Quanto à segunda, a pressão que fez sobre Trump o "partido da guerra" (também chamado "neoconservadores"/lobbystas dos sionistas do AIPAC) é só isso – pressão, nada além disso, porque absolutamente não há prova alguma de que Trump tenha colaborado com alguma Rússia, nem jamais haverá.
Fora do âmbito desses dois processos locais, mas dentro do âmbito de processos globais, outros dois eventos, sim, efetivamente aconteceram, e não se esperava que acontecessem assim tão depressa, nem os profissionais da ciência política esperavam, embora nesses dois casos o problema parecesse ser "quando", não "se": os dois referenda encenados no Iraque, pelos curdos; e na Catalunha, pelos catalães. E embora à primeira vista esses dois referenda talvez pareçam não ter qualquer relação entre eles, na realidade estão, sim, conectados e têm potencial para causar mudanças tectônicas na ordem global existente.
Quanto ao referendum curdo, no Iraque, já foi jogado na lata de lixo da história. O "presidente" (na verdade, o mandato dele nesse cargo já expirou há eras) da região curda do Iraque Masoud Barzani (que representa uma facção dentre várias que lutam pelo poder) recebeu luz verde dos seus patrocinadores em Riad e Telavive para dividir o Iraque, num momento em que o Exército do Iraque, unidades de Contraterrorismo e Forças de Mobilização Popular (em geral chamados de "milícias xiitas/milícias pró-Irã" na mídia-empresa ocidental, como parte de uma narrativa sectária patrocinada também pelos mesmos Israel e Arábia Saudita) derrotavam o ISIS em todo o Iraque, exceto (até o momento em que escrevo) num pequeno ponto: Al-Qaem e no deserto de Anbar.
No fim das costas, a jogada de Barzani desabou diretamente de cara no chão, e Abadi mandou refazer o mapa de batalha iraquiano devolvendo-o ao que era em 2003, com os Peshmerga curdos expulsos de Kirkuk e de além-Kirkuk. Agora o Sr. Barzani, que renunciou logo depois, resultado desse momento de loucura, deve prestar contar ao governo central dos $51 bilhões de dólares que roubou de empresas de petróleo do Iraque. Com isso, os curdos na Síria também sofreram duro golpe, os mesmos que ocuparam Raqqa e tinham esperança de tomar o maior número possível de campos de petróleo em Deir Ezzor. E esses tolos vão acabar do mesmo jeito – obrigados a devolver ao controle do governo central os territórios que tomaram.
Entrementes, a 5 mil quilômetros dali, em Barcelona, a ordem global unipolar que foi cimentada por efeito de os EUA terem ocupado metade de Berlin, com a subsequente criação do bloco chamado OTAN – mero pretexto para implantar armas atômicas na Europa, todas apontando para a Rússia –, aquela ordem também está rebentando nas costuras.
Outro marionete anglo-saxão sob formato de rei Felipe 6º de Espanha, acompanhado de seu poodle Mariano Rajoy, está perdendo a hegemonia sobre os trabalhadores e trabalhadoras da Catalunha.
Antes do 27/10, quando a Catalunha foi declarada independe da Espanha pelo Parlamento catalão, aproximadamente 20% do orçamento da Espanha e aproximadamente 25% de todas as exportações espanholas eram produzidas na Generalitat de Catalunha – 6,3% do território espanhol. E, como recompensa por ajudar a pagar os €1,173,000,000,000 da dívida nacional da Espanha, a Catalunha recebeu só uma cusparada da coalizão governante chefiada pelo "Partido do Povo", de Rajoy. Mas atribuir os desenvolvimentos recentes na Espanha exclusivamente a razões de ganhos e perdas financeiros é contar só metade da história.
Espanha é país de 500 anos, construído a partir do casamento do Rei de Aragão e Catalunha, com a Rainha de Castela. Na verdade, a Catalunha é muito mais antiga que a Espanha, mas a fundação da Espanha, Madrid, desde então sangra sistematicamente a Catalunha. – Até a bandeira da Catalunha roubaram, para significar subordinação. Embora o Parlamento Catalão seja o segundo mais antigo da Europa, perdendo só para o Tynwald, Madrid gosta de acreditar que o idioma catalão seria derivado do espanhol, e que jamais teria existido algum Reino da Catalunha! Como se não bastasse, desde 1492 os catalães resistem contra a colonização e a repressão que sofrem de Castela.
