Foi isto que permitiu Lênin aprofundar suas análises sobre o capitalismo e seus fenômenos, como a concentração da produção, as guerras de rapina, a financeirização, o papel dos bancos, a fusão do capital industrial com o capital bancário que se transformou em capital financeiro, o papel da exportação de capitais, a relação entre a periferia e o centro mundial do capitalismo, o surgimento do imperialismo, as alianças entre as burguesias e os conflitos entre elas, que se traduzem nos conflitos interimperialistas, a necessidade de se lutar para construir e fortalecer um partido político revolucionário formado por homens e mulheres cuja tarefa principal é organizar a classe operária e os trabalhadores para a revolução socialista. É o chamado partido de novo tipo.
Um Partido para enfrentar os desafios em uma conjuntura desfavorável, em que a maioria dos Partidos Operários Sociais-Democratas e Socialistas haviam se adaptado à ordem legalista da burguesia e se resumiam a disputar apenas eleições e lutar por reformas, subordinando a classe operária e o movimento sindical à ideologia da burguesia. Assim eram os Partidos da Segunda Internacional, até mesmo na Rússia onde Lênin vivia. Os partidos socialistas não acreditavam na possibilidade de uma revolução na Rússia. Na visão dos Socialistas Russos, incluindo Plekhanov, com quem Lênin travou muitas polêmicas, e outros militantes da social democracia Russa, a Rússia primeiro deveria desenvolver o capitalismo interno avançando para uma democracia burguesa, transformando a Rússia em uma país industrializado, ter mais operários para depois se pensar em uma revolução socialista.
Os diversos grupos socialistas russos do início do século XX não foram capazes de entender que os novos fenômenos e a dinâmica do capitalismo que surgiram entre o fim do século XIX e início do XX colocaram a Rússia dentro do bloco de alianças burguesas. Marx e Engels já apontavam a possibilidade de a Rússia saltar para os processos de revolução, ao estudarem as revoltas camponesas e se corresponderem com alguns socialistas russos, como Vera Zasulitch, sobre a possibilidade da transição socialista na Rússia. Lênin resgata esta ideia da possibilidade deste país saltar para o Socialismo até mesmo antes de outras nações mais desenvolvidas. Os Partidos Socialistas na Rússia, assim como a maioria dos Partidos da Segunda Internacional, escolheram o caminho da conciliação e traição de classe se adaptando à ordem burguesa, contribuindo desta maneira para desarmar os trabalhadores.
Pensar em filosofia nestes tempos de pós-modernidade, onde muitos setores da esquerda estão se rendendo à ordem estabelecida, no momento em que surgem partidos como Syriza, que se tornam referência, é extremamente preocupante, quando até mesmo alguns militantes comunistas valorizam mais as causas opressivas sem tocar fundo no real problema que é o sistema capitalista e as contradições geradas por este sistema.
Na verdade devemos identificar na centralidade do trabalho na luta de classes o real problema do capitalismo e não na cidadania rebaixada negociada ou na mobilidade de uma ou outra camada social da sociedade capitalista a solução das contradições deste sistema que não pode resolver os problemas gerados por suas contradições internas, mesmo que uma ou outra camada social de baixa renda possa colher alguns benefícios com o apoio e amortecimento promovido pela cooptação através de ONGs e da aristocracia sindical e partidária, que vendem a ilusão e cooperação entre inimigos de classe. Nem por isso o capitalismo deixa de extrair mais-valia às custas da exploração sobre os trabalhadores.
Um dos méritos de Lênin para a Filosofia Contemporânea foi recolocar o papel e a importância da filosofia no contexto social, não como uma simples especulação da realidade, mas como reflexo da própria realidade. Ao afirmar e combater as velhas concepções das Ciências Sociais burguesas de neutralidade, Lênin travou um combate sem tréguas com as diversas correntes da filosofia burguesa de seu tempo e sua infiltração entre os militantes do Partido. Não fez nenhuma concessão ao afirmar a superioridade da filosofia desenvolvida por Marx e Engels em relação às diversas correntes da filosofia burguesa. Lênin afirma com todas as letras que a filosofia atual é tão partidária quanto foi há 2.500 anos e que essa visão de neutralidade nada mais é do que um instrumento burguês para desarmar os trabalhadores, deixando-os órfãos do ponto de vista de uma concepção de mundo para enfrentar a concepção de mundo da burguesia. Lênin resgata com sua firmeza o papel da filosofia e do proletariado, em que ambos devem se encontrar como arma e teoria.
Lênin, como filósofo, recolocou o papel da filosofia enquanto prática política. Ele questiona o papel dos professores de filosofia nas Escolas e Universidades. Lênin afirma que os professores de Filosofia, ao aplicarem suas aulas tendo como base os filósofos burgueses, estão apenas agindo como “palhaços embrutecedores do povo”. Ainda hoje continuamos tendo um grande número de palhaços formados nas universidades para embrutecer os filhos dos trabalhadores com explicações tendo como referência os filósofos que sustentam o capitalismo. Muitos professores se formam e vão dar aulas em escolas e universidades públicas e privadas sem um mínimo de conhecimento sobre os filósofos da tradição dialética, que vão dos pré-socráticos a Hegel, de Marx a Lênin, de Caio Prado Júnior a Leôncio Basbaum. Muitos destes autores não aparecem nem se lhes dão a devida importância na grade de Filosofia no Ensino Médio ou nas Universidades.
