Durante um culto, dentro de um templo religioso, Bolsonaro reivindicou Caxias, segundo ele, o “pacificador”.
Colecionando condecorações, de barão a duque, Caxias determinou a “reescravização” [1] dos negros derrotados na Balaiada e o enforcamento de Cosme Bento das Chagas, responsável por liderar cerca de 3 mil escravos. Caxias foi condecorado por sua violência pacificadora, sendo conhecida sua atuação sanguinária na Guerra da Tríplice Aliança contra o Paraguai.
A lógica no Brasil é simples. Em outubro de 1992 – quem não se lembra, favor ouvir a música “Diário de um detento" (Racionais MC’s) –, 150 anos depois da Balaiada, Pedro Franco de Campos, Ubiratã Guimarães, Luiz Antônio Fleury Filho e a Polícia Militar de São Paulo orquestraram o assassinato de mais de uma centena de presos na Casa de Detenção São Paulo – o Carandiru.
Após o massacre, Pedro foi indicado a ocupar uma vaga como magistrado no Tribunal de Justiça de São Paulo pelo quinto constitucional; Ubiratã e Fleury alavancaram suas carreiras na política. Os policiais militares, dos 74 envolvidos, 58 foram promovidos.
Como diz a canção: “quem mata mais, ganha medalha de prêmio!”. Mais claro que isso, só o samba enredo da Mangueira: “tem sangue retinto pisado atrás do herói emoldurado”.
Reivindicar Caxias é expor a violenta coerência que constitui as figuras do próximo governo federal, mas não só.
Por exemplo, para completar o quadro pitoresco, mais um escroque ligado ao PSL (Partido Social Liberal), dessa vez o Luiz Philippe Orleans e Bragança, foi eleito Deputado Federal por São Paulo, mostrando a singular "inteligência" que guia os votos do eleitor paulista.
A árvore genealógica de Luiz o vincula ao Príncipe Gastão de Orleans, Conde d'Eu, responsável pelo massacre de milhares de crianças com idade entre 9 e 15 anos, que enfrentaram os soldados do exército brasileiro sob sua liderança na batalha de Acosta Ñu ou do Campo Grande, em 16 de agosto de 1869, no Paraguai – não acreditem na pintura de Pedro Américo de Figueiredo e Melo! –, dando continuidade às barbáries cometidas por Caxias. Para os interessados, ouçam a música Acosta Ñu aqui.
Voltando à reivindicação do pacificador Caxias por Bolsonaro, só nos resta recordar os versos de Benedetti em sua Ode à Pacificação:
“Não sei aonde irão os pacificadores com seu ruído metálico de paz
quando os pacificadores apontam, obviamente, sacam para pacificar
e as vezes pacificam dois coelhos com uma cajadada só
quem pacifique os pacificadores um bom pacificador será”.
João é bacharel em direito pela PUC-SP, coordenador do Grupo de Pesquisa Marxismo e Direito (GPMD) e advogado.
Referência
[1] FAUSTO, Boris. História Concisa do Brasil. 2. ed. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2006, p. 90/91.