Pois bem, se isto é assim, diante do cenário atual em que nos encontramos, é porque funcionam! Então, por que existem setores político que tem resistência em trabalhar com elas? Para responder esta pregunta, vou contar uma história.
Havia uma tribo que foi dizimada e despejada de suas terras pelos conquistadores. Os sobreviventes fugiram em busca de um lugar seguro, mas acabaram também muito distantes das terras férteis e das nascentes de água fresca. Assim, definitivamente, estavam condenados a uma morte lenta, mas segura. Diante desta realidade, três guerreiros decidiram empreender uma missão. Eles se propuseram a voltar às antigas terras para espiar os inimigos e assim descobrir uma forma de derrotá-los. Depois de vários dias escondidos ao redor do acampamento dos conquistadores, os guerreiros viram como funcionavam as armas e os cavalos. Uma noite, aproveitaram o descuido de um guarda, entraram no acampamento e roubaram armas, munições e cavalos.
Os três guerreiros decidiram aprender a usar as armas antes de voltar à tribo. Ao cabo de uns dias, depois de alguns acidentes pequenos, já estavam prontos para voltar à aldeia e apresentar a artilharia com que seria possível derrotar os conquistadores e salvar a tribo. Ao chegar, souberam que os sobreviventes mais velhos agora já estavam mortos, fruto da fome que assolava a comunidade. Ao se ver sem os sábios para apresentar as armas, os guerreiros as apresentaram à tribo reunida, para que em conjunto decidissem o que fazer com elas. Primeiro foram os cavalos, os guerreiros mostraram que eram animais, como qualquer outro, capazes de ser domesticados para ser utilizados em diversos fins. Logo, foi a vez das espingardas que, com alguma prática e melhorando a pontaria, se tornariam armas letais.
Os guerreiros, entusiasmados com a possibilidade de derrotar os conquistadores, recuperar as terras e com isso salvar a tribo, começaram a desenhar o plano de ataque. Ao cabo de um tempo começou a circular o rumor de que as armas eram, na verdade, uma feitiçaria e que ao utilizá-las, os deuses ficariam furiosos. Como já não havia idosos sábios para perguntar se isso era verdade ou não, o rumor começou a tomar força criando um estado de paranoia no interior da tribo. Inesperadamente surgiu um indígena, que não era nem tão velho para ser sábio, nem tão valente para ser guerreiro, e propôs destruir as armas e sacrificar os cavalos, já que não eram parte de sua cultura, e seria melhor, na dúvida, fazê-lo rápido para acalmar os deuses.
Hoje ninguém sabe o nome deste indígena, nem dos três guerreiros, tampouco da tribo.
Esta é uma dessas histórias que, independente de sua veracidade, pode ter ocorrido uma ou várias vezes. Porém, serve de analogia para que pensemos se por acaso alguns setores políticos – principalmente de esquerda – que rechaçam de antemão qualquer uso de “fake news”, sem dar sequer espaço para entendê-las, escondendo-se em uma ingênua “superioridade” moral, não são como este indígena que provocou a morte de sua tribo.
Como funcionam as armas do inimigo?
Quando uma fake news cumpre seu objetivo não é pela mentira em si, mas pelo caminho digital que a fez chegar aos cidadãos alvo e estes, por sua vez, tenham tido disposição para reenviá-la a outros, e assim ganhar uma discussão – inconsequente na maioria das vezes – sem a necessidade de dizer a verdade. Desta forma as fake news criaram a maior feitiçaria de todas, capaz de fazer se enojar os deuses de todas as tribos juntas. Já não é necessário dizer a verdade para ter a razão!
Hoje em dia, um objetivo chave nas campanhas políticas é fazer com que as redes que formam parte da campanha do candidato sejam o sincronizadas o suficiente para fazer uma fake news – na maioria das vezes ridícula – parecer uma verdade incontestável. Isso se conquista espalhando a mensagem corretamente na atmosfera digital. Para dizê-lo de forma mais clara, em vez de repetir mil vezes uma mentira, basta só algumas poucas vezes, mas feitas de forma sincronizada, em lugares e por pessoas específicas. Desta forma, se obriga o adversário a abandonar sua agenda narrativa para vê-lo se perder entre esclarecimentos e argumentos que não lhe somam nada, enquanto a correlação de forças vai se tornando cada vez mais desigual.
Para entender as fake news é necessário imaginá-las como as bala de chumbo dos conquistadores e a verdade, em seu sentido místico, como as flechas dos indígenas, mais lentas e menos daninhas. É por isso que é necessário equilibrar o jogo, inclusive para o bem da democracia. Para isso, os que estão perdendo devem entender que essa “superioridade moral” com a que depreciam as fake news não os faz sábios, nem guerreiros e... já sabemos tomo termina a história.