Com a vitória do grande capital, pôs-se fim ao dito “bipolarismo”. A hegemonia imperialista estadunidense abateu-se então sobre o mundo. Com a imposição do desemprego, da miséria relativa e absoluta, da apropriação de riquezas nacionais, etc. do mundo socialista, a acumulação e a taxa de lucro do grande capital superaram a depressão nascida do atual estágio de senilidade da ordem capitalista. Na Era Yeltsin [1991-1999], a Rússia e muitos ex-Estados operários transformaram-se em quartos de despejo do grande capital mundial, quanto à economia, sociedade e política. Desapiedada agressão militar imperialista explodiu e balcanizou a Iugoslávia. Expandiu-se o domínio imperialista sobre o mundo através de outras operações, com destaque para as duas guerras do Iraque, em 1990 e 2003.
A impulsão do capital monopólico não teve o vigor esperado. Já em 2008, dezoito anos após a dissolução da URSS, nova crise recessiva geral abateu-se sobre a produção capitalista mundial, com epicentro nos USA. A China, que se engolfara na restauração capitalista antes da destruição da URSS, rendera pingues lucros aos grandes capitais, canibalizando a esfera socialista e impondo duras taxas de exploração aos seus trabalhadores. Nesse processo, convertera-se na “Fábrica do Mundo”, como antes fora a Inglaterra e após os Estados Unidos. Entretanto, centralizado pelo PC chinês, o processo de contra-revolução consolidara um dinâmico núcleo capitalista autônomo que avançava apoiado no consumo USA, questionando mais e mais a primazia ianque.
Por outro lado, o advento da longeva Era Putin, em 2000, empreendeu reestruturação tendencialmente autônoma da produção capitalista russa, apoiada em dois grandes pólos: capitais privados autóctones e grandes conglomerados estatais, estes últimos imprescindíveis à retomada da produção e reprodução da ordem capitalista, devido à debilidade do capital privado nacional. A Rússia empreendeu acelerada reconstrução das forças armadas esfaceladas sob a Era Yeltsin, construindo-se tropas quantitativamente menores em relação a Era Soviética, porém de alto nível tecnológico e operacional, registrado nas operações militares na Síria. A China prosseguiu seu rearmamento, potenciado pelos recursos crescentes que dispunha.
Hegemonia Econômica, Hegemonia Militar
A hegemonia estadunidense, apoiada desde a I guerra Mundial, na expansão tecnológica e produtiva, regrediu diante do dinamismo chinês e alemão. A retomada da produção ianque, após a crise de 2008, lenta e de limitada qualidade [estagnação tendencial da produtividade do trabalho], registrava a sua crise estrutural. Nos dias atuais, a hegemonia mundial USA, novamente em contexto multipolar, se manteve e mantém sobretudo apoiada na supremacia bélica. O orçamento militar estadunidense [US$ 692 bilhões], dez vezes superior ao da Rússia, é um dos responsáveis pelo déficit amazônico [US$ 560 bilhões] e a dívida pública sideral, mais de 17 trilhões de dólares, em 2017, já superior ao PIB do país. O PIB chinês em 2017 foi US$ 10,1 trilhões.
O avanço tecnológico da indústria militar russa, o desenvolvimento da pesquisa-inovação nas mais diversas áreas produtivas da China, a capacidade de ambos países de empreenderem obras estruturais de amplas dimensões [gasodutos; Rota da Seda, etc.] ensejaram que o imperialismo estadunidense retomasse a política vitoriosa quando da dissolução da URSS. Relançou-se com furor a “Guerra Fria”, sobretudo contra a Rússia, procurando esgotar os recursos do país, debilitar seus investimentos, minar seu rearmamento, etc. A vitória eleitoral consagradora de Putin, em 2018, registrou a impossibilidade de “revolução de veludo” no país e fortaleceu a proposta de guerras localizadas ou, até mesmo, confronto militar direto. Tudo para destruir a ordem capitalista centralizada e voltar aos “anos dourados” pós-1990.
A colonização imperialista da Rússia constitui passo necessário para a repetição da operação na China, o verdadeiro problema do imperialismo estadunidense. Há muito, a China superou a fase de produtora de mercadorias gerais devido ao baixo preço de sua mão de obra, superando hoje o salário médio de seus trabalhadores o praticado no Brasil. O país produz para o mercado interno e para exportação produtos de alta tecnologia. Sobretudo, a China é hoje a segunda maior exportadora mundial de capitais, após os Estados Unidos, através de amplo movimento de fusões e aquisições de empresas e financiamento de obras em todo o mundo. Os investimentos no exterior rentabilizam o capital chinês incapaz de ser investido no país. A China desponta, em forma indiscutível, como potência imperialista. O governo chinês procura, igualmente, suprir seus dois grandes calcanhares de Aquiles: a grande pobreza de matérias-primas, com destaque para o petróleo, e a dependência à importação de semi-condutores. Quanto aos últimos, o país tem investido capitais fabulosos procurando recuperar o atraso nessa área e obter, com a compra de empresas no exterior, parte da tecnologia que lhe falta.
