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Diário Liberdade
Sábado, 05 Agosto 2017 13:04 Última modificação em Terça, 08 Agosto 2017 12:46

Votação sindical na indústria automobilística no Mississipi é batalha pela alma do movimento sindical nos EUA

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País: Estados Unidos / Laboral/Economia / Fonte: In These Times

[Tradução do Coletivo Vila Vudu] Os trabalhadores da montadora da Nissan Motor Co. no Mississippi começaram a votar na madrugada dessa 5ª-feira dentro da fábrica. Os votos são secretos. Podem votar 3.700 trabalhadores de montagem e manutenção. A agência governamental que fiscaliza a eleição (National Labor Relations Board) recebeu votos até às 19h da 6ª-feira [NTs].

Depois de anos de trabalho incessante dos organizadores do Sindicato dos Trabalhadores da Indústria Automobilística dos EUA, para construir apoios na grande montadora Nissan de carros e caminhões perto de Canton, Miss., os próprios trabalhadores votaram quinta e sexta para decidir se aceitam ser representados pelo Sindicato nas negociações com a empresa, na fábrica.

"Acho que o Sindicato será aprovado" – disse o presidente do UAW Dennis Williams numa conferência de imprensa apenas poucos dias antes da votação, "mas ainda estamos avaliando. Já pensamos sobre isso há seis, sete meses" – mais ou menos desde uma grande marcha que o UAW organizou, com comício na fábrica, do qual Bernie Sanders participou. O sindicato diz que está preocupado especialmente com um aumento de ações táticas ilegais da direção da fábrica para assustar os trabalhadores, que essa semana acusaram formalmente a Nissan no National Labor Relations Board.

A fábrica em Canton é uma das três únicas fábricas da Nissan em todo o mundo cujos trabalhadores não têm sindicato. Construída em 2003, é uma das 'transfábricas' de automóveis – fábricas que pertencem a estrangeiros construídas com subsídios do estado nas últimas três décadas, principalmente no sul e em estados de fronteira.

Muitos veem a votação como mais um teste de se os sindicatos podem prosperar no sul, onde o número de sindicalizados sempre foi historicamente inferior à média nacional. Contudo, a batalha é muito maior. As estratégias e valores corporativos do sul persistem e influenciaram também as empresas multinacionais, assim como as relações de trabalho e a política no Norte. A campanha na Nissan foi concebida, pode-se dizer, pelo movimento dos trabalhadores norte-americanos, como uma batalha.

Convidada a se manifestar sobre essa matéria, a Nissan não respondeu.

Organizar o Sul

O trabalho organizado, quase sempre promovido pela ala mais à esquerda do movimento sindical, fez grandes campanhas no sul, para organizar sindicatos que superassem as divisões racistas. Essas divisões foram especialmente acentuadas nos anos 1930s, quando se organizavam levantes e a "Operação Dixie" no pós-2ª Guerra Mundial – que não encontrou apoio adequado dos sindicatos existentes e surgiu contaminada por divisões políticas internas.

O Sindicato dos Trabalhadores da Indústria Automobilística dos EUA várias vezes trabalhou organizando o sul, especialmente quando a General Motors considerou realocar grande parte da produção nos anos 1960s – e quando se acelerou o crescimento das "transfábricas" em décadas recentes.

Apesar dos fracos resultados das campanhas de organização dos trabalhadores, muitos estrategistas sindicais creem que os sindicatos só podem reverter o declínio se atacarem diretamente a estratégia racista dos empregadores e de seus aliados políticos conservadores. Mas os empregadores têm muitas ferramentas para dividir os trabalhadores, como, por exemplo, a preferência da Nissan por empregados temporários, contratados para dividir uma força de trabalho predominantemente de norte-americanos afrodescendentes.

Em anos recentes, o sul enfrentou golpes crucialmente decisivos contra seu projeto de organizar os trabalhadores, inclusive a grande derrota de janeiro para o sindicato dos Maquinistas [Associação Internacional de Maquinistas e Trabalhadores da Indústria Aeroespacial] quando se organizava a nova fábrica da Boeing em Charleston, S.C.; e o sucesso apenas limitado do UAW na organização de um sindicato de trabalhadores especializados na Volkswagen em Chattanooga, Tenn. contra um empregador suposto neutro. Derrotas desse tipo quase sempre inspiram cantos fúnebres que promovem a morte de direitos e sindicatos dos trabalhadores, mas são música dançante para gerentes e investidores.

Mesmo assim, há organizadores para os quais o sul seria território impossível. Um veterano organizador da Federação Americana do Trabalho e Congresso de Organizações Industriais (ing. AFL-CIO) que supervisionou várias iniciativas para organizar trabalhadores no sul, e pediu para não ser identificado nem citado diretamente, disse que não lhe parece que o sul seja significativamente mais difícil de organizar; apenas é preciso mais tempo e mais dinheiro.

Esse organizador citou um sucesso que superou todas as expectativas: as campanhas de mais de 15 anos para organizar 26 mil trabalhadores e preservar a operação nos estaleiros gigantes Avondale, na Louisiana, com um grupo de proprietários corporativos que faziam serviços de reconstrução e reparos principalmente sob contratos militares. Adiante, um declínio nos pedidos militares levou o último proprietário a fechar os estaleiros, neutralizando a vitória dos organizadores sindicais.

