Enquanto uma pequena parcela de tudo o que se passa está consciente, há um vasto território latente. Nesse sentido, tanto o consciente quanto o inconsciente sofrem influência do meio em que estamos inseridos. Ou seja, nossas vontades, atitudes e percepções são concebidas enquanto resultado de experiências e conduções que nos chegam consciente ou inconscientemente.
Com fulcro em estudos desse ramo, a Google vem desenvolvendo seu aparato tecnológico para o que parece ser um dos derradeiros passos do afivelamento de uma cela para a cavalgada guiada da condição humana. Isso porque, desde seus primeiros aplicativos, a empresa tem acesso aos mais básicos tipos de informação de seus usuários. E note-se que ninguém está livre disso: O movimento de conquista é tamanho que qualquer aparelho eletrônico do mercado já possui esses aplicativos como parte siamesa do produto. Dessa forma, é impossível adentrar nos mimos tecnológicos sem adquirir conjuntamente os serviços e produtos da Google.
Com essa realidade, a empresa vem não só informando localizações, como também ditando, em irresistível influência, os lugares que frequentamos, as pessoas que conhecemos, os produtos que compramos. Ora, é isso que vemos nos aplicativos de relacionamento online, de promoções de restaurantes, de dicas de viagens: um modelo de vida é selecionado para nós e, a cada escolha que pensamos nos permitir, novos padrões são criados e direcionados para a nuvem que, em ciclo, nos oferece mais padrões e retem mais e mais informações a respeito de cada usuário.
Nesse cenário, chegou ao Brasil um dos mais comentados jogos dos últimos anos: o Pokemon Go.
Do grupo Google, o jogo propõe entretenimento exterior, ou seja, diferentemente das visões de futuro em que o homem estaria recluso entre quatro paredes, alienado na tecnologia, os jovens e adultos que aderem à “caça” Pokemon são obrigados a sair de suas casas para alcançar os objetivos do jogo.
Aí já podemos retomar a psicanálise: a forma como o jogo nos chega e a possibilidade quase real da obtenção de um objeto fictício (o Pokemon, que somos estimulados a desejar desde crianças), acaba por exercer influência direta consciente e inconsciente. Dessa forma, somos obrigados a agir em um determinado padrão para a satisfação do desejo – que, ressalte-se, não é nosso.
O problema é que, nesse ponto, o próprio desejo é o resultado que a empresa estimulou em nós. Em outras palavras, queremos o que a empresa dita ser apetitoso e agimos como a empresa igualmente dita, para o alcance do que queremos – que não é a vontade pura em si, mas o que foi estimulado.
A alienação torna-se completa. A Google não apenas tem acesso aos lugares que vamos (por exemplo), é também detentora do poder de dizer onde quer que estejamos. É o mesmo que tem acontecido com a comida, relacionamentos virtuais, etc. Estamos condicionados a vontades alheias e, consequentemente, estimulados a ações que correspondem a vontades alheias.
Nessa condição, seguimos encabrestados: Uns na ilusão da resistência às formas de manipulação das vontades e ações do homem, outros entregues por completo ao enfadonho mundo virtual do ego e do querer, sem sequer permitir-se a reflexão.
* Pedro Henrique Moreira da Silva é militante da JPT-MG