Sandra Soares tem 38 anos e está habituada a ser precária. Já foi assistente num consultório de dentista, trabalhou nas limpezas e estava agora a trabalhar como operadora de call center da Portugal Telecom (PT), em Lisboa.
Em Novembro de 2014 conseguiu finalmente engravidar após já ter sido operada ao útero por duas vezes. Um desejo finalmente concretizado.
“Partilhei com todos no trabalho, fiquei tão feliz. O coordenador deu-me os parabéns”, diz ao jornal Público, adiantando ainda que alguns dias depois não se "conseguia levantar da cama”.
Por essa razão, ficou de baixa e acabou por receber uma carta de “rescisão do contrato de trabalho por caducidade”. Estava grávida de três meses e quer a PT quer a empresa de trabalho temporário que a subcontratava, a Autovision, negam qualquer tipo de discriminação.
“A PT segue, e define para os seus fornecedores, um código de conduta e princípios, que são cumpridos escrupulosamente e monitorados periodicamente, e não tem conhecimento de qualquer tipo de discriminação relacionada com o caso referido”, disse Público uma fonte oficial da PT.
A AutoVision, empresa de trabalho temporário com sede em Palmela, subcontratada pela PT para a gestão do call center, negou ao mesmo jornal o motivo alegado para a rescisão contratual, referindo que a trabalhadora “nunca” os informou da sua gravidez.
“A nossa actuação guia-se por um código de ética e conduta, bem como pelo código de conduta da empresa cliente, a PT, nos quais não existe lugar a qualquer possibilidade de discriminação, seja por que razão for”.
Sandra Soares diz que soube que estava grávida na segunda quinzena de Novembro de 2014. Até aí, os seus contratos quinzenais tinham tido renovação automática.
No entanto, na carta que recebeu em casa podia ler-se: “o seu contrato de trabalho a termo certo será rescindido por caducidade com efeitos a 15 de Dezembro".
”Ao Público Sandra afirma que "eles têm a faca e o queijo na mão”, e diz não ter dúvidas que foi despedida por ter dito que estava grávida. E acrescenta que já pensou emigrar, mas o companheiro não quer.
No entanto, a perspectiva de estar “desempregada com 38 anos” assusta-a. “Portugal é um país velho. Estou sempre a ouvir isso na televisão. Onde é que temos motivação para ter filhos?”, questiona.
“Locais de experimentação”
João Camargo, da Associação de Combate à Precariedade – Precários Inflexíveis, chama aos call centers “laboratórios laborais, locais de experimentação”. Ao seu conhecimento chegou a notícia da existência de contratos quinzenais e até semanais. Como os recibos verdes passaram a ser mais escrutinados, experimentam-se novas fórmulas, afirma.
“Houve uma deslocação para o trabalho temporário, com mais força das empresas de trabalho temporário, e uma proliferação de formas atípicas de contratação que permitem com mais facilidade despedir individualmente ou equipas inteiras”.Situações que são comuns com operadores de call centers, sublinha João Camargo.