De imediato, o Ocidente acusou o presidente do país, Bashar al-Assad pelo atentado. Os Estados Unidos, 3 dias depois, usaram o acontecimento como pretexto para lançar 59 mísseis Tomahawk contra uma base militar síria próxima da cidade de Homs. Apesar das acusações, a autoria do crime em Idlib não foi esclarecida.
Günther Meyer, diretor do Centro de Pesquisa para o Mundo Árabe na Universidade Johannes Gutenberg, em Mogúncia, na Alemanha, afirma que "Somente grupos de oposição armados poderiam lucrar com um ataque com armas químicas. Com as costas contra a parede, eles não têm quase nenhuma chance de se opor militarmente". Ele ainda explica que o uso de tais armamentos só favoreceriam os grupos terroristas.
A declaração de Barack Obama em 2012 parece confirmar essa tese do especialista alemão: "Temos sido muito claros em relação ao regime de Assad, mas também com relação a outras partes do conflito, que uma linha vermelha para nós é quando começarmos a ver um monte de armas químicas se movendo ou sendo utilizadas. Isso mudaria meu cálculo". A mídia estabeleceu esta declaração como "uma linha vermelha" que Obama demarcava, estabelecendo um parâmetro de uma agressão que na época não tinha condições de realizar.
Meyer considera a declaração um convite para os terroristas empregarem armas químicas, responsabilizando o governo sírio. Em 2014, o jornalista investigativo Seymour Hersh relatou sobre a capacidade das forças oposicionistas de usarem armas químicas. Em artigo para o periódico britânico London Review of Books, Hersh citava documentos da Agência de Inteligência de Defesa (DIA), a organização de espionagem própria do Pentágono.
Eles sugeriam que a Frente al-Nusra, então braço sírio da rede terrorista Al-Qaida, tinha acesso ao gás sarin, que afeta o sistema nervoso e é altamente tóxico. De acordo com Hersh, o ataque com armas químicas no subúrbio de Damasco, Ghouta, em agosto de 2013 foi realizado pelos terroristas mas atribuído ao governo sírio. Eles queriam que Washington presumisse que a Síria tinha ultrapassado a tal "linha vermelha" de Obama, para atrair os EUA para uma guerra.
O então diretor de Inteligência Nacional de Obama, James Clapper, com base nestas investigações, convenceu Obama a não atacar a Síria com mísseis de cruzeiro, segundo consta de um livro recém-publicado pelo especialista em Oriente Médio Michael Lüders. Análise dos restos da arma química usada em Ghouta revelou que o gás era de uma composição diferente da substância que o Exército sírio possuía na época.
"O ataque ocorreu enquanto os inspetores de armas da ONU estavam no país a convite de Assad", lembra Meyer. O líder sírio lhes pediu que investigassem um ataque de armas químicas de março de 2013, fora de Aleppo, que matou soldados sírios. "Não faz sentido executar um ataque tendo os inspetores no país", deduz o especialista.
O ex-inspetor de armas Richard Lloyd e o professor do Instituto Tecnológico de Massachusetts (MIT) Theodore Postol também lançaram dúvidas sobre o papel de Assad no ataque de Ghouta. Eles informaram em 2014 que as armas químicas só poderiam ter sido disparadas de um território controlado pelos rebeldes, pois seu alcance máximo era de 2,5 quilômetros.
No momento do ataque Ghouta, o governo sírio tinha acesso a cerca de 600 toneladas de material necessário para fazer sarin e gás mostarda. "O estoque era para contrabalançar o arsenal nuclear de Israel", sublinha Meyer. "Israel tem cerca de 200 armas nucleares, segundo estimativas", ressalta. "As armas químicas são uma espécie de arma atômica de pobre."
A agressão estadunidense fez com que Rússia e Bolívia solicitassem uma reunião extraordinária do Conselho de Segurança. Ambos os países consideraram que o bombardeio foi uma violação flagrante do direito internacional e uma agressão a um membro da ONU. Para a diplomacia russa, a conduta dos Estados Unidos foi desrespeitosa, irresponsável e inaceitável.
Aproveitando a reunião, o secretário-geral da ONU, António Guterres, pediu contenção aos países envolvidos na questão. "Faço um apelo a que se contenham, para evitar qualquer ato que possa agravar o sofrimento da população", disse.
Ao mesmo tempo que classificava o atentado com armas químicas como "crime de guerra", pedia uma investigação que eliminasse qualquer dúvida sobre sua autoria.
"A legislação internacional foi ignorada durante muito tempo no conflito sírio", denuncia, recordando aos membros do Conselho de Segurança que eles têm a responsabilidade primordial de servir à paz e à segurança. A solução da crise na Síria, acrescenta, deve passar pelo respeito a todos os padrões internacionais de direitos humanos.
Guterres assinala, também, que os eventos dos últimos dias realçam a necessidade de que o conflito seja resolvido por meio de uma solução política e, por isso, ele pede que as partes envolvidas renovem de forma urgente seu compromisso para continuar as conversas em Genebra. "A solução política também é essencial para progredirmos na luta contra o terrorismo", afirma, em uma mensagem dirigida aos EUA e à Rússia.
O representante da Rússia, Vladimir Safronkov, classificou como "hipócrita" que agora se fale de potenciar o diálogo político. O diplomata acusou a Washington, Paris e Londres de terem optado "por uma via diferente da cooperação". "Eles têm medo de uma investigação verdadeira e independente do incidente, porque isso os colocaria em questão", concluiu.
Do Portal Vermelho, com informações da Deutsche Welle e do El País