Fato é que o "Partido do Povo" de Rajoy chamava-se inicialmente "Aliança Popular (Alianza Popular), que foi partido autoproclamado franquista. Os fundadores da Alianza Popular foram figurões do regime de Franco e da Falange – por exemplo, Manuel Fraga Iribarne, ultracatólico, da ordem Opus Dei. E, como se sabe, nos anos 1940s o general Francisco Franco – instalado e apoiado por London & Co – tratou comunistas e os chamados "separatistas" mais ou menos como os pistoleiros de Hitler trataram os eslavos, ou como o sucessor de Adolf em nossos dias, Petro Poroshenko, trata os "Moskals" em geral.
Uma das vítimas mais proeminentes da brutalidade de Franco foi o líder catalão Lluís Companys, executado dia 15/10/1940, depois de ter passado os 12 meses anteriores exilado na França. E quase exatamente 77 anos depois, Pablo Casado, membro do "Partido do Povo", em tom de ameaça, lembrou ao atual líder catalão Carles Puigdemont, precisamente esse evento:
"Nada temos a ceder ou a negociar com os líderes do golpe. Para a pessoa que declara o golpe, a coisa terminará como terminou para o outro que o declarou há 83 anos."
É apenas um exemplo do comportamento dos bandidos do "Partido do Povo". E afinal, maçã envenenada não brota longe da árvore envenenada. Vejam, por exemplo, esse fragmento de notícia do início de 2017, que parece nada ter a ver com Angela Merkel nem com Bruxelas em geral:
"O primeiro-ministro da Espanha Mariano Rajoy, tornou-se o primeiro premiê espanhol em exercício intimado a testemunhar numa corte criminal, nessa 4ª-feira, quando negou enfaticamente ter conhecimento de qualquer prática ilegal de financiamento dentro do Partido do Povo, atualmente no poder."
Em outras palavras, Rajoy tem canalizado dinheiro dos contribuintes para seu próprio bolso, a serviço da Família Real Espanhola, a qual, por sua vez, também foi intimada a depor em 2016, também sob acusações de corrupção. É por causa de fatos como esse, não por causa de ânsia por mais dinheiro e poder – como as disputas oligárquicas na Ucrânia, que milhões de catalães votaram a favor de se separarem da Espanha e de romper todos os laços que os ligam ao cartel criminoso conhecido como Madrid.
Infelizmente, o saque contra fundos públicos não é crime que se limite aos políticos. O melhor amigo da equipe de futebol Real Madrid do "Partido do Povo" também era melhor amigo do regime de Franco. O atual presidente de Los Blancos Florentino Pérez também teve de depor perante o tribunal e, sim, acusado de corrupção (em outras palavras – por estar mancomunado com a gangue de ladrões de Rajoy)! Mas esses interrogatórios e sessões de tribunal são pura encenação, porque nenhum juiz se atreveria a ofender a monarquia em Madrid.
Como se pode ver, o referendum na Catalunha não foi resultado de repentina especulação por um punhado de homens 'das elites' comoGeorge Soros, independente do que digam lunáticos da conspiração do tipo Alex Jones. E pode-se provar num experimento simples: perguntem a qualquer residente em Barcelona se recebeu qualquer dinheiro do afamado financista esse mês, ou se foram só os mesmos €300 do Estado, porque não há empregos – resultado de décadas de assalto pelo FMI e pelos donos dos cassinos de Wall Street.
Afinal de contas, sejam os curdos ou os catalães, a história sempre se repete até que se resolva o problema raiz de todos os problemas. As contradições que se veem aflorando por toda a Europa são simplesmente manifestações dos esqueletos escondidos nos armários.
A Ucrânia tem seu esqueleto na pessoa de Stepan Bandera que colaborou com os nazistas; e a Espanha tem Francisco Franco. Ambos reles fantoches do eixo Londres-Washington, que exportou o legado sórdido dessas figuras de repressores pervertidos até o contexto em que vivemos hoje. Ambos foram submetidos à estratégia testada e aprovada do "dividir para governar".
Mas que ninguém se engane: foi a decisão da Rússia, de entrar no teatro de guerra na Síria para chutar para fora do Oriente Médio os EUA e aliados que deu espaço de manobra ao povo da Catalunha.
Espera-se porém que não seja preciso instalar sistemas S-400 em Barcelona, porque pensar numa Iugoslávia 2.0 só faz aumentar a miséria e o sofrimento, além do cansaço descomunal acumulado em todo o planeta, de décadas de guerra que só beneficiam as famílias ditas "reais" sentadas em castelos, com diamantes saqueados da África encrustados nas respectivas coroas ocas, encharcadas de sangue.