Os esforços dos EUA no emprego desta guerra multidimensional têm sido dirigidos a “explorar as vulnerabilidades psicológicas, econômicas, militares e políticas” da Venezuela, como apontou o ministro de Comunicação da nação sul-americana em uma entrevista concedida à rede de TV russa RT. O objetivo: converter o país em um grande laboratório para desencadear o caos através de uma “guerra midiática, de ação permanente para incitar as emoções mais primitivas” na população.
As táticas têm sido variadas e têm seus maiores picos justo quando se aproximam as épocas eleitorais, tal como demonstrou a economista Pasqualina Curcio a propósito do ataque ao setor econômico.
No entanto, nas vésperas de uma eleição presidencial, prevista para o dia 22 de abril, a hipótese que ganha mais força é a intenção dos EUA de deter o possível êxito do petro, a criptomoeda que o governo venezuelano usará para driblar as sanções impostas contra o país e resolver assim a delicada situação econômica. Uma ação que, se resultar positiva, inclinaria a balança eleitoral a favor de Nicolás Maduro.
Os cinco vértices da ofensiva final
Os fatores que servem de ponta de lança para a agressão contra a Venezuela, em primeiro lugar, têm uma dimensão psicológica, que se apoia no conceito de “diáspora venezuelana”. Esta representa uma das maiores campanhas de intervenção psicológica que têm tido lugar e seu enfoque é dirigido à juventude. O chamado é a emigrar como única saída da crise política e econômica que se vive no país. O tom das mensagens que inundam as redes sociais, programas de televisão e de rádio, simplificam a complexa realidade através de um único culpado: Nicolás Maduro.
Nesta campanha propagandística impulsionada através da Internet, foram investidas enormes somas de dinheiro para posicionar nos principais resultados de pesquisas, assim como na publicidade que aparece nos aplicativos e jogos baixados nos celulares, tutoriais, notícias, histórias de êxito que reforçam a ideia de emigrar. Essa tática não é inocente. Tenta-se utilizar esse fenômeno como base para legitimar, como veremos mais adiante, o argumento de intervenção por causas “humanitárias”.
O segundo aspecto da agressão é constituído pela dimensão econômica. Não estamos apenas testemunhando a hiperinflação dos preços na Venezuela, como produto da influência da web Dólar Today. Tal página foi denunciada pelo Banco Central da Venezuela em tribunais norte-americanos por ser a maior responsável pela perda de poder aquisitivo do venezuelano.
Além disso, com o petróleo recuperando seu preço no mercado, Trump e seus sócios na União Europeia reforçam as severas sanções econômicas para dificultar que as empresas venezuelanas possam comprar no exterior. Isso trouxe como consequência que na Venezuela não seja possível conseguir medicamentos e outros bens essenciais. Altos funcionários do governo calculam que 30% dos produtos importados e produzidos em 2014 foram desviados de forma ilegal para a Colômbia. Recentemente, Caracas ordenou investigar o contrabando para as ilhas do Caribe, especialmente Aruba e Curaçao, de materiais estratégicos como o cobre e o ouro.
Outra das ações nesta guerra não convencional tem sua dimensão paramilitar. Nos últimos dias foram noticiados numerosos ataques ao sistema elétrico nacional e ações de caráter terrorista nos sistemas de transporte massivo da capital e na estrutura hospitalar. O objetivo fundamental é deslegitimar a figura do governo nacional como responsável por manter a segurança da população. Como explica o filósofo alemão Hans Enzensberger, teórico da Guerra Civil Molecular, o aumento da violência, além de alienar a população para ser controlada através do medo, também provoca a ruptura do contrato social. Perde-se a fé no Estado e, portanto, pouco a pouco se desintegra o tecido da sociedade.
O cerco também inclui uma dimensão jurídica. No dia 8 de fevereiro, a Corte Penal Internacional informou sua decisão de abrir um expediente ao governo venezuelano pela suposta repressão durante a contenção dos protestos violentos de 2017. O plano é tornar a comunidade internacional coesa, especialmente o Conselho de Segurança [da ONU], para conseguir uma medida de intervenção militar, similar à aplicada na extinta Iugoslávia durante o mandato de Slobodan Milosevic.
A aparente decisão da oposição venezuelana de não apresentar candidato às futuras eleições presidenciais, tal como pede sua facção mais radical, assim como as declarações feitas por governos da região de não aceitar os futuros resultados desse pleito, seriam a base política para deslegitimar o Estado venezuelano e dar força a um hipotético veredicto de culpabilidade contra o governo de Maduro.
O último aspecto da agressão é a dimensão militar. O analista Arlenin Aguillón, entrevistado exclusivamente para este artigo, informou que Colômbia e Brasil estão, na atualidade, mobilizando tropas na fronteira com a Venezuela com a desculpa de atender a “crise humanitária” provocada pela imigração de venezuelanos. Segundo Aguillón, “Santos aprovou a mobilização de quase 3 mil efetivos militares e de outros corpos de segurança para reforçar a Operação Esparta que terá em Cúcuta seu eixo central. Paralelamente, o ministro da Defesa do Brasil, Raul Jungmann, informou que reforçarão a presença militar no estado de Roraima que limita com o sudeste do estado Bolívar da Venezuela”. O presidente neogranadino, Juan Manuel Santos, instou o secretário de Estado norte-americano, durante a visita que este realizou recentemente a esse país, a “restaurar o canal democrático na Venezuela”.
Tillerson, por sua vez, considerou que a Colômbia era um “jogador chave” nas ações que se tomariam contra a Venezuela, e ratificou a ideia expressada há quase um ano pelo chefe do Comando Sul estadunidense, Kurt W. Tidd, na qual afirmava que “a crescente crise humanitária na Venezuela poderia obrigar uma resposta regional”. A última declaração feita pelo subsecretário de Estado para América Latina e Caribe, Francisco Palmieri, de estar avaliando a possibilidade de prestar “ajuda técnica” a Santos e Temer para atender a situação na fronteira com a Venezuela, parecem pressagiar uma iminente mobilização de forças regulares dos EUA na região.
Esse é o cenário no qual se encontra a Venezuela. Um barril de pólvora bem desenhado para desencadear o “caos construtivo” que os EUA tanto necessitam para por em marcha a ofensiva final. Não é casual que o principal líder da oposição política, Julio Borges, após se negar a assinar o acordo de convivência democrática pela Venezuela, tenha tirado sua família do país e que o senador Marco Rubio escrevesse em sua conta no Twitter uma mensagem dirigida à Força Armada Bolivariana para que derrubasse com um golpe militar o governo legítimo de Nicolás Maduro.
Talvez Borges e o senador Rubio compartilhem o pensamento do inefável personagem da saga “Game os Thrones”, Lord Baelish, que em uma cena memorável afirma que “o caos não é um fosso, mas uma escada”. Lamentavelmente a história tem nos demonstrado que os únicos que sobem por esses degraus são a morte e o sofrimento dos povos.
Artigo original: 'El petro: la razón de la guerra de EEUU contra Venezuela'.