A produção da China de petróleo é minúscula e decrescente - 2.015 milhões de toneladas em 2015. Ultimamente, a Rússia se transformou no primeiro fornecedor de petróleo para a China, seguida pela Arábia Saudita. A invasão do Iraque, a ofensiva militar contra o Estado sírio, a destruição da independência nacional líbia, a privatização-controle do Pré-Sal brasileiro, a ofensiva em curso contra a Venezuela, etc., são parte da grande operação imperialista pelo controle do petróleo. A ampla política de depressão do preço dessa merchandise constituiu parte da operação para debilitar os Estados russo, venezuelano, colombiano, brasileiro etc., permitindo a construção de um domínio imperialista pleno sobre essas nações e suas reservas petrolíferas. Com diminuição do fornecimento de petróleo, a economia chinesa trava. A dependência da China ao fornecimento de matérias primas e o volume de seus investimentos no exterior levaram-na a iniciar a produção de seu terceiro porta-aviões.
Fechar a Torneira
O imperialismo estadunidense têm pouco tempo para implementar sua política, devido ao peso do orçamento militar - que exige ser repartido com os aliados - e o avanço do esforço militar e tecnológico russo e sobretudo chinês. A valorização atual do petróleo - 75 dólares o barril - impõe, igualmente, pressa nessa operação, que deveria começar, em 2016, com ofensiva geral na Síria, após a vitória de Hillary Clinton, a “Dama das Mãos de Sangue”. A vitória de Trump atrasou a operação o tempo necessário para que ele fosse enquadrado e abraçasse a política imperialista de confronto direto com a Rússia, ao contrário de suas pretensões iniciais. Nesse ano e poucos meses de sursis, o exército sírio [apoiado pela Rússia, Irã eHezbollah libanês] obteve amplas vitórias. Qualquer tentativa de reversão da atual situação exigirá enormes investimentos de recursos de todo tipo, já que as operações não poderão apoiar-se, como antes, apenas no financiamento de combatentes fundamentalistas da região ou importados.
Com os falcões do imperialismo sedentos de sangue dominando o governo Trump [Mike Pompeu, Departamento de Estado; John R. Bolton na NSA; Gina Haspel proximamente na CIA], há grande possibilidade que a ofensiva geral imperialista se inicie com ataque ucraniano às Repúblicas Populares de Donbass. O governo estadunidense anunciou o fornecimento de armas letais ao governo ucraniano, que promete aniquilar aquelas repúblicas e, retoricamente, ocupar a Criméia. Putin tem procurado negociar autonomia para Donetsk e Lugansk no seio da Ucrânia, não se comprometendo com a auto-proclamação de independência das mesmas. É impensável a não reação russa diante de uma invasão, por tropas ucranianas, das duas Repúblicas, localizadas na fronteira da Rússia e habitadas por quase sete milhões de cidadãos, em boa parte de origem russa. Essas provocações começariam no início do verão europeu - junho ou julho. Época em que se interrompe a dependência estrutural européia do fornecimento do gás russo. O final da Copa do Mundo ocorrerá em 15 de julho.
O ataque contra Donetsk e Lugansk seria articulado com a retomada da ofensiva imperialista na Síria, através de maior envolvimento de tropas francesas e inglesas e, sobretudo, com a proposta adesão de países árabes da região, com destaque para a Arábia Saudita, o terceiro orçamento militar mundial, após os USA e a China. Movimento que contaria com intervenção ativa de Israel, já iniciada com o ataques de foguetes a bases iranianas na Síria, em 31 de abril deste ano, e com as “revelações” sobe o “desrespeito” iraniano do “Acordo Nuclear” de 2015, do pinóquio "Bibi" Netanyahu. A ruptura desse acordo pelos Estados Unidos é esperado para os próximos dias, caso o Irã não aceite renunciar à produção de mísseis balísticos, imprescindíveis para sua defesa. O imperialismo USA conta para esta arriscada operação com a colaboração inglesa e, agora, francesa. Com a vacilação inicial de Trump, o governo conservador inglês tomou a iniciativa na operação anti-russa, montando a farsa do envenenamento do ex-espião inglês e de sua filha, de nacionalidades russas. Trata-se, porém, de iniciativa que necessita envolver, em algum grau, todos os países membros da OTAN, que tem sido pressionados a elevar os orçamentos militares anuais até 2% do PIB; a participarem nas sanções à economia russa, etc. Os países bálticos e a Polônia aceitaram sediar tropas USA e da OTAN junto à fronteira russa: hoje, elas superam os quarenta mil homens. Putin lembrou que, em caso de invasão do território russo, não livrará guerra de desgaste, mas se servirá de armas atômicas táticas.
