Carlos, contava-me que ali, no Görli, designação quase amorosa, de um parque que divide - na sombra os trabalhadores, ao sol os empregados de todas as classes -, há uma comunidade lusa muito grande, de guineenses, portugueses, brasileiros, mas também de turcos, árabes e outros passageiros, quase sem entidade nacional, toda a "malta" menos visível, mas não do mal. Bom, às vezes, do mal. É que a desigualdade conduz à margem da cidade.
Contudo, pediu que lhe tirasse uma foto, prometendo que aquilo que vislumbrávamos iria ser igual à da festa do Benfica, que ele carregava ao peito, ali no Görlitzer Park, onde os fumos e as batucadas da primavera celebravam o feriado igualmente vermelho - o 1º de Maio. O dia dos trabalhadores, mas não de todos - tal como os clubes de futebol, também o trabalho divide, embora, mais involuntariamente. Há os trabalhadores que ostentam a legalidade e os clandestinos que Carlos também conhece, contava-me, que também trabalham, às vezes mais, muito mais, mas não têm emprego, nem condições legais, em muitos casos, questão cada vez mais premente na rotina berlinense, são refugiados.
Trabalho mas sem emprego, fora dos sistema, a apanhar garrafas, a vender o que podem. O dia dos trabalhadores não lhes diz respeito, não diz respeito às subclasses, porque elas são invisíveis, e que não se vê, não existe. Mas são os inexistentes que mantêm a festa, que ajudam à celebração, e o trabalho, ou o dia do trabalhador deve ser de todos, e não dum sistema exclusivista como também é teu Benfica, Carlos, mas com uma grande diferença, é que quem quiser fazer parte dele, pode fazer, e fazer parte da tua torcida. Eu não ligo a futebol, mas se ligasse, nesse momento, meu caro, era do teu Benfica.