O Acordo Definitivo de Paz foi assinado no Centro de Convenções de Cartagena de Índias, no dia 26 de Setembro, pelo comandante chefe das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia - Exercito Popular e o presidente Juan Manuel Santos.
Compareceram 14 chefes de estado e de governo, entre os quais o general Raul Castro. John Kerry, secretário de Estado dos EUA, representou o seu país. Presentes também as delegações das FARC-EP e do governo colombiano que durante quatro anos negociaram o Acordo de Paz em Havana.
Ban Ki- Moon, secretário-geral da ONU, abriu a série de discursos. Falaram depois, o comandante chefe das FARC-EP, Rodrigo Londoño (aliás Timochenko) e o Presidente Juan Manuel Santos. Este ofereceu a Londoño uma miniatura da pomba da paz.
No próximo dia 2 de outubro, o Acordo será submetido a um plebiscito nacional.
O ex presidente Álvaro Uribe e as forças de extrema-direita que o apoiam empenharam-se numa campanha feroz contra o Acordo, mas tudo indica que o povo colombiano o aprovará por ampla maioria.
O presidente Juan Manuel Santos e o comandante Timochenko expressaram otimismo nas suas intervenções, refletindo a grande esperança de paz do povo colombiano. O fim do conflito armado (52 anos de guerra) é uma realidade, mas a chamada reconciliação nacional é, por ora, uma impossibilidade.
MUITA INCERTEZA NO HORIZONTE
As FARC-EP vão transformar-se em Movimento Nacional, decididas a desempenhar um papel fundamental na vida do país.
Mas as perspetivas do futuro são nevoentas.
Em algumas das antigas frentes a entrega das armas é tema polemico que não suscita unanimidade.
Abstenho-me de previsões.
Sei que os comandantes que em Havana participaram das negociações com os representantes governo enfrentavam uma situação muito difícil.
Por um lado, os meios de deteção no solo da guerrilha são hoje muito mais eficazes graças a sofisticadas tecnologias eletrónicas cedidas pelos EUA à força aérea colombiana. Simultaneamente, segundo observadores internacionais, as FARC-EP não contavam já com a solidariedade das populações camponesas nas principais zonas de combate. E essa carência de um apoio maciço dos camponeses dificultava extremamente a movimentação das guerrilhas. A morte de dirigentes fundamentais como o comandante chefe Manuel Marulanda - um herói da América Latina - e a perda de chefes históricos como os comandantes Raul Reyes, Jorge Briceño e Alfonso Cano, assassinados pelas Forças Armadas, foram duros golpes para as FARC-EP.
NÃO SÃO SOMENTE OS CHEFES GUERRILHEIROS QUE ENCARAM O FUTURO COM MUITA APREENSÃO. OS DIRIGENTES QUE FIRMARAM A PAZ TAMBÉM CONSERVAM MEMÓRIA INAPAGÁVEL DO QUE ACONTECEU À UNIÃO PATRIÓTICA APÓS OS ACORDOS DE LA URIBE ASSINADOS DURANTE O MANDATO DE PASTRANA QUE CRIARAM A ZONA DESMILITARIZADA. Os seus êxitos eleitorais desencadearam, a partir de 1984, uma vaga de terrorismo político. Mais de 5.000 membros da União Patriótica (deputados, autarcas, sindicalistas, inclusive um candidato à Presidência) foram assassinados por paramilitares, pelo exército e a polícia, numa orgia de barbárie que levou as FARC-EP a retomarem as armas.
O temor de que essa tragédia se repita é real. Uribe e os grupos paramilitares não hesitarão em optar pelo terrorismo com o apoio da oligarquia rural.
UMA GUERRILHA HERÓICA
Reafirmei ao longo das últimas décadas a minha solidariedade com as FARC-EP.
Caluniada, combatida pelo mais poderoso exército da América Latina, armado e financiado pelos EUA, colocada pela ONU e pela Comunidade Europeia na lista das organizações terroristas, a guerrilha-partido de Manuel Marulanda, assumindo-se sempre como marxista-leninista, entrou há muito na História como protagonista de uma epopeia.
Com exceção do vietnamita, não se encontra precedente comprável ao seu na luta revolucionária de um povo pela liberdade e independência.
A certeza de que o futuro se apresenta carregado de nuvens sombrias para os combatentes desmobilizados das FARC-EP não afeta minimamente o meu respeito e admiração por essa gente maravilhosa.
Tive a oportunidade de conviver durante semanas no acampamento do comandante Raul Reyes, em El Caguan, com homens e mulheres das FARC. Mantive com Reyes ate à sua morte contato amistoso.
Desenvolvi, antes e depois, com o comandante Rodrigo Granda laços de uma amizade fraterna.
Numa jornada inesquecível em La Macarena, conheci o comandante-chefe Marulanda, que me concedeu uma entrevista posteriormente publicada pelo Avante!
Registo que encontrei na vida poucos comunistas tão preparados ideologicamente como os comandantes das FARC que conheci.
Cumpro um dever ao prestar com estas palavras a minha modesta homenagem às Forças Armadas Revolucionarias da Colômbia - Exército do Povo.
Vila Nova de Gaia, 27 de Setembro de 2016