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Diário Liberdade
Terça, 13 Fevereiro 2018 00:03 Última modificação em Sábado, 17 Fevereiro 2018 19:09

O mundo arde enquanto a esquerda ocidental anda em querelas

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/ Laboral/Economia / Fonte: Resistir

[Andre Vltchek] É realmente uma vergonha, e cansativo, mas na verdade não há nada de novo: na actual desordem entre os inúmeros "progressistas"' e intelectuais "semi-esquerda", publicações, movimentos e partidos políticos do ocidente.

Covardia, egos enfatuados, falta de disciplina e mesquinhez intelectual são muitas vezes culpados, mas isto não é tudo.

Agora é absolutamente claro que a esquerda ocidental perdeu, de modo evidente e vergonhoso. Não tem quase nenhum poder, não tem coragem para lutar ou assumir riscos, e não dispõe de seguimento político real na Europa, América do Norte, Austrália ou Nova Zelândia. "As massas", aquelas proverbiais "massas oprimidas", ultimamente têm votado e eleito vários populistas semi-fascistas, demagogos de direita sem desculpas e pró-oligarcas estúpidos.

Todas as "certezas teóricas" marxistas têm estado a desmoronar-se diante dos nossos olhos, pelo menos no ocidente.

Em grande medida, o que agora acontece é absolutamente natural. A esquerda europeia traiu, já nos anos 80 do século passado, tornando-se demasiado maleável, demasiado indisciplinada, demasiado cautelosa e demasiado centrada em si própria. Colocou o pragmatismo acima dos ideais. Rapidamente adoptou o léxico do establishment liberal, completado com as concepções ocidentais de direitos humanos, princípios democráticos e correcção política. Deixou de ser revolucionária; no essencial cessou toda actividade revolucionária e abandonou o elemento central de qualquer verdadeira identidade de esquerda – o internacionalismo.

Sem pelo menos alguns princípios internacionalistas básicos, a esquerda está agora reduzida essencialmente a algum sindicalismo de nível local: "Deixem-nos lutar por melhores condições de trabalho e cuidados de saúde no nosso país e que se dane isso da pilhagem neocolonialista do mundo, que se espera poder pagar a maior parte dos nossos benefícios. Enquanto nós comermos bem e tivermos férias prolongadas, por que nos deveríamos revoltar, por que deveríamos lutar?"

A esquerda do ocidente também falhou em se referir honestamente à História global, em particular ao papel que a Europa e América do Norte têm desempenhado. Muitos dos chamados pensadores "progressistas" ocidentais no fundamental adoptaram as interpretações da retórica imperialista e revanchista de vários acontecimentos históricos essenciais, tornando-se portanto eles próprios "anticomunistas".

Depois disso, quase tudo foi perdido, foi por água abaixo.

Bandeiras revolucionárias foram queimadas, pelo menos metaforicamente. Boas velhas palavras de ordem foram descartadas. Então, em vez de marchas, manifestações e confrontos com as autoridades que representam o regime, rapidamente cada vez mais confortáveis sofás frente aos mais recentes televisores de alta definição encheram-se com milhões de corpos flácidos excessivamente acomodados.

Agora desencadeiam-se lutas torpes sobre um bolo em contracção. Teóricos trotskistas e maoístas atiram-se às gargantas uns dos outros. Há também leninistas e outros, muitos outros.

As coisas ainda foram mais longe: por estes dias, no Ocidente, a maior parte dos "progressistas" adopta uma "agenda dos acontecimentos correntes", recusando comprometer-se de alma e coração com qualquer coisa maior. Esta posição está cada vez mais em voga e essencialmente proclama: "Tenho minha própria filosofia. Não preciso de absolutamente nenhuma ideologia".

Nenhuma revolução foi ganha desta forma. Mas no Ocidente, não há qualquer desejo de verdadeira revolução. Pertencer à esquerda é sobretudo apenas uma pose, com uma conta num site de media social e uma selfie. Não é sério e não pretende sê-lo.

Há, naturalmente, anarco-sindicalistas com seu ar de superioridade e teorias sublimes que seriam totalmente rejeitadas e ridicularizadas pela grande maioria dos povos verdadeiramente oprimidos em lugares como a Ásia ou a África.

