodido pertencer a umha minoria, a essa minoria que tem incorporado aos seus comportamentos o ato de manifestar-se e o fai de maneira habitual, pior é a cousa quando és minoria dentro da minoria e estás sempre situado nesse ângulo marginal que leva as culpas de quase tudo e ao que se lhe dá a razom só quando a táctica o exige.
Eu fum à manifestaçom de 17 de Maio, fum com um sector muito concreto da manifestaçom. Poderia ter ido confundindo-me entre os diferentes sectores da manifestaçom e nom aconteceria nada; eu nom milito em nada e ninguém me pode exigir qualquer tipo de fidelidade...bastante fago com secundar a convocatória. Ou poderia nom ter ido, também nom seria tam grave. Para actos de afirmaçom, o que fago todos os dias empregando a língua em todo momento.
Eu nom pretendo convencer a ninguém de que o meu posicionamento é o correcto, ainda que nom duvido da sua correiçom. Só pretendo defender-me, porque ainda que nom sou um intelectual, nem sou um ideólogo, nem aspiro a sê-lo, o que também nom sou é um automata. Sei bem porquê fago o que fago. E sei bem porquê fum a Compostela no dia 17.
Está o reintegracionismo a mendigar um espaço?
O reintegracionismo nom está a mendigar nada nem necessita mendigar um só centímetro quadrado de espaço dentro do movimento lingüístico, porque já conquistou muito espaço. Nom necessita a aceitaçom compassiva por parte do isolacionismo. Simplesmente reintegracionismo e isolacionismo som aliados forçosos na realidade concreta, e isto apesar dos sectores mais ultras do isolacionismo e, ao mesmo tempo, som adversários dialécticos. Se nós nom estivéssemos, provavelmente ninguém na manifestaçom berraria “Falamos igual na Galiza e Portugal” ou “Galego e português a mesma língua é”. As faces de desconcerto e desagrado por parte de algumhas pessoas dos blocos vizinhos simplesmente confirmam o impacto do nosso desafio dialéctico ante a pax que pretende estabelecer o discurso dominante no movimento.
Secundar umha mobilizaçom nom é ir a aplaudir aos do palco. A Mesa pola Normalización Lingüística nom me representa e Queremos Galego também nom me representa. Mas ambos tenhem umha capazidade de convocatória que o reintegracionismo nom tem. O reintegracionismo poderia convocar os seus próprios actos nesse dia; seria umha opçom. Mas qual deve ser a prioridade do reintegracionismo no 17 de Maio? Medir forças com Queremos Galego, ou somar-se a umha mobilizaçom popular com um bloco que mostre personalidade própria e discurso próprio, dando oportunidade a miles de pessoas que nom tenhem umha militança concreta, mas que chegam arrastadas polo chamado de Queremos Galego, de conhecer um outro discurso diferente ao do isolacionismo/autonomismo? Somos parte desse activo popular que fai força na defesa da língua, ou somos umha cissom dele? A discusom situa-se aí...
Quando eu secundo umha greve geral, nom o fago pola simpatia que me subscita a cúpula sindical, com a que nom concordo em praticamente nada, mas que é a que dirige os sindicatos, que a dia de hoje som os únicos que podem convocar umha greve geral. Desde posicionamentos anti-capitalistas, podemos emendar-lhe a plana à democracia operária e ir às assembleias de trabalhadores a dizer-lhes que erram se decidem apoiar umha greve convocada por essa dirigência sindical direitosa, ou apoiar a unidade de classe por cima de ideologismos, que acho que em condiçons normais seria o verdadeiramente revolucionário.
Quando acudo à manifestaçom do Primeiro de Maio, outra cita ritual, nom vou porque tenha muita fé no discurso que desde o palco vai botar o dirigente de turno do meu sindicato, vou a um acto de afirmaçom de classe no que vou ter com colectivos de trabalhadores em luita, onde vou ter com sectores que como eu defenderám a luita nas ruas e nos centros de trabalho como a ferramenta principal de transformaçom da realidade, e nom o pacto social ou a via meramente eleitoral. Como digo, aplaudir aos do palco nom é obrigatório.
