“É a heterogeneidade do cancro que implica que cada pessoa necessitará de uma terapia diferente”, acrescenta o investigador do Instituto de Cancro Dana-Farber de Boston, avançando que é possível “relacionar a paisagem complexa de cada tumor e o número de medicamentos disponíveis para encontrar a combinação correta”.
Sander, que é um dos líderes do Atlas do Genoma, um consórcio norte-americano que estudou as variações genéticas de 30 tipos de tumores em 20 mil pessoas, defende que os pacientes também podem ter um papel mais ativo na luta contra o cancro.
O pai da bioinformática refere que a “montanha de dados disponíveis” inclui os “60.000 tumores analisados a nível de genética molecular” e que falta “informação equiparável sobre pessoas”, sendo que “essa informação está bloqueada nos hospitais e é incompleta”.
Chris Sander defende que deveria ser criado “um direito constitucional da cada pessoa à propriedade sobre a sua informação genómica e de saúde”, o que permitiria aos pacientes partilhar os seus dados para ajudar outras pessoas.
“Se conseguirmos proteger esse direito, criamos a liberdade de partilhar informação”, salienta, apontando que tal permitiria ter “uma base de dados extremamente poderosa” e “multiplicar por 10 ou por 100 os benefícios que a bioinformática já permite no tratamento de tumores”.
“Grandes farmacêuticas opõem-se ao desenvolvimento de novos tratamentos”
O físico lembra que os computadores também podem encontrar novas aplicações para fármacos já existentes, “essencialmente com as chamadas terapias combinadas, quando usas várias drogas juntas para combater tumores que são resistentes a um fármaco”.
Tal permite, por exemplo, “evitar os fármacos mais caros, substituindo-os por uma combinação de outros já aprovados bem mais baratos”.
Contudo, “as grandes farmacêuticas opõem-se”, assinala Sander, referindo que as mesmas “fizeram grandes contribuições para curar o cancro, mas não estão interessadas em fazer ensaios clínicos se não têm oportunidade de ganhar uma grande quantia de dinheiro”.
Segundo adianta, se uma combinação contém um medicamento barato, as grandes farmacêuticas não farão o ensaio porque não serve os seus interesses. “Por isso temos que encontrar forma de fazer ensaios clínicos alternativos, financiados com dinheiro público. É um problema social e político, mas temos a oportunidade de trazer enormes vantagens para os pacientes com cancro se fizermos ensaios públicos, por exemplo sobre tumores muito especializados que não interessam às grandes empresas”, defende.
Chris Sander lembra ainda o importante papel que a bioinformática já tem no que respeita à resposta ao melanoma, por exemplo, sendo que a resposta aos novos ensaios clínicos de imunoterapia tiveram uma taxa de sucesso entre 40% e 50% dois anos após o tratamento.
Sobre a forma como a vitória de Donald Trump pode afetar a ciência nos Estados Unidos, o físico destaca: “Há 77 anos já vimos onde levam certos movimentos políticos. Acho que esse é o maior risco”.
“Alguns dos políticos que ganharam as eleições negaram a base científica das alterações climáticas, inclusive nas suas fileiras questionam a evolução. Se essa inimizade à ciência se traduzir em cortes, haverá um problema na investigação do cancro. Como científicos devemos levantar a voz para que não exista um novo movimento anticientífico”, remata.