Naturalmente, o sr. Saraiva e consortes dizem ter ido “apresentar os seus pontos de vista”. Porém, não é nas exigências da CIP, já conhecidas e sempre as mesmas, que reside o interesse do caso, mas sim no posicionamento político, que a visita revela, do capital industrial no quadro da “Europa Unida”.
Em boa verdade, a CIP foi tentar em Bruxelas que o OE não passasse por bom e, se possível, fosse chumbado. Foi portanto lá fora pedir ajuda para o que não conseguia cá dentro. Teve a acolitá-la internamente o inevitável Passos Coelho, mesmo já reduzido a uma fantasmagoria, e a frenética Cristas, animada pelo estado comatoso do PSD.
Os frutos foram escassos para tanto esforço: a Comissão Europeia apenas voltou a dizer o que tem dito desde 2016 — que as contas passam mas que o “défice estrutural” (leia-se a necessidade de reduzir as despesas de carácter social) não está bem. É, em todo o caso, uma meia vitória da direita, na medida em que a espada dos cortes sociais continua em condições de desferir o seu golpe sobre a cabeça dos assalariados portugueses.
Mas a diligência dos industriais mostra sobretudo como esta burguesia se sente irmã das burguesias europeias e vê nas instituições de Bruxelas as instituições capazes de defender os seus interesses de classe. A Assembleia da República, o debate parlamentar, a posição dos partidos nacionais, a aprovação pelo presidente da República — estão reduzidos à condição de formalismos por enquanto inevitáveis. As grandes forças e as grandes jogadas são lá fora, junto dos pares europeus.
E repare-se que a CIP não fala apenas em nome do grande capital: expressa também a posição do (para não ir mais longe) médio capital, que está hoje igualmente dependente dos laços europeus urdidos nos últimos 30 anos.
O capital industrial revela assim o seu entrosamento com o capital europeu, do qual é parte integrante e com o qual se encarrega de levar a cabo a exploração comum dos assalariados portugueses. Estamos, pois, longe de uma burguesia “nacional” em conflito com o capital “internacional”, longe de uma suposta “colonização” do capital português pelo estrangeiro. Esta burguesia, portuguesa de nascimento, faz parte desse capital internacional e os conflitos que possa ter com as demais burguesias não põem em causa a sua pertença a uma mesma família.
A consonância do PSD e do CDS com a CIP neste episódio do OE apenas traduz o facto de — a par de uma fusão de interesses entre o capital português e europeu — se ter criado também, necessariamente, no plano da representação partidária, uma corrente política “europeia” para a qual os interesses próprios do país só contam na medida em que se integrem nos grandes desígnios do capital europeu.
Efeitos da “integração europeia”. Nada de admirar se, cada vez mais, a burguesia portuguesa for queixar-se a Bruxelas. E se os Passos Coelho e as Cristas cuidarem de se aperfeiçoar como altifalantes dos Schäuble e dos Juncker.