Por pôr um exemplo práctico, eu assistim à manifestaçom polo “Direito à Cidade” que convocou a Comisión Aberta en Defensa do Ben Común na Corunha, e tenho que dizer que nem me agradava a presença de todas as que figuravam como entidades apoiantes da convocatória, nem gostei do acto em si. Estivem lá porque a justiça da reivindicaçom estava por cima da minha discrepância sobre critérios organizativos e estéticos e também da incomodidade pessoal que me causava escuitar determinados nomes ou ver determinados rostos.
E poderia continuar citando situaçons análogas, mas acho que ficou claro...
O reintegracionismo vai de maos dadas com os repressores?
A coexistência dentro de um mesmo movimento entre diferentes correntes nom é sempre harmônica, costuma ser conflitiva. Com efeito, dentro do movimento lingüístico há pessoas com poder que ordenam vetos, boicotes, silenciamentos no plano intelectual, artístico, profissional...contra elementos reintegracionistas. Estar aí e nom calar, fai parte do confronto dialéctico...eu nom estou na manifestaçom para reforçar posicionamentos hegemônicos, mas para exercer o meu direito a me manifestar com todas as conseqüências, ainda sabendo que para alguns nom sou umha companhia desejada.
Enquanto militei no independentismo, tivem bastantes experiências de descriminaçom por filaçom política em muitas luitas e foi bastante escandalosa a exclussom de NÓS-UP da plataforma Nunca Mais, por exemplo. Isso nom lhe resta legitimidade às mobilizaçons populares como reacçom à catástrofe do Prestige, às que assistiamos, apesar de que a informaçom jamais se nos transmitia a nós. O importante nom som as siglas, é o povo. Às vezes nom resulta fácil acompanhar às luitas populares, sobre tudo se te tens que enfrentar com algumha facçom que pretende patrimonializá-las. Mas a luita nom sempre é cômoda.
Poderia citar outros exemplos de plataformas populares a nível nacional e a nível local onde houvo que lidar com desconfianças, preconceitos ou simplesmente palavras de ordem explícitas de veto. Som anos de experiência...
Podemos identificar-nos com o discurso de Queremos Galego?
Do que se dixo no palco ao final da manifestaçom, há umha parte diria que maioritária das intervençons que é perfeitamente assomível, fores isolacionista ou reintegracionista. É certo, estamos privados do exercício efectivo dos nossos direitos em absolutamente todos os planos...a discusom sobre se há que pôr o acento na questom estratégica-identitária, ou seja, reivindicar o galego como língua nacional, ou na questom táctica-legalista, está aí mas parece-me de umha cegueira absoluta nom admitir que parte da base para resistirmos está no corpus legal para exercermos os nossos direitos individuais, tanto os que exercemos individualmente como os que exercemos colectivamente. Que tanto as administraçons públicas como a empresa privada nom poidam descriminar aos falantes de galego é fundamental e isso só se garante com leis, ainda que essas leis sejam leis do estado espanhol. As leis som o que som, normas de obrigado cumprimento que estabelecem direitos e obrigaçons, geram vínculos e responsabilidades. As leis som as que tornam reclamáveis os direitos. Por suposto que isto nos leva a esse mördor que para todo revolucionário supom “o reformismo”. Ainda que um nom seja reformista por definiçom, a táctica é muitas vezes reformista.
Mas, sejamos sérios...quando um colectivo de trabalhadores negócia um convênio laboral ou adopta medidas de conflicto para reclamar esse convênio, nom está sendo legalista? O convênio colectivo nom é umha ferramenta de coesiom social que estabelece o estatuto dos trabalhadores espanhol? Os convênos nom os negociam os comitês de empresa, que som órgaos de representaçom reconhecidos por esse mesmo estatuto dos trabalhadores? E isso resta legitimidade à sua luita?
