Está a avançar o processo visando pôr termo à guerra civil que devasta o Sudão do Sul há quase dois anos e meio.
O líder dos rebeldes, Riek Machar, anunciou que voltará no próximo dia 18 a Juba, a capital, para formar um governo de união nacional com o presidente Salva Kiir.
O regresso do chefe da rebelião, que tem vivido no exílio entre Nairobi e Adis Abeba, inscreve-se no acordo de paz assinado em Agosto de 2015, ao abrigo do qual Machar foi (re)nomeado, em Fevereiro deste ano, vice-presidente do Sudão do Sul, cargo que ocupava já, ao lado de Kiir, antes do começo da guerra.
O processo prevê a aplicação de um cessar-fogo e a partilha do poder, entre Kiir e Machar, por um período transitório de 30 meses, findo o qual se realizarão eleições. Na semana passada, a missão da ONU no Sudão do Sul (Unmiss) anunciou que tinham já chegado a Juba mais de 800 soldados e polícias da facção rebelde, de um total de 1.370 previstos.
A Unmiss, essa, com um orçamento anual de mais de mil milhões de dólares, dispõe de um dispositivo militar e policial de 12 mil e 500 efectivos, além de dois mil e 500 funcionários civis. No país, vivem em campos da ONU cerca de 100 mil refugiados.
A implementação do acordo de paz, alcançado sob pressão dos Estados Unidos e seus aliados Leste-africanos – Etiópia, Quénia, Uganda –, está a ser acompanhada por uma comissão encabeçada por Festus Mogae, antigo presidente do Botswana.
A guerra, iniciada em Dezembro de 2013, causou pelo menos 50 mil mortos e quase dois milhões e meio de deslocados e refugiados, meio milhão dos quais em países vizinhos. As duas partes foram acusadas por organizações internacionais de terem cometido ao longo do conflito armado as maiores atrocidades, incluindo crimes de guerra e crimes contra a Humanidade.
Um relatório do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos do Homem, divulgado em Março, refere-se a crianças utilizadas como soldados pelos beligerantes dos dois lados e fala de massacres, de civis queimados vivos, de violências sexuais em larga escala. «Trata-se de uma das mais horríveis situações deste género em todo o mundo, com a utilização maciça da violação como instrumento de terror e como arma de guerra», resumiu o alto-comissário, o jordano Zeid Ra’ad Al Hussein.
O mais jovem Estado africano, o Sudão do Sul proclamou a independência em 2011, depois de décadas de conflito com o Sudão, do qual acabou por separar-se. Dois anos e meio depois, mergulhou numa sangrenta guerra civil, motivada por divergências políticas entre os seus principais dirigentes, que acabaram por incrementar rivalidades étnicas entre os maioritários dinkas de Salva Kiir e os nuers do seu vice-presidente.
Encravado entre Sudão, Etiópia, Quénia, Uganda, República Democrática do Congo e República Centro-Africana, o Sudão do Sul, com uma população de 12 milhões de habitantes, de maioria cristã, é um país com enormes potencialidades económicas. Atravessado pelo Nilo, possui, além de potencial agrícola, petróleo e recursos minerais (urânio, bauxite, cobre, diamantes, ouro).
O petróleo, explorado por companhias estrangeiras, incluindo norte-americanas e chinesas, é a maior fonte de riqueza não só do governo de Djuba, apadrinhado pelos Estados Unidos, mas também do regime de Cartum, cujo principal parceiro económico é a China. O petróleo explorado no Sudão do Sul é transportado por oleodutos que atravessam o território do Sudão até Mar Vermelho, por cujos portos é exportado, sendo as receitas cobradas por essa passagem essenciais à economia sudanesa. Avaliada em 350 mil barris por dia antes do início da guerra civil, a produção petrolífera no Sudão do Sul caiu quase 40 por cento com o conflito.
Referendo no Darfur
No vizinho Darfur, no Oeste do Sudão, decorreu esta semana um referendo sobre o seu estatuto administrativo, não se conhecendo ainda os resultados. Os eleitores deviam decidir se pretendem manter a estrutura actual do Darfur, dividido em cinco estados, ou se preferem a criação de uma só região.
A primeira opção é apoiada pelo regime de Cartum, do presidente Omar el-Béchir, com quem as potências ocidentais não simpatizam. Desde 2009 o Tribunal Penal Internacional, com sede em Haia, tenta capturar e julgar o dirigente sudanês, que enfrenta acusações de crimes de guerra, crimes contra a Humanidade e genocídio – alegadamente cometidos pelas tropas governamentais no Darfur.
Segundo estimativas das Nações Unidas, na região, rica em petróleo, urânio e cobre, o conflito que opõe desde 2003 grupos armados ao poder central terá provocado um total de 300 mil mortos e dois milhões e meio de deslocados.
* Jornalista
Este texto foi publicado no Avante nº 2.211 de 14 de abril de 2016.