Para a operação contra a Russia, o imperialismo estadunidense necessita sobretudo o apoio ativo da Inglaterra, França, Itália e, sobretudo, Alemanha. O governo conservador de Theresa May, expressão do capital financeiro, está firma ao lado do imperialismo, mas mal de pernas no país. A vitória eleitoral de Emmanuel Macron, candidato da direita francesa [venceu devido ao “perigo” Marine Le Pen], permitiu o seu alinhamento com o imperialismo ianque, registrado na participação no bombardeio da Síria, sob a escusa da farsa do “ataque químico”. É mais problemático o apoio da Alemanha, que quase não reagiu à armação do “espião envenenado” e não participou do bombardeio de Damasco. A Alemanha importa sobretudo gás e petróleo da Rússiae e exporta manufaturados para aquele país. Ela está envolvida na construção de gasoduto russo com terminal na Alemanha. São muitas as empresas alemãs estabelecidas na Rússia e candentes as contradições econômicas com os Estados Unidos [enorme superavit alemão]. Não poucos capitalistas alemães sonham com aproximação a Putin e maior autonomia dos USA. A Itália embarcou simbolicamente na operação do “espião envenenado” e se negou ao bombardeio da Síria, onde não possui qualquer tipo de tropas.
Os Novos Conquistadores
A operação estadunidense avança através da Europa, Ásia, África e alcançou vitórias amplas e estratégicas na América Latina. Na recuperação do domínio sobre a América Latina, o imperialismo ianque se serviu de variados meios, com destaque para golpes apoiados nos parlamentos e, eventualmente, em mobilizações populares contra a “corrupção” - [Honduras, 2009; Paraguai, 2012; Brasil, 2016]; em eleições [Argentina, 2015, Chile, 2017]; em estelionato eleitoral [Lenin Moreno, Equador, 2017], etc. Atualmente, apenas Cuba, o Uruguai, a Nicaragua [sob duro ataque] e alguns outros poucos países escapam ao domínio imperialista direto ou indireto. A grande vitória foi a conquista parcial da Argentina [onde Cristina Kirchner está sendo “denunciada” por corrupção] e o domínio quase total do Brasil. Esse controle, somado ao já mais antigo exercido sobre o México, Colômbia e Peru, permitem que o imperialismo impere sobre a América Latina, tendo como oposição apenas o movimento social e o mundo do trabalho, muito enfraquecidos nos últimos tempos.
No início de 2018, Rex Tillerson, ex-secretário de Estado dos USA, antes de iniciar visita ao México, Argentina, Peru e Colômbia, pronunciou-se sobre “novas potências imperialistas” que estariam avançando sobre a América Latina, com a pronta resposta do Ministério de Assuntos Exteriores chinês. A China é o principal parceiro comercial da Argentina, Brasil, Chile e Peru, sobretudo devido à compra de matérias-primas desses países. O acelerado avanço do imperialismo ianque na América Latina permitiu isolar e cercar a Venezuela e Cuba; apoderar-se de recursos energéticos nacionais, relançar a rapina financeira, por fim nos fatos ao BRICs, etc. Ele permitirá impedir sobretudo grandes operações econômicas da China nessa região, fundamentais para a exportação de seus capitais e abastecimento seguro de matérias primas.
A grande vitória do imperialismo na América Latina foi certamente o golpe institucional de 2016 no Brasil. Como em outras regiões do continente, essa derrota histórica foi facilitada por governos populistas sociais-liberais que, aproveitando-se do período de expansão do comércio mundial, governaram sem nenhuma ruptura com o grande capital e sem promover qualquer reforma estrutural dos seus países em favor dos trabalhadores e da população. Empreenderam gestões de viés social-liberal, com limitadas compensações às classes populares, contribuindo ativamente para a desmoralização da esquerda e desorganização do movimento social e sindical. Como nos partidos conservadores profissionais, seus políticos serviram-se comumente dos bens públicos para financiar as campanhas e para proveito pessoal.