Quando umha plataforma vizinhal reclama que se lhe dea um rango de protecçom a um espaço natural, nom está acolhendo-se à legislaçom vigente? E isso resta legitimidade à sua luita?
Quando o movimento feminista reclama maiores méios para assistir, assessorar, proteger às vítimas do mau trato...nom está a falar muitas vezes de reformas do marco jurídico? E isso resta legitimidade à sua luita?
Quando gays, lesbianas e transexuais reclamam o seu direito a casar, adoptar, e os benefícios fiscais que isso traz consigo, isso nom som objectivos que implicam reformas legais? E isso resta legitimidade à sua luita?
Quando os colectivos animalistas reclamam certas medidas para garantir o bem estar animal, isso nom implica muitas vezes reformar leis ou fazer leis novas? E isso resta legitimidade à sua luita?
Evidentemente isto vai de direitos e deveres legalmente reconhecidos...por contraditório que nos resulte. Todos damos por descontado que numha Galiza independente (ou num estado de soberania difusso e indefinível, como o idealizado por alguns) a língua nacional seria o galego sem discusom possível. A questom é como viver em galego sem ter que dar explicaçons, ou sem que obstaculicem ou violentem os teus direitos na realidade actual.
É o discurso hegemônico permeável ao reintegracionismo?
Deveria sê-lo mais, sem dúvida. A única piscadela ao reintegracionismo, nas alocuçons que houvo no final da manifestaçom, forom as mençons à vitória de Portugal na Eurovision. A nossa língua é internacional, e se a vitória de Portugal nesse festival é umha vitória da nossa língua também toda a producçom cultural em português é nossa. Entom seria de agradecer que se reconhecesse com a boca grande e com todas as conseqüências que falamos de umha língua e nom de duas, no que di respeito do galego-português...que normas pode haver várias, mas que línguas há umha. A brincadeira oportunista com a vitória de Portugal num festival televisivo, fica nisso, em brincadeira.
Mas, como já dixem, para pôr o discurso reintegracionista estávamos nós, exercendo o nosso direito democrático a ser voz diversa no coro.
A modo de conclusom
Assistir ou nom assistir a umha manifestaçom é um direito de cadaquém no que nom me meto. Desde logo que poido compreender que umha pessoa que trabalha toda a semana nom tenha vontade nengumha de ir por enéssima vez a umha manifestaçom a Compostela. Nom me parece tam legítimo fazer troça de quem decide assistir à manifestaçom. Eu fum acompanhando o bloco reintegracionista, ao que aderirom a SCDR do Condado, a Fundaçom Artábria, a Liga Gallaecia, a Gentalha do Pichel...entidades que fam um trabalho de base desde umha orientaçom reintegracionista. Com todas as deficiências, contradicçons, dificuldades...que supom fazê-lo desde a pluralidade. A auto-comprazência elitista é tentadora mas improductiva.
Os intelectuais agraviados polo apartheid tenhem direito a sentirem-se isso, agraviados. Mas a única frente de luita nom é a intelectual. Eu também fum muitas vezes descriminado como artista, numhas ocasions por ser reintegracionista, e noutras polo meu carnet político. E nom esqueço. Algumhas pessoas que participavam no bloco reintegracionista forom braços executores desses actos de descriminaçom. Mas eu nom sou o centro do universo. Oxalá os meus problemas fossem que nom recebo prêmios ou que aos meus prêmios nom se lhes dá publicidade. Se fago inventário dos meus problemas mais graves, acho que esses nom entrariam na listagem. E, por seu turno a língua é umha questom mais complexa do que um reparto de metros quadrados de protagonismo ou de poder. Eu fum, por fidelidade aos meus princípios e à minha maneira de entender a luita.