O filósofo e militante comunista Antonio Gramsci afirmava que Lênin, depois de Marx e Engles, foi o maior filósofo da Práxis. Lênin conseguiu provar a superioridade da filosofia elaborada e desenvolvida por Marx e Engels, tornando-se depois de Marx e Engels o grande continuador desta filosofia.
No campo da filosofia e da luta de classes, não cabe nenhuma concessão às correntes da filosofia burguesa e suas diversas vertentes: Pragmatismo, Positivismo, Neopositivismo, Análitica, Estruturalismo, Pós-Modernidade, Filosofia Trágica, Existencialismo etc. Aceitar concessões diante dos ataques da filosofia burguesa é desarmar os trabalhadores para a luta contra o capitalismo.
A filosofia dialética conseguiu provar a sua superioridade em relação às correntes filosóficas burguesas diante das crises sistêmicas do capitalismo. A filosofia dialética materialista se apoia nas contradições da realidade circundante. Ao investigar estas contradições, a dialética materialista responde que a sociedade capitalista não é harmônica nem una; a filosofia dialética materialista busca dialogar com outras áreas do conhecimento humano, como um meio de ampliar e enriquecer a reflexão. A dialética trabalha a noção de totalidade, uma concepção filosófica que se associa à realidade, é uma visão não fragmentada da realidade como acontece com as diversas correntes da filosofia burguesa.
As contribuições de Lênin para a filosofia desenvolvida por Marx e Engels permitiram aos comunistas não só entender os novos fenômenos do capitalismo em sua etapa imperialista como também nos permitiu desmascarar os militantes e dirigentes dos partidos reformistas da Segunda Internacional que aceitaram colaborar com os governos burgueses ao escolherem os caminhos da conciliação e traição de classe, nos tempos da Primeira Guerra Mundial. Isto também se repetiu após a Segunda Guerra com a socialdemocracia e os partidos comunistas do eurocomunismo na Europa, que aceitaram manter pactos de boa convivência com o grande capital durante a vigência do Estado de Bem-Estar.
Lênin, como militante e dirigente comunista, soube utilizar a enorme riqueza que o marxismo proporciona, em conjunturas desfavoráveis e se mantendo firme na luta, mesmo quando a influência do partido revolucionário diminuía em número e capacidade de intervenção na sociedade, quando parte da intelectualidade progressista rastejava diante da burguesia para tentar preservar alguns pequenos privilégios.
Lênin faz uma defesa intransigente da dialética materialista como filosofia do proletariado e de seu partido como instrumento político, como um meio para se denunciar a conciliação e o cretinismo parlamentar dos partidos reformistas. Quando se fala em Lênin e no leninismo estamos falando da etapa leninista de desenvolvimento do marxismo. Lênin ficou como referência política e teórica para os revolucionários de todo o mundo; o leninismo não se restringiu apenas à Rússia Soviética e tornou-se sinônimo de interpretação da realidade e transformação desta realidade ao lado de Marx e Engels. Utilizar Lênin não impede de se utilizar outros autores comunistas, porém, torna-se um crime político para com o proletariado negar a importância de Lênin para o processo revolucionário, mesmo em uma conjuntura em que a maioria das forças políticas de esquerda é majoritariamente reformista e muitos partidos comunistas no mundo rejeitam a fórmula leninista de organização e o desenvolvimento leninista da Filosofia Marxista.
Neste ano de 2017 estamos comemorando 100 anos da Revolução Soviética de 1917, quando os trabalhadores do campo e da cidade conseguiram derrubar a burguesia da Rússia e dar início ao processo de construção da sociedade socialista em condições muito difíceis, momento em que Lênin teve um papel fundamental.
É inadmissível nestes 100 anos da Revolução Socialista de 1917 não falar e não lembrar de Lênin e sua enorme contribuição para a filosofia elaborada e desenvolvida por Marx e Engles. A incansável luta de Lênin na defesa da dialética materialista como método de análise da sociedade capitalista, sua intransigente firmeza na construção de um Partido Revolucionário como caminho necessário para conduzir os trabalhadores não apenas para lutas econômicas mas também pela independência de classe em direção à revolução socialista.
Pensar em filósofos como Lênin nestes tempos de conciliação e traição de classe é utilizar a Filosofia do Marxismo-Leninismo onde Lênin continua a ter um papel central dentro desta concepção e visão de mundo.
As esquerdas, em especial os comunistas, devem pensar dialeticamente como dizia Caio Prado Júnior: “ao pensar dialeticamente”, os comunistas poderão se armar teoricamente através do Marxismo-Leninismo para buscar suas análises e respostas diante desta conjuntura que enfrentamos. Isto nos permitirá sermos capazes de buscar junto aos trabalhadores construir um programa anticapitalista que possa se tornar alternativa de poder para os trabalhadores, para mudar os rumos em direção ao Socialismo em nosso país.
José Renato André Rodrigues
Professor de Filosofia da Rede Pública Estadual do Estado do Rio de Janeiro
Secretário Político do PCB na cidade de Nova Iguaçu – RJ