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Segunda, 20 Fevereiro 2017 19:17

Entrevista com Danilo Moreira, presidente do STCC

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País: Portugal / Laboral/Economia / Fonte: Em Luta

O Em Luta esteve solidário com a greve dos trabalhadores da Teleperformance, no dia 06 de fevereiro de 2017.

A propósito da greve realizamos uma entrevista com o presidente do Sindicato dos Trabalhadores de Call Center (STCC). Danilo Moreira tem 40 anos e trabalha há 20 nos Call Centers. Nesta entrevista, apresentou-nos um pouco das suas opiniões sobre as dificuldades de construir um sindicato num setor com tantos trabalhadores precários e falou-nos da construção desta primeira greve conduzida pelo sindicato.

O STCC organizou ontem uma greve na Teleperformance. Quais foram as reivindicações?

As reivindicações foram aumento salarial para 750Eur e também uma política de incentivos que seja justa.

Considera que a greve foi positiva? Fala-nos um pouco sobre o processo de condução da greve.

Danilo: Eu considero que a greve foi muito positiva porque os trabalhadores dos call centers, devido aos vínculos precários, não estão habituados a lutar. Os contratos muitas vezes são semanais, quinzenais ou mensais e facilmente um trabalhador que reclame pode ser dispensado, não porque não esteja a trabalhar bem – bem pelo contrário –, mas sim por lutar pelos seus direitos. Nesse aspeto, foi bom os trabalhadores começarem a perder o medo e a unir-se para melhorarem as condições laborais.

E como foi o processo de organização da greve?

Organizar a greve foi um desafio. Foi a nossa primeira greve. Há anos que os trabalhadores manifestavam insatisfação e andavam a tentar melhorar as condições, mas não tinham conseguido. Contataram o sindicato a pedir ajuda, no sentido de organizarmos um plano em conjunto para conseguirmos melhorar as condições. Felizmente, temos lá um delegado sindical e conseguimos organizar os plenários, para envolver os trabalhadores e esclarecer e também para traçar estratégias comuns. Houve algumas deslocações a Setúbal por parte de um dirigente do sindicato. Também houve a questão de os próprios trabalhadores se quererem organizar entre eles e também serem unidos.

O Danilo é Presidente do STCC, que é o Sindicado de Trabalhadores de Call Center. Como é organizar um sindicato que representa essencialmente trabalhadores precários?

É difícil! É difícil porque, no nosso setor, mais de 80% dos trabalhadores – inclusive cargos de chefia – são precários. E são precários desde logo nos contratos, que são realizados através de terceiros, ou seja, empresas de trabalho temporário, empresas de outsourcing. As próprias chefias são facilmente destituídas, seja por estarem de licença de maternidade/paternidade ou simplesmente por razões de preferência por parte das Coordenações dos serviços ou até mesmo porque facilmente podem, num mês ou outro, não cumprir determinados objetivos. No meio disto tudo, a maior parte dos trabalhadores são precários porque é impossível estarem anos a fio com contratos quinzenais e mensais.

Depois, as empresas utilizadoras mudam de empresas de trabalho temporário – às vezes quase como quem troca de camisa – e os trabalhadores acabam por nem ser efetivos das empresas de trabalho temporário nem das empresas utilizadoras. Também nisto são precários.

Finalmente: a nível salarial, a base é o salário mínimo. Alguns serviços estão mascarados com planos comissionáveis, mas os objetivos são muitas vezes difíceis de atingir, são exigentes, e quando as empresas veem que os trabalhadores não estão a atingi-los, facilmente os substituem.

Então, organizar trabalhadores precários é complicado, mas é necessário, é isso?

É necessário e é complicado, mas se não se fizer nada, se não se tentar organizar, os trabalhadores serão sempre precários. Se nos organizarmos vamos deixar de o ser. 

Na greve, os trabalhadores da Teleperformance reivindicavam, corretamente, um salário de 750 Eur. O salário mínimo nacional está em 557 Eur. Consideras esse valor suficiente para um trabalhador?