Ultimamente, nem mesmo sei mais quem é quem, nesse pequeno e insignificante mundo. Não o estou seguindo, dificilmente participo em discussões teóricas.

Escrevo, usando basicamente apenas duas publicações como minha plataforma, a partir dos quais a minha escrita vai para o mundo, em vários idiomas.

Mas esse "pequeno e mesquinho mundo" obviamente está a seguir-me. E não gosta do que ele vê.

Depois de haver publicado cerca de 300 ensaios nos últimos sete ou oito anos numa das mais importantes publicações do ocidente (na verdade não quero dizer o nome da publicação, mas a maior dos meus leitores certamente sabe de qual estou a falar), fui literalmente atirado fora no final de 2017. Nunca descobri a verdadeira razão, mas muito provavelmente foi devido às minhas convicções "demasiado à esquerda" e demasiado anti-ocidentais, de retórica demasiado aberta. E, sim, havia na verdade uma indicação: os editores não gostavam que eu escrevesse para "media russos apoiados pelo Estado", os quais por sua vez têm algumas ligações a sites alegadamente da esquerda radical nos EUA.

Aos olhos dos anticomunistas, que se guiam pela agenda dos meios de comunicação ocidentais, qualquer media "patrocinado pelo Estado"' ou "controlado pelo Estado" é mau, muito mau!

Mesmo que pertença a países que estão lutando heroicamente contra o imperialismo ocidental, tentando salvar o nosso Planeta. Ou talvez seja considerado particularmente mau se se pertencer a tais países. O que obviamente se aplica aos meios de comunicação chineses, russos, cubanos, venezuelanos ou iranianos. Em resumo – aplica-se a todos os media que em todo o mundo lutam para impedir que se verifique o monstruoso destino preparado pelo imperialismo ocidental; aos media que combatem com empenho e com (ultimamente) tremendo êxito.

Ao invés de obedientemente esperar pela direita ou pela esquerda do ocidente a fim de definir o mundo, agora os chineses, russos, latino-americanos e os povos do Médio Oriente estão de súbito a atreverem-se a redefinir os acontecimentos que acontecem neste planeta. Eles entrevistam os próprios ocidentais, reflectindo aqueles monstros em que se tornaram as sociedades europeia e norte-americana.

Ao invés daquele "nobre" "olhem o que estamos a fazer pelo o mundo", as verdadeiras vítimas, mas também os verdadeiros revolucionários estão a liderar debates apaixonados.

Ao invés de alguns professores doutorados debaterem em Londres sobre se a China é verdadeiramente comunista ou não, agora é o povo chinês a falar, esclarecendo o que seu país é e não é.

E a esquerda do ocidente não gosta. É claro que não gosta absolutamente nada de tais desenvolvimentos.

A esquerda do ocidente "não gosta de quaisquer media patrocinados pelo Estado". Não gosta quando outros falam. Bem, pode ser ainda mais profundo do que isto: parece que efectivamente realmente não gostam de quem realmente está a lutar e de quem está a ganhar: " não gostam da esquerda que realmente se mantém no poder"

Porque a esquerda no ocidente é muito mais parte do ocidente do que da esquerda.

Porque bem lá no fundo, está confortável e mesmo obcecada com a sua excepcionalidade.

Porque apesar de horríveis séculos de pilhagem imperialista e colonialista do mundo pela Europa e América do Norte, realmente não acredita que os crimes foram cometidos por causa da cultura ocidental e do seu modo de pensar.

Porque, no fundo, realmente não acham que as nações não-ocidentais, os seus media e pensadores sejam capazes de definir e descrever o mundo com precisão ou até mesmo descrever os seus próprios países com precisão. Os media não-ocidentais simplesmente não podem e não devem ser de confiança. Só os intelectuais ocidentais têm o direito herdado para tomar decisões plenamente qualificadas sobre temas tão importantes como: se China é comunista ou não, se a Rússia sob o presidente Putin é um país progressista ou não, se o Irão é socialista ou apenas um brutal Estado religioso, se o governo de Assad é "legítimo", se a liderança norte-coreana é "louca" ou se o presidente Maduro da Venezuela "foi longe demais".

