Vários companheiros envolveram-se na criação da Associação de Classe Interprofissional, cujo processo de legalização foi sabotado pelo próprio Estado: mal a associação foi legalizada, o ministério público recorreu, obrigando à sua dissolução, supostamente pelo referido sindicato violar a lei, nos seus próprios estatutos, que haviam sido registados meses antes sem quaisquer problemas.
Com especial participação de companheiros do sector da educação – agrupados na secção portuguesa da Federação Europeia do Sindicalismo Alternativo da Educação (FESAL), – esta associação sindical chegou a participar em encontros internacionais do movimento sindical alternativo europeu.
No entanto, a 10 de Fevereiro de 2007, “a Assembleia Geral de Sócios da AC-Interpro, reuniu-se, tendo deliberado o seguinte relativamente ao processo de extinção interposto pelo ministério público junto do tribunal de comarca de Cascais:
1- Assumimos não recorrer no processo contra nós intentado por causa dos custos financeiros inerentes (só é possível um recurso se constituirmos advogado e pagando os seus honorários) que não podemos nem estamos na disposição de assumir.
2- As nossas actividades vão continuar a exercer-se com base nos princípios estabelecidos e segundo as estratégias previamente delineadas.
3- Aguardamos o desfecho do processo e, no caso do tribunal decretar a nossa extinção enquanto sindicato, não pomos de lado o retomar do processo de legalização, quando as condições forem julgadas favoráveis.”
Meses antes a necessidade de criação da Associação Interprofissional tinha sido colocada nos seguintes termos por Manuel Batista, um dos activistas envolvidos neste projecto:
“Associação de Classe Interprofissional
Uma contribuição para o debate que está a decorrer entre os membros fundadores da Associação de Classe Interprofissional (nome provisório, do primeiro sindicato de base e alternativo, desde que foram extintos por Salazar, em 1932, os últimos sindicatos livres em Portugal, inspirados pelo sindicalismo revolucionário).
As razões que nós podemos aduzir a favor do projecto de erguer um sindicato de base são muitas. Apenas iremos aqui expor algumas.
No essencial, consideramos que é impossível uma defesa eficaz dos trabalhadores sem uma organização. Só uma organização do tipo de um sindicato, tem capacidade para auxiliar verdadeiramente no combate pela defesa imediata dos interesses e direitos da classe trabalhadora sem a desviar dos conceitos e práticas revolucionários, ou seja, de que a libertação dos trabalhadores será obra deles próprios, e de que não se pode encarar uma melhoria substancial, mesmo no longo prazo, se a sociedade continuar a perpetuar as classes.
As duas razões para nos organizarmos em sindicato são, portanto: a defesa no quotidiano dos nossos contratos, a sua melhoria, a defesa dos direitos laborais e sociais e, no longo prazo, a luta geral pela emancipação da nossa classe e de todas as classes, pela abolição do regime do salário e da exploração capitalista.
Porém, após o 25 de Abril, a “sociedade civil”, ou seja, os sindicatos, as associações, etc. foram tomados de assalto por militantes partidários diversos, com especial relevo para os do PCP e suas dissidências.
O movimento sindical foi largamente comprado, de muitas formas. Isto explica que, aquando das rondas de “concertação social” entre os representantes do patronato, as centrais sindicais e o governo, os resultados dos acordos têm sido sempre no sentido de “flexibilizar” (fragilizar) o vínculo laboral.
Não existe independência dos burocratas que estão a representar os trabalhadores.
Se eles tivessem a veleidade de independência, veriam em breve cortado o seu ”tacho sindical” que lhes permite estar a tempo inteiro nos sindicatos, ganhando ordenado como se estivessem a exercer a sua profissão, muitas vezes até atingirem a idade da reforma. Eles têm mais interesse em salvaguardar o seu estatuto próprio, do que o estatuto dos trabalhadores que eles dizem representar.
O governo tem os referidos sindicatos como parceiros, ao dispor para tudo e nomeadamente para assinarem todos os recuos que for preciso, com um mínimo de “contestação” simbólica, aquele mínimo para dar a ilusão nos trabalhadores (mesmo aos mais esclarecidos) de que existe um movimento sindical verdadeiro, embora seja demasiado fraco face ao poder do capital. Mas não! O poder do capital e dos políticos do governo é justamente mantido pelas direcções sindicais, que têm precisamente este papel insubstituível (e estratégico para a burguesia) de manter sob controlo a classe trabalhadora.
Os largos milhões de trabalhadores teriam força suficiente para impor respeito pelos seus direitos fundamentais, mesmo sem se ter atingido uma nova fase revolucionária. A sua impotência para conseguir esse mínimo, advém da traição continuada dos seus “representantes”.
A necessidade de um movimento independente, anti-capitalista, que não esteja sob o controlo de estruturas autoritárias, nomeadamente partidos políticos, entra pelos olhos dentro.
Que sindicato queremos?
Queremos um sindicato que esteja sempre nas nossas mãos, que não fuja nunca ao controlo dos seus associados, um sindicato onde a direcção fica incumbida pela assembleia de concretizar determinadas decisões e que terá de responder em assembleia pela boa execução das mesmas. Um sindicato onde a pertença a determinada categoria profissional não implicará uma diferença de tratamento, onde apenas haja camaradas, onde reine um espírito de igualdade. Um sindicato capaz de organizar os trabalhadores nos locais de trabalho e noutros locais.
Note-se que cabe perfeitamente do campo sindical, a nosso ver, tudo o que se prenda com as condições de vida gerais e sociais. Assim, são do âmbito sindical as questões que se prendem, por exemplo, com pensões, habitação social, consumo, defesa do ambiente, igualdade de género, anti-racismo, combate à xenofobia, ao combate ao sexismo, a todas as formas de autoritarismo, à defesa das liberdades e a luta contra o arbítrio patronal e do Estado.
O sindicato não deve meter-se “na política”, mas deve ter uma visão política e deve avaliar a política que se faz, ao nível nacional e internacional. Deve ser um actor totalmente independente no movimento social, o que não significa autista, nem sectário. Significa que apenas faremos os acordos que nos parecerem adequados, seja com quem for, em função dos superiores interesses da classe trabalhadora.
Manuel Baptista”
A constituição da Associação teve como base o Colectivo Anti-autoritário de Luta de Classes constituído algum tempo antes e que publicava o Boletim “Luta Social”, do qual saíram mais de uma vintena de números e que se tornou o porta-voz da referida Associação.
Pode consultar aqui o Boletim “Luta Social” (1 a 15):
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Estatutos da AC-Interpro: http://www.luta-social.org/2006_07_01_archive.html