A reportagem é de Luis Badilla, publicada no sítio Il Sismografo, 02-05-2016. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
"Não há argumento mais poderoso para aceitar as crianças refugiadas desacompanhadas do que a recordação daqueles que chegaram ao Reino Unido, no 'Kindertransport', da Alemanha, da Tchecoslováquia, da Polônia e da Áustria depois da Noite dosCristais" (9 e 10 de novembro de 1938).
Entre essas crianças, estava Ruth Barnett, que, dias atrás, discursou no Centro Cardeal Hume, para comentar a trágica decisão da Câmara dos Comuns que, com um voto majoritário, rejeitou a acolhida de 3.000 crianças órfãs sírias já na Europa.
"Não devemos esquecer as lições do passado, da história, não só para termos certeza de que não faremos os mesmos erros, mas também para repetir as coisas boas e positivas", disse a senhora Barnett, que se referia especificamente à iniciativa rejeitada no Parlamento do Reino Unido e que a jornalista Marina Corradi (Avvenire) contou assim: "Quem apresentou a proposta de acolhida foi o trabalhista Lorde Alf Dubs, de 83 anos, que chegou em Londres em 1939 da Tchecoslováquia, graças a um Kindertransport, isto é, ao asilo concedido pela Grã-Bretanha para 639 crianças provenientes de regiões ocupadas pelos nazistas. Dubs tinha seis anos na época e hoje, detentor há muito tempo do título de Lorde, evidentemente sentiu o dever da memória, sugerindo que se acolham as crianças deixadas sozinhas dentro de uma guerra, como ele foi. O velho trabalhista bateu, mas não lhe foi aberto".
Depois da fatídica Noite dos Cristais, lembrou Ruth Barnett, o então governo de Londres, em 1939, organizou, com a ajuda de outros países e diversos serviços secretos europeus, uma grande operação de resgate de crianças alemães, austríacas, poloneses e tchecoslovacas, que, sem os seus pais, chegaram ao Reino Unido. Eram 10.000, quase todas judaicas. Entre elas, estava a senhora Barnett; ela tinha apenas quatro anos e estava acompanhada por um irmão mais velho do que ela.
Dirigindo-se aos presentes no Centro Cardeal Hume, Ruth Bernett insistiu muito no fato de que é a história, além da ética, que "nos ensina a não sermos nunca indiferentes diante do sofrimento alheio, e isso é particularmente atual se pensarmos – acrescentou – em tantas pessoas que veem na Europa uma possibilidade extrema de salvação".
A senhora Barnett também falou longamente sobre a experiência da separação das famílias. No fim da guerra, quando foi possível para ela voltar para a Alemanha, ela sentia desconforto em relação ao seu país natal, que, a partir do Reino Unido, durante 10 anos, ela tinha visto como um pesadelo por causa das coisas que os nazistas fizeram. Encontrando-se com os seus pais, ela não pôde sequer se comunicar com imediaticidade: eles não falavam inglês, e ela não falava alemão. No fim, decidiu voltar para o Reino Unido, enfrentando uma segunda separação.
Kindertransport
O Kindertransport foi uma ação que permitiu salvar 10 mil crianças de diversos países europeus trazidos para o Reino Unido nos nove meses anteriores à eclosão da Segunda Guerra Mundial. As crianças foram entregues a famílias de adoção, pousadas e fazendas.
Depois da Noite dos Cristais, o Reino Unido – relatam as páginas da Wikipédia – "decidiu remover os controles sobre a imigração dos países interessados pelas crianças, que não eram capazes de influenciar o delicado mercado de trabalho. Os líderes da comunidade judaica britânica tinha dirigido, em novembro de 1938, um apelo ao primeiro-ministro, Neville Chamberlain, e os quakers tinham apresentado um programa de socorro para as crianças, financiado por organizações humanitárias e religiosas. No dia 18 de novembro de 1938, a Câmara dos Comuns discutiu assunto e aprovou o programa, confiado a Norbert Wollheim.
Também se fez uma tentativa de estender o programa para os Estados Unidos: o próprio Wollheim escreveu para muitos senadores estadunidenses, mas o Congresso rejeitou explicitamente toda cooperação com uma declaração formal, afirmando que hospedar as crianças sem os pais seria contra as leis de Deus.
O Kindertransportlevava à Grã-Bretanha cerca de 300 crianças por semana. O ritmo era tão alto que, com o passar do tempo, tornou-se cada vez mais difícil rastrear famílias dispostas em tempo útil, e foram velozmente montados centros de acolhimento temporários, em áreas antes ocupadas por acampamentos de verão. A esses centros de acolhimento, chegavam, todo fim de semana, grupos de pessoas e famílias que vinham para escolher e levar as crianças embora".