Mas cunhar essa verdade não começou apenas a partir da iniciativa de seu pensamento ilustre. Ao apoiar esta abordagem, o Comandante-em-chefe teve o maior dos argumentos, o fato de ter sido ele mesmo, ao lado da Geração do Centenário, fruto valioso dos laços férteis dessa história, que se espalharam no abraço e no consenso necessários, para unificar ideais latentes, à distância de séculos.
Essa é uma realidade que ninguém duvida. Foram os mesmos sentimentos, vestidos em outra época, na alma de outros homens e mulheres, mas os mesmos.
Aqueles que fizeram dobrar o sino da usina La Demajagua, também estiveram presentes em um José Martí incansável, que tinha desenvolvido, a partir do exílio, a Guerra Necessária; vibraram fortemente em Julio Antonio Mella, Antonio Guiteras, Pablo de la Torriente, Rubén Martinez Villena, e definitivamente reacenderam naqueles que não deixara morrer o Apóstolo, no ano do seu centenário.
A liberdade, a dignidade humana, o respeito pela autodeterminação dos cubanos, foram as causas comuns que impulsionaram esses seres excepcionais em sua luta. Mas por que, após 1º de janeiro de 1959, depois de termos afirmado nossos direitos, de ter-nos convertido em um exemplo para o mundo, ainda podemos dizer que Cuba está em Revolução e celebramos o 150º aniversário do início das nossas lutas, com a mesma convicção de continuidade histórica? Por que mesmo em tempos de paz usamos o termo Revolução Cubana, para nomear o processo social que defendemos?
A resposta a estas perguntas não precisa de uma busca intensiva na literatura, simplesmente basta ir ao conceito que desse trabalho nos deixou seu líder eterno, para compreendermos que cada sociedade é possível de aperfeiçoar e que, se chegamos até aqui, é porque o triunfalismo nunca foi parte dos preceitos que prevaleceram na construção do país «com todos e para o bem de todos». Ter-nos sentado e acreditar que a Revolução já estava terminada, teria sido o fim.
Desmontar e analisar, em toda a sua profundidade, o que expôs de forma resumida o Comandante-em-chefe, iria precisar da ajuda dos especialistas e acadêmicos mais prestigiados, pois cada uma das palavras de Fidel, que aparecem nesta definição magistral, esconde por trás um sustento ideológico, moral e político de importância incalculável; mas, acima de tudo, raízes históricas imortais. Espero que a simplicidade desta prosa jornalística seja suficiente para delinear, pelo menos, alguns desses princípios que nos tornam eternos revolucionários.
UM CONCEITO, UM TRABALHO, UM FUTURO
Uma das falsas ideias defendidas pelos detratores do socialismo cubano é que esta Ilha ficou detida no tempo. Para aqueles que tentam me desafiar com tais afirmações, eu sempre respondo que eles parecem ter esquecido o país que nos legou a neocolônia.
Agricultura latifundiária, economia deteriorada e cheia de corrupção, indústrias estrangeiras, analfabetismo, fome e miséria. A partir dessa base foi necessário construir uma nova sociedade e foi preciso trabalhar muito duro, sim, porque a esses obstáculos se juntou a pressão de um bloqueio insensato que até hoje, quase sessenta anos mais tarde, sobrevive como um fóssil jurássico.
Mesmo assim, tornamo-nos uma bandeira dos direitos humanos e nos esforçamos para encontrar novos mercados e convertemos a saúde, a educação, os esportes e a cultura em tesouros valiosos e sem paralelos, realizações que ainda são estranhas para muitos países desenvolvidos, que viram as costas à dura realidade do Terceiro Mundo, a globalização neoliberal e a dívida externa.
Porém, mantermo-nos em pé só foi possível por causa do nosso senso do momento histórico e da sabedoria de mudar tudo aquilo que deve ser mudado. E não há indício de retórica banal nessas frases. Essa sempre foi a nossa realidade. Em condições adversas, tivemos que olhar para o presente e pôr nossos pés no chão. É assim que enfrentamos a Crise de Outubro, e foi assim que nos levantamos depois do chamado ‘Período Especial’
Foram essas mesmas qualidades as que nos permitiram aprovar as Diretrizes da Política Econômica, e iniciar um intenso processo para levá-las à realidade. Graças a essa visão, conseguimos conceituar nosso modelo econômico-social, aprovar um plano de desenvolvimento objetivo, de acordo com nosso potencial como nação e ter-nos convertido hoje, como nenhuma nação jamais viu, em um povo constituinte. Um povo que entende que é vital renovar a Carta Magna para dar um passo mais alto no desenvolvimento social.
