Em cinco dias, de 23 a 27 de fevereiro de 1917 (8 a 12 de março no calendário atual), a Rússia, convulsionada pela Guerra, foi da manifestação pelo dia internacional da mulher à abdicação do czar, passando por uma greve geral massiva e a sublevação das tropas em todo o país. Como resultado, a formação do Soviete (conselho) de representantes operários e soldados, dominados pelos partidos socialistas moderados (os Mencheviques e os Socialistas-Revolucionários), de um lado, e do governo provisório, por representantes da burguesia liberal, do Partido Constitucional Democrata (ou “Cadete”), de outro.
A burguesia, beneficiada pelos acordos com o governo na I Guerra tentou, até o último minuto, um compromisso com o czar. Não conseguindo que o próprio irmão do czar Nicolau II, o grão-duque Miguel, dirigisse o novo governo, contentaram-se com a condução do príncipe Lvov, membro da nobreza e também do Partido Cadete, ao poder.
Mencheviques e Socialistas-Revolucionários (SR’s), no comando do Comitê Executivo do Soviete, buscavam a anuência do governo provisório, enquanto o governo buscava o apoio do soviete para governar.
Os liberais preparavam a restauração da monarquia. Eram monarquistas por cálculo e por medo, e só concordaram em tomar o poder contanto que a monarquia concordasse em tomar o poder das suas mãos. As massas apontavam no sentido oposto, em direção à República e a uma Assembleia Constituinte.
Esse é o paradoxo da Revolução de Fevereiro: a revolução foi conduzida pela classe operária, mas empossou a burguesia liberal e a pequena-burguesia democrática. Os trabalhadores foram expropriados pelos socialistas moderados (no Soviete) e a burguesia liberal (governo provisório).
Assim, opondo a classe operária a suas direções pequeno-burguesas e à burguesia liberal, a Revolução de Fevereiro preparou as condições para Outubro. Na sua História da Revolução Russa, Trótski assinalou que:
“Tendo dado sua confiança aos socialistas, os operários e soldados encontraram-se, um tanto inesperadamente, expropriados politicamente. Eles estavam alarmados, aturdidos, mas não encontraram de imediato uma saída. Seus outros traidores os ensurdeciam do alto com argumentos aos quais eles não tinham uma resposta pronta, mas que conflitavam com todos os seus sentimentos e intenções. As tendências revolucionárias das massas, mesmo no momento da Revolução de Fevereiro, não coincidiam com as tendências dos conciliadores dos partidos pequeno-burgueses. O proletariado e o campesinato votaram nos Mencheviques e nos Socialistas-Revolucionários não como conciliadores, mas como oponentes do czar, dos capitalistas e dos latifundiários. Mas ao votar neles criaram uma divisória entre si e seus próprios objetivos. Não podiam agora andar para frente sem esbarrar nessa parede erguida por eles mesmos e derrubá-la”.
100 anos atrás a Revolução Russa demonstrou que os países atrasados não vão fazer, na sua evolução, o mesmo caminho daqueles que completaram a sua revolução burguesa nos séculos anteriores.
Na época em que vivemos, a época do imperialismo, a burguesia já se mostrou há muito tempo (desde 1848!) incapaz de conduzir uma revolução. Deixou de ser revolucionária embora as tarefas históricas, que correspondem a uma revolução burguesa (reforma agrária, direitos democráticos etc.), permaneçam vigentes e necessárias.
Por isso, tanto na Rússia de 1917, quanto no Brasil de 2017, as transformações democráticas no regime político e as transformações econômicas e sociais no regime de produção capitalista, só podem ser realizadas por meio do poder político da classe operária, da destruição do Estado burguês e da construção de um novo Estado, controlado pelos trabalhadores e a maioria do povo pobre e oprimido.
“A Revolução Russa é apenas um exemplo, um primeiro passo em uma série de revoluções (…), em essência, um ensaio geral da revolução proletária mundial”, disse seu principal dirigente, Vladimir Ilitch Lênin. Por este motivo é que a celebramos e estudamos no seu 100º aniversário.