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Diário Liberdade
Sábado, 18 Junho 2016 20:59

Ostrácia de Teresa Moure, obra ímpar nas nossas letras

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Alexandre Banhos

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Ostrácia é uma obra incomum dentro do panorama de qualquer literatura.


É uma obra que engancha, pois não é possível começá-la, e não rematá-la, porque tem o que toda boa literatura tem, histórias das que necessitamos saber como se desenvolvem e acabam.

Sua autora, Teresa Moure, é uma das canetas mais finas e engaiolantes que há no nosso panorama literário atual na Galiza; é dizer, nessa parte da Galiza que não constituiu o reino de Portugal e que acabou submetida sob a dominação de Castela/espanha.

Pelas veias e neurónios de Teresa Moure corre um rio de muito boa literatura e de ideias para nos movimentar. Ela é romancista, poeta, ensaísta, e excelente divulgadora e agitadora de sonolentos leitores.

Ela, com o conjunto da obra que vai criando, age para nos arrincar da passividade e mover-nos à ação, ela compromete-nos a construir um futuro no nosso País, e fazê-lo com os melhores alicerces.

Há escritores dos que se pode dizer que toda a sua obra é no fundo uma variação de um mesmo tema, e há escritores geniais em que fazem todas as suas obras absolutamente distintas, e com cada uma delas achega um jeito de olhar as cousas ao caleidoscópio que é a realidade.

Teresa Mouse, é dessa segunda condição de escritor, a sua obra é polifónica, e com Ostrácia ela realiza uma sinfonia, onde soam muitos instrumentos dirigidos sob a sua hábil batuta.

Não estamos ante uma obra simples de leitura linhar e tranquila, não, estamos ante uma obra com três planos, que se misturam e se contorcem uns nos outros. Há vezes em que vão desenvolvendo-se em paralelo, ainda que as mais das vezes, e como diria Cervantes, dá-se a comunhão íntima dos planos, e o diálogo íntimo ovárico e seminal dessa comunhão.

Quem temos nesses três planos:

1-Inessa Armand e a sua vida.

A autora faz um interessante trabalho professoral de pesquisa e documentação, sobre esta mulher Inessa Armand, que foi bolchevique, rompedora com não poucas normas do seu tempo, e além de ser amante de Lenine, teve o seu papel militante e deixou alguma pegada nessa peça teatral construída historicamente e que se chamou a revolução socialista de Outubro de 1917, e o nascimento da URSS.

A informação histórica que há no romance é bem interessante

2- A autora.

Ela vaza-se para os leitores, ao seu modo, ao fazer-se personagem literária. Aí temos a autora ser humano e literário entanto desenha a sua Ostrácia.

Ostrácia é o espaço vital no que se insere e refugia a autora (projetando-se em Inessa Armand a revolucionária)

Ostrácia é um termo criado por Teresa Moure, e vem significar algo assim, como refugio mental onde nos agachamos frente a dura realidade que nos tenta esmagar1.

Ela fala-nos -sem dizê-lo-, da sua pessoal Ostrácia2, e de como é a construção de essa Ostrácia3 sua que lhe permite viver o mais normal possível, sem cair na insanidade, pola dureza da contorna que nos baliza e submete.

Nesta obra não é a primeira vez que utiliza o termo ostrácia. No seu excelente poemário Eu Violei ao Lobo Feroz publicado pela Através, aparece em vários poemas: No poema 12 onde além de ostrácia aparece ostracenses. No poema 20 ...Por exemplo no poema 35 diz fazendo o termo bem transparente:

E não deixava de pensar-te

tão distante da Ostrácia e de mim”

3-Lenine, o partido bolchevique, e a revolução

Aí temos a Europa de começos do século passado, no que se constrói uma revolução de fundamentos materialistas e marxistas, de um novo cunho, na procura de uma humanidade nova sem opressores e sem oprimidos e onde se tentaria chegar ao de: A cada um recebendo segundo as suas necessidades e a cada um dando segundo as suas capacidades4.

A polifonia que é Ostrácia pode ser muitas mais cousas, por exemplo um tratado sobre arácnidos. Ainda que a autora desconhece que existem aranhas que fazem a vida em grupo e caçam em grupo, e constroem suas teias em grupo, como se fossem abelhas. Porém sabendo que elas só existem nas selvas tropicais americanas, e sendo a autora da Eurásia não se lhe podem pôr chatas por isso.

Mas se algo fazem as aranhas é tecer, e tecer é o que faz a nossa autora. Ela ao tecer a sua Ostrácia é tão generosa que abre o seu refugio para que sejamos muitos os que entremos nele a acompanhá-la e fazendo isso, faremos a ostrácia definitivamente desnecessária, pois já Penélope terá o seu Ulisses de volta.

Ostrácia também poderia ser definido como um livro de poesia, pois nela a nossa poetisa segue-nos regalando pequenas peças maravilhosas que são -para mim- continuidade de essa joia que é Eu Violei o Lobo Feroz.

É um livro de protagonista(s) feminino, mas não é um livro de concepções feministas, senão femininas.

A relação de Inessa Armand e a sua contorna, a relação com Lenine são em geral na caneta de Teresa Moure, ela sempre tão delicada, bastante adocicadas (só quando a autora é protagonista se perde esse adocicamento), e além da relação tão especial com o seu marido, Inessa Armand é verdadeiramente fiel a todos, ainda que transgreda, na nossa protagonista não se percebe falta, se não compromisso e fidelidade aos seus todos e sempre por cima das circunstancias pessoais e até dos desencontros.

Na nossa literatura não há nenhum outro livro que o vaia surpreender como este de Teresa Moure, prepare-se para se deixar surpreender, paga a pena.

1Ostrácia é termo que bebe em ostracismo que significava: Desterro político, que não importava ignomínia, desonra nem confiscação de bens, a que se condenava, por período de dez anos, o cidadão ateniense que, por sua grande influência nos negócios públicos e por seu distinto merecimento ou serviços, se receava que quisesse atentar contra a liberdade pública.

O condenado ao ostracismo era expulso da comunidade. Em Ostrácia um construí um espaço que está fora da comunidade, porém no que um se refugia da insanidade dessa comunidade.

3Mario Herrero em entrevista no PGL explicava muito bem o sentido da Ostrácia, esse espaço no que estamos não poucos galegos e galegas

4De essa revolução saíram muitas cousas boas e também monstros. O sonho da razão produze monstros. Um dos grandes romances do século XX é Vida e Destino de Vassili Grosman, no que se canta entre outras cousas a epopeia de Estalinegrado na II guerra mundial e o monstro nascido de Outubro aparece despido.

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