O coro dos contentes com a responsabilização e criminalização de quem luta, com o vigilantismo e com a delação de indivíduos para as forças policiais vem jogando água no moinho dos reacionários há tempos, e deve acabar.
A experiência das lutas não deixa sombra de dúvida de que é a PM que age deliberadamente reprimindo protestos, não interessando indumentária, tática de luta ou legalidade para que venham ou não a reprimir. Pros grupos nos poderes basta a tentativa de garantia de direitos e conquistas de forma objetiva e subjetiva para que reprimam e criminalizem.
O que determina a opção pela repressão não é a existência de resistência radicalizada ou não, mas antes, e principalmente, a existência dos interesses dos poderes que a ordenam.
Há controle pelo Estado da ação dos indivíduos nos espaços públicos a partir da instalação de câmeras nas cidades, e isso não é pauta das esquerdas. Há monitoramento e identificação facial de protestos pelas forças policiais, e isso não é levado em conta pelas esquerdas que criminalizam e responsabilizam black blocs pela repressão. Grande parte dessa mesma esquerda, quando no poder, efetiva tais políticas que ferem individualidades e coletividades. O PT, implementando a "modernização" reacionária das forças repressivas a níveis gigantes nos planos nacional, estaduais e municipais para os grandes eventos, é o exemplo mais ostensivo disso.
Boulos, liderança e único porta-voz visível do maior movimento dos sem teto do país (MTST), coloca milhares de sem-tetos debaixo das botas da PM ao assinar o discurso ideológico e co-responsabilizar os black blocs pela repressão, assumindo o papel de bedel de protestos e incitando atuação de x9s contra manifestantes. Ele sabe que nas desocupações a necessidade corrente dos que lutam por moradia é cobrirem seus rostos por conta de gás lacrimogêneo jogado indiscriminadamente. Boulos esqueceu quantas barricadas os sem-tetos já foram obrigados a fazer pra garantir a mínima proteção - sempre ineficaz - frente à violência do Estado? Esqueceu do chamado "Exército de Brancaleone" do Pinheirinho, miseráveis sem-teto vestidos de armaduras feitas de lata, papel, paus e plástico do lixo disponível, que se deixaram fotografar assim frente à ameaça eminente da repressão anunciada que se concretizou?
Ao atuarem pra que subjetividades de esquerdas ou em disputa virem-se contra black blocs enquanto deixam as costas expostas pra polícia bater, a Frente Povo Sem Medo conformada por (CUT, UNE, MTST, Intersindical, CTB e PSOL, assume os limites de sua exigência por #ForaTemer. Já a Frente Brasil Popular – PT/PCdoB – está mais preocupada em se fazer viável eleitoralmente no sistema, enquanto a maioria desses que a compõem faz alianças municipais com o PMDB, PSDB, DEM e outros partidos de direita além de outros tantos acordos. Não satisfeitos, passaram a delatar manifestantes pra PM em atos do #ForaTemer na última semana, de acordo com declarações reportadas pela mídia.
A decisão do lulismo em não ser conseqüente com o #FicaDilma organizando lutas, greve geral etc, já dava a senha do que ocorre agora. São sabedores da profundidade da crise - da qual são também responsáveis - e da incapacidade e inviabilidade política de um retorno de Dilma ao poder. Coerentes com isso, escolheram deixar Dilma cair, vitimizar-se para agora tentar garantir as possibilidades do #Lula2018.
A Frente Povo Sem Medo deve responder se o #ForaTemer que defendem é para derrubar o governo ilegítimo ou apenas desgastá-lo na opinião pública até as próximas eleições. Enquanto isso, o país afunda mais ainda na crise: o PMDB e PSDB capitaneiam propostas de retirada de mais direitos sociais, efetivam e aprofundam o ajuste fiscal e demais políticas de direita iniciadas pelo bloco lulista, os frágeis avanços sociais do lulismo são ceifados pelo ilegítimo Temer.
Na heterogeneidade dos protestos #ForaTemer há de se travar um combate firme contra a criminalização de quem luta, contra o uso eleitoral e partidário do #ForaTemer, contra decisões autoritárias tomadas em gabinetes que são reproduzidas acriticamente e/ou autoritariamente por militantes.
Nós que lutamos cobrimos os rostos em todas as lutas contra regimes e governos ilegítimos e autoritários. Cobrimos os rostos nas lutas da Praça da Paz Celestial, na derrubada do Muro de Berlim, nas ditaduras latino americanas. Nós LGBTs cobrimos os rostos em Stonewall. Numa conjuntura de Lei antiterrorismo, feita pelo PT e agora nas mãos do ilegítimo Temer, onde há monitoramento facial e de imagens públicas feito pelo Estado, as esquerdas que se viram contra os mascarados derrubam suas máscaras.
Cadu Lorena (Twitter: @cadulorena) é ativista LGBTs e professor de história. Vive em São José dos Campos, SP.