Quando o mundo finalmente se prepara para se defender contra as inevitáveis agressões ocidentais, quando os povos da Ásia, Rússia, América Latina, África e Médio Oriente estão a descobrir as suas próprias vozes silenciadas durante séculos pela barbárie colonialista, quando os governos desses países estão a tornar possíveis tais plataformas de discussão, a esquerda ocidental uiva para a lua, batendo no peito em gestos de arrogante narcisismo e basicamente insulta aqueles que estão a lutar, a manter-se de pé, a construir um mundo muito melhor e, sim, – governando!

Em vários países da América do Sul, a esquerda foi recentemente derrotada precisamente porque foi demasiado influenciada "ideologicamente" (ou mais precisamente, "anti-ideologicamente") por aqueles fracos, obsoletos e super-cautelosos pseudo-revolucionários ocidentais. Os povos latino-americanos não deveriam cometer semelhantes erros no futuro e esperançosamente não os cometerão.

Nenhum país revolucionário pode visar a perfeição, por enquanto. A Revolução não é um mar de rosas, disse Fidel. Defender o país contra invasões estrangeiras brutais não é uma coisa gentil: é extremamente confuso e sangrento.

A esquerda fraca e de pele fina do ocidente pode exigir dos governos revolucionários não-ocidentais tanto "pureza" como uma "abordagem com luvas de seda", simplesmente porque não tem ideia (ou não se importa) do que é governar países em que milhões de homens, mulheres e crianças foram obrigados a viver na miséria absoluta, depois de serem roubados de tudo por europeus e norte americanos condutores de escravos. Um simples erro que esses governos façam, um sinal de fraqueza e os seus países irão esfumar-se, acabar em ruínas, no esquecimento: como o Iraque, o Afeganistão, a Rússia de Yeltsin, ou a China durante o "século da humilhação".

O "excesso de sensibilidade" da esquerda ocidental é na verdade apenas uma fachada, não é real.

Apenas como exemplo: os editores da revista acima mencionada, a qual tão sem cerimónia deixaram de publicar meus trabalhos, nunca demonstraram qualquer interesse no meu bem-estar ou segurança. Acho que se caísse morto numa das zonas de guerra que cobri, eles mal notavam. Artigos e ensaios assinados por mim iriam simplesmente deixar de vir. Afinal, toda a gente é substituível. Oferecer apoio qualquer estaria abaixo de sua dignidade. Mas pedir regularmente apoio financeiro ao leitor nunca esteve.

Os meios de comunicação nos países revolucionários "patrocinados pelo Estado" tratam o seu pessoal de forma diferente. Pelo menos alguns assim o fazem.

E a querela continua. Perdi o interesse nos pormenores. É muito consumidor e tempo e irrelevante.

Entretanto, sinto-me mais confortável escrevendo para esses altivos media, de todo o mundo, editados longe do ocidente. Gosto quando os meus camaradas estão a fortalecer-se, quando estão a vencer. Quero que eles governem e governem bem. E quero que os seus países sobrevivam.

As coisas são tão simples como isso!

É uma grande honra mostrar meus filmes na TeleSur e Al-Mayadeen, escrever para a New Eastern Outlook, China Daily, Countercurrents, Global Research e Russia Today. E gosto de aparecer ao vivo, regularmente, na PressTV iraniana. Sinto que cada palavra que escrevo e emito através desses meios de comunicação se destina aos meus amigos, aos meus camaradas, pela nossa luta e por um mundo muito melhor.

E deixem-me repetir: Quero que meus amigos e camaradas vençam, tenham êxito e, sim, governem!

A esquerda ocidental pode continuar a querelar e mastigar-se: " Quem disse o quê? Quem é realmente de esquerda e quem não é? Quem é marxista puro e quem é simplesmente um social-democrata?"

Nem todos os media da esquerda ocidental são como o acima descrito. Ainda existem alguns maravilhosos escritores e editores no ocidente. Mas a situação geral na Europa e América do Norte está a deteriorar-se.

A governação e a luta revolucionária e internacionalista da esquerda nos países independentes geralmente não tem tempo para debates sublimes. Temos Moscovo, Pequim, Caracas, Havana, La Paz, Damasco e muitas outras cidades maravilhosas às nossas costas – para defender. Lidaremos com a teoria mais tarde, muito mais tarde, depois de vencermos, depois de haver verdadeira paz, acompanhada por justiça, depois todos nós neste planeta podemos nos orgulhar do que realmente somos – nós próprios e definidos por nós próprios!

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