O Estado espanhol e o sistema a que serve mantenhem o nosso povo sob domínio mediante umha já velha e constante cooptaçom da classe dirigente, cujo pacto de integraçom no grande capital espanhol nom foi posto em questom até hoje. Que melhor maneira de garantir a submissom ideológica da maioria do nosso povo?
Entretanto, existe, sim, umha esquerda social e política com diferentes graus de simpatia e identificaçom com um projeto nacional, o galego, que ainda nom atingiu a sua maturidade. Se a isso somarmos o caráter reformista da sua dirigência, compreenderemos logo as imensas dificuldades para que umha esquerda independentista armada com um programa revolucionário poda abrir o imprescindível caminho de futuro.
Na Galiza atual, nom passamos de expressons políticas autolimitadas nos seus objetivos nacionais e sociais. Um morno nacionalismo, incapaz até de se afirmar como independentista, cujo horizonte político estaria no “antineoliberalismo”. Isso, se o seu discurso tivesse expressom prática, pois até hoje nom conseguiu concretizá-lo em nengumha medida significativa nos ámbitos de governo que já tem ocupado.
As duas principais correntes dessa esquerda social galeguista, reformuladas nos últimos tempos nas chamadas Marés e há décadas no BNG, coincidem com a imensa maioria de forças significativas da esquerda ocidental na conceçom institucional e reformista da política. Para elas, ser de esquerda é defender aquele Estado europeu de bem-estar que o neoliberalismo esfarelou, para, a partir daí, conquistar progressivamente novas quotas de poder por via principal ou exclusivamente eleitoral.
Com toda a diversidade que a carateriza, e da qual tanto gosta de presumir, essa esquerda autolimitada coincide em reivindicar aquilo que julga ser o fundamental: a “ética” como património, a “democracia” como objetivo e a “cidadania” como sujeito da mudança.
Para tal, situa precisamente as instituiçons criadas e alimentadas pola classe dominante espanhola como cenário na disputa do que considera órgaos máximos dessa “democracia” a que constantemente apela.
Só como mostra, recentemente pudemos ouvir o velho luitador institucional Xosé Manuel Beiras apelar com orgulho, durante umha disputa interna por quotas de poder, ao que denominou “limites éticos” do seu partido. A política estaria, nessa visom mítica, ao serviço da ética. Nom sabemos é de qual, pois sendo qualquer sistema de valores “éticos” a expressom das relaçons sociais dominantes, dificilmente poderá ser formulada, nom digamos já praticada, umha ética isenta de toda a merda que carateriza as relaçons sociais caraterísticas do atual modo de produçom.
Acaso é possível umha desigualdade social “ética”? Será razoável aspirar a umha exploraçom laboral “ética”? Nom falta quem fale de “intervençons humanitárias éticas”, como as que nos últimos anos levárom países inteiros à destruiçom total. E o Parlamento cedido pola classe dominante para o espetáculo democrático-formal com que nos deleitam, poderá ele também ser “ético”?
Dificilmente poderám ser colocados “limites éticos” para a participaçom no jogo institucional articulado polo atual sistema, ao serviço exclusivo da sua autorreproduçom. Que nova ética poderá ser defendida ou praticada sem umha nova forma de sociabilidade alternativa e superior à atual, levantada sobre as suas ruínas?
Da mesma forma, o apelo constante à “democracia” nom deixa de representar um fogo de artifício se ela nom estabelecer como base a superaçom do atual metabolismo social. Seria tam ingénuo como inédito acreditarmos que um parlamento burguês pudesse constituir o principal cenário para um processo desse tipo. Certamente, a ditadura de classe em que hoje vivemos tem forma “democrática” e nom ditatorial-fascista, mas isso é só na medida que essa forma de governo permita o objetivo fundamental: a imprescindível acumulaçom capitalista.
Ao que todo indica, a nossa esquerda aspira só ao máximo grau de democracia possível sob a hegemonia burguesa. Ou, entom, isso parece quando se define a “cidadania” como sujeito da mudança social, cuja principal ou única via de realizaçom som as instituiçons burguesas e espanholas.
Que a cidadania supujo um importante avanço na história da humanidade está fora de questom. A Revoluçom Francesa espoletada em 1789 trouxo umha mudança de fundo nas relaçons de produçom, situando a burguesia à frente de cada vez mais estados da Europa e do mundo. A principal mudança foi a de progressivamente impor o cidadao/cidadá privado e livre de comprar e vender a sua própria força de trabalho como base da nova sociabilidade. Referimo-nos, claro, à estabelecida entre explorados e exploradores modernos, sem dúvida superior à do servo e o senhor feudal, mas ao mesmo tempo base da alienaçom cousificadora que carateriza a sociedade mercantil-capitalista.
Numha altura como a atual, em que o capitalismo atingiu os seus próprios limites históricos, ver a esquerda autodefinida “ruturista” erguer o “cidadanismo” como suposto modelo superador do “neoliberalismo” indica bem a pobreza de objetivos e a sua condiçom essencialmente reformista. Nom tocará já aspirar a umha nova forma de reproduçom social cujas relaçons de produçom passem a ser dominadas pola colaboraçom entre trabalhadores e trabalhadoras livres e iguais?
Se a todo o anterior somarmos a carência de um verdadeiro programa de construçom nacional que situe a soberania plena, a independência, como um roteiro a percorrer principalmente por fora das instituiçons, teremos um esquema claro das nossas graves carências.
Entenda-se. Nom se trata de negar o valor da luita polas reformas. Nem sequer de desvalorizar de maneira principista a disputa eleitoral. Vote cada qual –ou nom– na marca eleitoral que preferir no próximo dia 26, porque isso, em si mesmo, pouco relevante será. Trata-se é de estabelecer o horizonte superador do reformismo e do campo de jogo que Espanha e o capital nos imponhem, como passo imprescindível para a emancipaçom. Eis o que fai falta!