Sobretudo, aposentados, pensionistas e funcionários ativos das secretarias estaduais de ciência e tecnologia e de cultura.
Adotando a prática de dividir para conquistar, o governador tem relegado esses setores ao limbo e ao desespero, no momento, com dois salários atrasados (abril e maio), além do 13º do ano passado. Demais segmentos ou recebem com menor atraso ou estão a receber em dia.
Uma flagrante violação de direitos que conta com a conivência do STF. Ano passado, a corte de Brasília decidiu proibir os arrestos das contas do governo para o pagamento do funcionalismo.
Essa semana, revelando um fiapo corporativo de “sensibilidade”, vedou o bloqueio de contas pelo governo federal, mas não os arrestos judiciais para o pagamento de funcionários dos Poderes Judiciário e Legislativo locais. O resto que “reclame com o bispo”.
As causas da gravíssima crise econômica e administrativa que assola o estado do Rio de Janeiro são por demais conhecidas, bastando mencionar que o ex-governador e padrinho político de Pezão, Sergio Cabral Filho (PMDB), encontra-se preso há meses, em função de comprovadas práticas de corrupção. Não raro, produtos associados à concessão de generosas e irresponsáveis isenções fiscais ao grande capital nacional e estrangeiro.
Instituições de ensino tão importantes para o estado e o País, com amplo reconhecimento acadêmico, como a Uerj, em franco processo de desmonte e inviabilização. A Faetec, uma das principais instituições educacionais que formam os trabalhadores dos quadros técnico-operacionais em atuação na Petrobras, totalmente sucateada. Hospitais, muitos fechados e tantos outros sem condições de atendimento. A segurança, sem recursos mínimos.
Uma miríade de servidores, em diversos setores do funcionalismo estadual, submetida a vexações constantes, por perda da dignidade profissional, por encontrar-se sob um verdadeiro acúmulo de dívidas. Doenças proliferam e mesmo dramáticos casos de suicídio têm ocorrido.
Casos de depressão e problemas cardíacos são comuns. A desmoralização e a perda de horizonte, sentido e dignidade profissional têm provocado situações sobremodo lamentáveis entre o funcionalismo. Uma verdadeira tortura.
O governador Pezão faz o que bem entende, sem controle, nem fiscalização. O Judiciário e o Legislativo local, praticamente, nada fazem. O golpista presidente Michel Temer (PMDB) tem dado todo suporte para o exercício do arbítrio estadual.
Enviou tropas da Força Nacional para lançar bombas nos servidores em protestos. Inúmeras vezes. Meses a fio. Até tropas do Exército foram convocadas para viabilizar a aprovação de projeto que privatizava a empresa estadual de tratamento de água e esgoto.
O estrangulamento financeiro é recorrente, com a adoção da prática contínua de arrestos das contas estaduais. Um terrorismo puro e cristalino para dar sustentação ao governador – com mandato já cassado pelo TRE-RJ – e promover a agenda privatista e neoliberal dos governos de ambas as esferas da Federação. Um “exemplo” brutal que se quer dar a todos os trabalhadores e servidores do Brasil.
Mal comparando, o governo federal tem se comportado em relação aos servidores do Rio de Janeiro como o governo dos Estados Unidos agiram, especialmente, no passado, em face de Cuba e Vietnã. Agressões armadas e restrições econômicas. Terrorismo e estrangulamento financeiro.
O desrespeito campeia. É a fome que pretende impor aos servidores e ao estado, que, diga-se, tem em seu mercado consumidor acentuada dependência do funcionalismo público.
Quanto à mídia comercial e massiva, na melhor das hipóteses, opera com pautas e enquadramentos de natureza fatalista, que em nada contribuem para oferecer visibilidade aos sérios problemas que afetam servidores e serviços públicos.
Isso posto, cumpre salientar que prevalece uma tímida repercussão em torno da tortura sofrida pelos servidores do estado do Rio. Seguramente, os partidos políticos possuem grande responsabilidade nesse cenário tortuoso.
A maioria esmagadora dos partidos se silencia. A violação contínua, ilegal, cruel, de direitos trabalhistas dos servidores, assim como, por extensão, dos direitos coletivos da população, tem se intensificado, contando ainda com a costumeira violência policial arbitrária nos atos em frente à Alerj.
O silêncio impera na maioria dos partidos. O assunto não é foco de atenção, não está incluído nas suas agendas.
Muitos, de natureza liberal-conservadora, por conivência e apoio absoluto às medidas do governo. Covardemente, adotariam a mesma posição do PMDB de Cabral/Pezão.
Outros, de perfil similar e até mesmo integrantes daquilo que se convencionou chamar de centro-esquerda no País, emudecem para não criar suscetibilidades com o PMDB, projetando eventuais alianças em eleições. Demais, igualmente de centro-esquerda e de esquerda, potencialmente imaginam que o caos lhes favorecerá como “salvadores” em alguma eleição.
Alguns raros, mais à esquerda do espectro partidário – que denunciam as medidas arbitrárias e cruéis do governo estadual –, infelizmente, não reverberam na medida da urgência do caso.
Ou apostam no quanto pior melhor nas potenciais e próximas eleições, ou simplesmente possuem em seus quadros pouquíssimos trabalhadores ou pessoas que em algum momento da vida estiveram mergulhadas nas vicissitudes das gentes adultas e trabalhadoras que dependem de emprego e salário para viver.
Cada um em sua respectiva posição, com sua peculiar visão e seu comportamento, em graus diferentes, por omissão, cumplicidade ou desleixo, é também responsável pela covardia e a tortura sofrida pelos servidores do estado do Rio de Janeiro, há quase dois anos. Vítimas de um governo reacionário, desumano, que está acabando com o estado.
Roberto Bitencourt da Silva – historiador e cientista político.