O salário mínimo não é suficiente para um trabalhador, de forma alguma. Até mesmo um trabalhador que viva num quarto, a pagar uma renda, acaba por ter dificuldades em sustentar-se. Isto para não falar de um casal. Se estiver a receber o salário mínimo, metade do dinheiro vai para a renda e o que sobra é insuficiente. Isto afeta também a própria taxa de natalidade e gera instabilidade. Portugal é um país com uma população a envelhecer a passos largos. É preciso aumentar a taxa de natalidade, mas não é com salários baixos que se vai dar estabilidade às famílias. Há pessoas que querem constituir família e organizarem-se, mas é impossível tomarem decisões com contratos a 15 dias e a instabilidade que existe.

Daí a justeza das reivindicações da greve. Por exemplo, pagar 750 euros a um trabalhador de call center é mais do que justo porque o ritmo de trabalho é bastante intenso (há pessoas que chegam a atender 200 clientes num dia) e é o trabalho é muito exigente a nível psicológico (daí haver também muitos casos de burn out e de esgotamentos). 750 euros é o valor mínimo que o trabalhador deve receber face ao controlo excessivo, ao ritmo das chamadas e à exigência do próprio serviço. É um trabalho muito exigente e também é um trabalho que tem a sua complexidade, não só a nível do discurso, mas também de conhecimentos.

Quanto às comissões justas: as regras têm que estar claras, têm que ser transparentes, não podem mudar do dia para a noite, e o próprio trabalhador tem de ter possibilidade de controlar a produção. Por exemplo, há trabalhadores que recebem determinado prémio porque a empresa disse que o devem receber, mas não há forma de controlar se aquilo efetivamente está correto, a menos que o trabalhador ainda tenha de trabalhar mais dois dias para fazer esse controle.

Do ponto de vista do chefe, das chefias, dos patrões, a situação como está acaba por ser boa: pagam menos aos trabalhadores, pagam menos impostos e conseguem mais lucros. Com a terceirização dos serviços acaba por haver mais intermediários, e quantos mais intermediários houver, mais administrações há. Os cargos de administração, os parceiros de negócio, sócios e acionistas conseguem ter mais lucro, veem mais riqueza, mas o Estado não tem vantagens nisto porque não recebe nada de impostos. Até porque muitas destas empresas têm sedes fiscais no estrangeiro.

O terceiro ponto: uma empresa que realmente tem líderes e quer melhorar os serviços tem que apostar na qualidade dos trabalhadores – e quando falamos em qualidade dos trabalhadores estamos a falar do recrutamento, dos planos de formação adequados às exigências do serviço, etc. – e tem que tentar manter os trabalhadores satisfeitos. E há várias formas de satisfazer os trabalhadores. Por exemplo, dar formação e material de trabalho adequado a cada uma das funções, em vez de dar material obsoleto. Os próprios espaços de trabalho também têm que ser funcionais. Por exemplo, como é que é possível uma pessoa trabalhar 8 horas numa cadeira desconfortável ou numa sala com 200 pessoas e um ruído brutal?

É um facto que os trabalhos precários estão a aumentar. Como podemos combater a precariedade?

Tem de haver um envolvimento dos trabalhadores na luta pelos seus direitos, têm de procurar esclarecer-se. Tem que haver empresas a quererem passar das palavras aos atos. Muitas vezes nas missões e valores das empresas está escrito uma coisa, mas na realidade fazem sobretudo o contrário. Com esta política não dá para progredirmos e acabarmos com a precariedade.

Tem também que haver uma posição dos partidos e de quem está no poder. Tem que haver uma legislação protetora dos direitos do trabalho, mas não apenas no papel. Tem que haver mais fiscalização. Tem que haver penas, coimas e sanções pesadas para as empresas como forma de dissuadir a prevaricação. E tem que haver legislação, tem que haver interesse do Estado.

Antes de dar incentivos às empresas, tem que haver uma análise que permita perceber o tipo de negócio, os lucros, e analisar também os balanços das empresas porque algumas delas apresentam pouco lucro, mas não quer dizer que não estejam saudáveis financeiramente, já que chegam ao final do ano e compram material informático, frotas automóveis, enfim, fazem uma série de investimentos para pagarem o mínimo possível de impostos.

E tem que haver uma legislação em que o Estado também não perca dinheiro porque ao não controlar a questão dos direitos dos trabalhadores e apostar também em planos de incentivos para as empresas de uma forma que não é igual acaba por privilegiar alguns e lesar outros. Da mesma forma os salários dos próprios dos trabalhadores também devem acompanhar o desenvolvimento das empresas.

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