No Brasil em geral, as organizações de esquerda insistem em ver o golpe, empreendido sob a direção direta do imperialismo, como um conluio do conservadorismo interno, algo possível de ser superado após alguns sobressaltos e penas. Negam-se a compreendê-lo como um ataque externo direto e permanente à própria independência nacional do país, com o projeto de reestruturação geral da nação segundo às necessidades do grande capital. Domina fortemente a esquerda o esforço de salvar o possível de suas posições parlamentares e sindicais, sem arriscar-se a um confronto direto com a nova ordem em construção. Registrando a debilidade política, social e ideológica da esquerda, como em outras regiões do mundo, organizações reivindicando-se socialistas e marxistas não apenas negaram, como apoiaram e seguem apoiando o golpismo.
Não raro, há décadas, essas organizações colaboram ativamente com o imperialismo. Apoiaram o extremismo islâmico contra a revolução afegã e a contra-revolução do Solidariedade na Polônia. Celebraram a destruição da URSS, o bombardeio da Iugoslávia, as revoluções de “veludo” nos Estados operários. Festejaram a destruição do Estado nacional iraquiano e líbio. Sustentaram e sustentam a ofensiva imperialista na Síria, na Venezuela e contra Cuba. Em geral, apresentam o apoio às operações imperialistas como defesa de revoluções imaginárias contra ditadores e ditaduras. No Brasil, organizações como o PSTU; o MES, de Luciana Genro; a CST, do ex-deputado Babá, negaram o golpe em marcha, defenderam os instrumentos judiciários utilizados pelo imperialismo [Lava Jato, etc.]; denunciaram a luta em defesa da institucionalidade contra o golpismo; negaram o caráter político do julgamento, condenação e prisão de Lula da Silva. Contribuíram ativamente para a “maior astúcia do Diabo imperialista”, que é o esforço para fazer a população e os trabalhadores acreditarem “que ele não existe”.
Minuciosamente Planejado
No Brasil, a operação golpista foi longa e cuidadosamente planejada pelas centenas de analistas de órgãos estadunidenses como a CIA, NSA, Departamento de Estado, etc.. Implementada através de “revolução de veludo” contra a “corrupção petista”, o golpe teve como instrumentos fundamentais a Justiça e o Parlamento, já totalmente nas mãos do conservadorismo. Para tal, foi necessário a aprovação ou adaptação às suas necessidades de leis e instrumentos jurídicos como a “Condução Coercitiva”; a “Lei da Ficha Limpa (LeiComplementar nº. 135 de 2010); a “Delação Premiada”, embutida na Lei de Organizações Criminosas (Lei 12.850/2013); o princípio da “Presunção de Culpa”, sem comprovação do crime, etc. Essa operação, que coloca nas mãos da justiça burguesa golpista a sorte de todo e qualquer político ou cidadão, segue sendo ampliada, com instrumentos como o fim do “Foro Privilegiado”, que permitirá cassar e aprisionar qualquer político que não se submeta à nova ordem.
Para essa operação, lançada com o “Mensalão”, foi necessário cooptar, treinar, seduzir, corromper e instruir centenas de delegados, de procuradores e de juízes, dos quais Joaquim Barbosa, Sérgio Moro, Deltan Dallagnol, Raquel Dodge, Rodrigo Janot são apenas os protagonistas excelentes, sacralizados pela mídia. Em geral todos eles conservadores, já estavam predispostos para a operação. Um processo que contou com o pleno apoio da ampla maioria dos membros STF. A operação não teria sido possível sem a cooperação ativa com o imperialismo da grande mídia nacional, com destaque para a Rede Globo e os jornais Folha de São Paulo e Estado de São Paulo, que desempenharam papel basilar no movimento golpista. Os guardas pretorianos da operação, até há pouco silenciosos, foram os altos oficiais das forças armadas, que hoje passam a desempenhar papel barulhento e de destaque, na nova ordem em instituição. O parlamento conservador, organizado segundo interesses privados corporativistas, sancionou e legalizou a operação.
Enganam-se aqueles que vem na ação imperialista apenas uma operação visando consolidar o caráter neocolonial do Brasil e das outras nações americanas. Trata-se de iniciativa nova e muito mais ambiciosa, imprescindível ao capitalismo em sua idade senil. Pretende-se construir uma nova dependência “global-colonial”, com a dissolução tendencial da própria autonomia das classes dominantes sobre os seus respectivos países. Realidade já consolidada em algumas nações. No Equador, o dólar é a moeda nacional, há muito! O Estado nacional nasceu com a produção capitalista nacional. A necessidade da exteriorização capitalista criou o colonialismo, o imperialismo e o neocolonialismo. Se o capital globalizado monopolar dominar mundialmente, imporá nova ordem em que o cidadão nacional, no sentido político do termo, desaparecerá para dar lugar apenas a produtores e consumidores de mercadorias fortemente internacionalizados.