"Os sindicatos nem sempre se dão conta, mas têm vencido mais no sul que no meio oeste, já há anos" – disse Kate Bronfenbrenner, professora de relações do trabalho na Cornell University, especialista em pesquisas sobre organização sindical. "Porque no sul há mais mulheres e mais afrodescendentes que trabalham, e porque há menos trabalho de alta tecnologia." Essas categorias são mais favoráveis aos sindicatos que seus contrapartes, o que gera uma pequena vantagem, pelo menos em termos teóricos, no sul.

Os baixos padrões do trabalho no Sul estão-se disseminando

Afinal, é possível que os baixos padrões do trabalho no Sul estejam-se disseminando para todo o país. O crescente poder políticos dos conservadores do novo Partido Republicano, associado a políticas mais agressivamente antitrabalho e anti-sindicatos nas grandes empresas e nas grandes financeiras, indicam que, na longa Guerra Civil que corrói os EUA, o sul está ganhando terreno.

Considere-se o que aconteceu a partir de 1983, quando os cartazes da "alvorada nos EUA" de Ronald Reagan [ing. "morning in America"] estavam no horizonte, bem como em 2016, quando Donald Trump prometeu "tornar os EUA grandes outra vez" [ing. "make America great again", MAGA]. Naquele momento, como hoje, muita gente diria que Michigan e Wisconsin seriam países típicos do norte, em termos de condições de trabalho e densidade sindical. Mas naquele momento dados federais mostram que a porcentagem de trabalhadores em Michigan protegidos por contratos sindicais caiu de 32,8% em 1983, para 15,5% em 2016. Em Wisconsin, a queda foi de 26,9% para 9,0%.

Os sindicatos estão perdendo membros e não estão conseguindo atrair novos membros em proporção adequada para evitar ficarem reduzidos praticamente à metade da força de trabalho ao longo dos últimos 15 anos igualmente no sul e no norte.

A violência contra os trabalhadores não tem limites

Será melhor para os trabalhadores se os trabalhadores de Canton, Miss., aprovarem a associação ao sindicato, mas os patrões ainda têm as melhores cartas. Os trabalhadores são fracos e mais fracos ficam a cada dia em quase todos os lugares, com exceções apenas parciais, como o movimento "Fight for $15" [Luta por $15], que cresce em quase todo o país.

Leis do "Direito de trabalhar" ameaçam os sindicatos em todo o país, proibindo que cobrem contribuições de operários não associados (mas que se beneficiam das conquistas dos sindicatos). Em anos recentes, a aprovação de leis desse tipo fora do sul dos EUA – e que hoje já se estendem a metade dos estados norte-americanos – é clara indicação do declínio do poder dos sindicatos.

Os trabalhadores em Canton talvez consigam seu sindicato por várias razões além da ideia simples de que têm de ter poder coletivo para enfrentar o poder dos patrões. Ou talvez rejeitem a ideia de constituir sindicato, por causa do medo gerado pela empresa Nissan e suas campanhas anti-sindicatos, além de convicções políticas conservadoras, dentre outras razões.

Os melhores organizadores sindicais – e vários organizadores muito bons tiveram papel de destaque na Nissan – compreendem como é importante envolver os próprios trabalhadores como organizadores, capazes de influenciar outros trabalhadores diretamente. Mais que isso, os organizadores reconhecem que é vitalmente importante mobilizar líderes progressistas e grupos de apoio na própria comunidade, e usar as mais variadas táticas para minimizar a influência da guerra que os patrões fazem incansavelmente contra os sindicatos – uma guerra que se faz, em larga medida, em campo e por termos que favorecem o patrão.

Mas, se o movimento trabalhista tem obtido vantagens significativas para os trabalhadores, ainda lhe falta criar uma estratégia progressiva para a política, a organização nos locais de trabalho e uma cultura, construída em termos amplos, que vise mais diretamente a classe trabalhadora, incluindo diferentes níveis de pobreza, afluência social e história dos serviços. Os organizadores de sindicatos nos EUA terão de fortalecer e expandir suas atividades nas comunidades, para desenvolver conjunto mais amplo de estratégias que ajude os cidadãos a derrotar o racismo. Em contexto político desse tipo, a organização sindical pode prosperar – e com isso os trabalhadores também poderão prosperar.

Independente de se o Sindicato dos Trabalhadores da Indústria Automobilística dos EUA vencer ou não nesse verão, para que a organização de trabalhadores seja bem-sucedida nas comunidades e locais é indispensável que se constitua como força política alternativa e de transformação, que apoie mais decisivamente o trabalho e os trabalhadores.


* Os trabalhadores da montadora da Nissan Motor Co. no Mississippi começaram a votar na madrugada dessa 5ª-feira dentro da fábrica. Os votos são secretos. Podem votar 3.700 trabalhadores de montagem e manutenção. A agência governamental que fiscaliza a eleição (National Labor Relations Board) receberá votos até às 19h da 6ª-feira [NTs].

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