Pode-se perguntar então, isso seria possível sem plena igualdade e liberdade, sem ser tratado e tratar os outros como seres humanos? Não. Porque se hoje estamos unidos neste novo desafio chamado Projeto Constitucional, se apostamos na continuidade de nossos líderes, é porque nos sentimos assim em Cuba, como seres humanos, com tudo o que esse termo implica.
Fazemos isso mesmo que haja um bloqueio, porque tal como explicou recentemente, em uma entrevista à Telesur, nosso presidente, Miguel Díaz-Canel Bermúdez:
«Que o bloqueio seja levantado não depende de nós, depende do governo dos Estados Unidos. Portanto, não podemos subordinar nosso desejo por realizações, nosso desejo por justiça social, por prosperidade ao que um governo estrangeiro possa exercer como política».
Isso não significa emancipar-nos nós mesmos e com nossos próprios esforços?
Temos resistido ao cerco ao longo dos anos, por muitas razões, mas entre eles, por ter a força moral e dignidade suficiente para desafiar poderosas forças dominantes dentro e fora dos níveis sociais e nacionais. É por isso que Cuba se manifestou contra a Guerra do Vietnã, por isso contribuímos para a derrota do apartheid na África.
Mas essa também é a razão pela qual hoje denunciamos os "golpes brandos" na América Latina, atos tão baixos quanto uma tentativa de assassinato ou golpes de Estado. É por isso que, enquanto o presidente Trump fala sobre políticas hostis, estamos comprometidos com o diálogo, trazemos para a ONU nossa resolução contra o bloqueio e abrimos portas de entendimento com o mundo.
Defender os valores nos quais acreditamos ao preço de qualquer sacrifício, continua sendo uma das nossas prioridades, porque nesses valores de modéstia, desinteresse, altruísmo, solidariedade e heroísmo, encontra-se a ideologia que como nação temos assumido. A mesma ideologia que torna possível, em meio a realidade turbulenta do mundo, que Cuba aposte em que suas futuras gerações nunca se esqueçam de suas origens, e tenham as habilidades necessárias para viver de acordo com seu tempo sem deixar que o consumismo as faça adoecer.
Cabe-nos, como nunca, lutar com audácia, inteligência e realismo, porque sabemos muito bem quais são nossos problemas, mas também sabemos que a alternativa para resolvê-los tem que sair do talento criativo dos filhos desta terra, da resolução e da força para enfrentar aquilo que de dentro nos prejudica.
É imperativo da Cuba de hoje nunca mentir ou violar princípios éticos, porque não há força no mundo capaz de esmagar a força da verdade e das ideias. Aos homens e às mulheres de hoje em dia lhes cabe, tal como fizeram nossos antepassados, ser coerente com suas ações, sabendo que todos os esforços para o bem comum são necessários e que nesta sociedade ninguém é menos importante.
Alguém pode então dizer que o chegou o fim da Revolução, que devemos parar de falar dela a partir de uma visão atual e palpável? Essa palavra, em seu sentido mais básico, fala de mudanças, de profundas transformações, e é isso que os cubanos fazem todos os dias. O trabalho constante, o esforço diário para avançar e fazer do nosso um socialismo próspero e sustentável, não é outra coisa senão a Revolução.
Se Céspedes e Martí pudessem ver grandeza deste processo, se Mella acedesse a qualquer uma das nossas universidades, se Antonio Guiteras pudesse ler nosso projeto constitucional, não tenho nenhuma dúvida, eles veriam ali espelhados seus sonhos, seria o país modelo pelo qual eles deram suas vidas e, certamente, se uniriam ao esforço para continuar mantendo-o em pé, que é tão nobre e necessário como outrora foi o esforço feito para vê-lo livre.
Revolução é unidade, é independência, é lutar pelos nossos sonhos de justiça para Cuba e para o mundo, que é a base do nosso patriotismo, do nosso socialismo e do nosso internacionalismo. Não é permitido falar dela com os verbos no passado, o seu nome é escrito acompanhado do presente, porque 150 anos depois do seu início, a Revolução não é e nunca será parte do passado.