A maioria das vítimas dos assassinatos realizados entre os dias 6 de abril e 27 de julho do ano passado, datas que marcam a primeira e a última morte, foram queimadas, linchadas, degoladas ou baleadas, alvo de objetos contundentes ou morreram quando tentavam desviar barricadas ou escapar do óleo jogado nas ruas por grupos da extrema-direita.
Ao lado dessa onda de violência, um novo elemento inédito passou a fazer parte da história criminal do país, os chamados crimes de ódio. O Escritório do Assessor Especial da ONU sobre a Prevenção do Genocídio define estes delitos como aqueles executados contra uma vítima por causa de sua cor, orientação sexual, origem étnica, condição social, crença religiosa ou política.
Isso foi o que aconteceu nos casos de Orlando Figuera (faleceu devido às queimaduras), Carlos Ramírez e Giovanny González, que foram queimados ao ser apontados como chavistas quando passavam pelo município de Chacao, estado de Miranda, mas que se salvaram de forma milagrosa. Esta zona, tradicionalmente relacionada à direita, concentrou, como em 2014, grande parte das guarimbas (distúrbios com bloqueios de ruas) registradas no leste de Caracas, promovidas e aplaudidads pela maioria dos integrantes da Mesa da Unidade (MUD).
Nesse momento, o prefeito de Chacao era Ramón Muchacho, militante de Primeiro Justiça, partido de extrema-direita tradicionamente ligado às ações desestabilizadoras contra o governo venezuelano. O ex-prefeito figura como um dos promotores dos grupos extremistas, que, neste cenário, contaram com a proteção da Polícia de Chacao, segundo denunciou o diretor do Colegio Universitário de Caracas (CUC), Miguel Álvarez.
Por outro lado, a imprudência causou a morte de nove venezuelanos, que se aproveitando da situação, tentaram saquear locais comerciais, estimulados pelos promotores das ações violentas. Oito pessoas morreram electrocutadas no Valle, em Caracas, quando tentavam saquear uma padaria no dia 20 de abril e três meses depois, em 27 de julho, também faleceu uma mulher no saqueio a uma loja em Maracaibo, no estado de Zulia.
As vítimas não se reduzem aos 121 falecidos. De acordo com dados da Comissão da Verdade, Justiça, Paz e Tranquilidade Pública (Covejuspaz), 1.958 pessoas com lesões integram a estatística de uma espiral insurrecional que pretendeu conseguir o que não foi capaz a dirigência opositora através do voto: frear o avanço da Revolução Bolivariana.
Formação para matar
Nesta nova escalada de violência reapareceram os grupos violentos, que ao contrário da Saída (guarimbas promovidas pela direita em 2014), foram munidos com armas letais, artefatos explosivos e instrumentos de defesa artesanais fornecidos por financistas ligados aos partidos Vontade Popular e Primeiro Justiça.
Os grupos atuaram como esquadrões de choque destinados a confrontar as forças de segurança do Estado; para isso, tinham formação em fabricação de armas e explosivos com tubos de silicone, e uma dotação de granadas de gás lacrimogêneo, coletes de proteção, escudos e máscaras de gás para por em prática o plano que visava uma intervenção militar.
A estratégia insurrecional incluia a participação de crianças e jovens em estado de precariedade social e econômica, que foram atraídos com a oferta de comida, drogas, álcool e um pagamento de 60 mil bolívares diários para atuar nas concentrações, segundo confessou um jovem de 15 anos que foi preso pela polícia, após ser recrutado por uma célula terrorista opositora.
A presença de menores de idade e jovens, também causou algumas mortes por causa da manipulação irresponsável de morteiros caseiros (armas que disparam projéteis explosivos ou incendiários) durante as ações insurrecionais.
Para conter os grupos de sedição, faleceram pelo menos oito efetivos e outros 829 foram feridos. Do total, 73 receberam disparos de armas de fogo.
Sequelas da violência
Em quatro meses, os grupos da extrema-direita sequestraram durante dias centenas de famílias em conjuntos habitacionais ao ameaçar transeuntes e colocar barricadas, elaboradas inclusive com troncos de árvores cortadas para obstruir a passagem.
Os serviços essenciais dos venezuelanos também foram afetados: 10 escolas foram parcialmente destruídas e o Hospital Materno Infantil Hugo Chávez, no Valle, foi atacado em 20 de abril de 2017 por grupos armados identificados com a oposição.
Oito centros de saúde foram afetados e 12 estações do Metrô de Caracas sofreram ataques vandálicos. A lista continua com o incêndio de 166 unidades de transporte e dois centros de armazenamento de alimentos, além de 30 ações de sabotagem ao Sistema Elétrico Nacional.
Também foram registrados 917 ataques contra comércios e estabelecimentos privados; 913 contra instituições públicas e 300 contra organismos públicos.