A Grécia agora apenas trocou um conjunto de credores, por outro. No primeiro 'resgate' em 2010 foram principalmente os bancos privados da Europa, credores da dívida grega. No segundo 'resgate', as instituições do estado pan-europeu (às vezes chamadas "A Troika": Comissão Europeia, Banco Central Europeu, Fundo Monetário Internacional) entraram em ação e garantiram empréstimos para que a Grécia 'resgatasse' seus credores privados. De fato, a Grécia nunca nem viu o dinheiro. A Troika pagou os investidores privados e efetivamente transferiu sua dívida para os balanços da Troika. A Grécia teve de fazer pagamentos ainda maiores – dessa vez para a Troika. A Troika então, pagou os bancos (estudos do German Institute mostram que 95% de todos os pagamentos de dívidas gregas à Troika foram repassados pela Troika para bancos do norte da Europa). A Troika assim serviu como gângster 'coletor de dívidas' a serviço dos banqueiros.
A recessão em duas etapas da Eurozona dos anos 2011-13 exacerbou ainda mais a dívida da Grécia, obrigou o país a tomar mais empréstimos em 2015-18 para pagar a dívida que a Troika assumiu em 2012-15 (e que foi contraída para pagar a dívida privada de 2010). Em 2012 a Grécia endividou-se ainda mais em 2015-18 para financiar e pagar as dívidas que fez em 2010. Cada vez que se assinou novo contrato de empréstimo, a dívida foi 'rolada'. Sejam pagos pela Troika, ou diretamente, os pagamentos sempre acabaram nos bancos privados europeus.
Agora a mídia vive de 'noticiar' que a Grécia estaria emergindo dessa nova dívida sempre crescente, para pagar pela dívida passada. Mas não é verdade. Única mudança é que agora a Grécia pode tomar empréstimos (quer dizer, fazer novas dívidas), novamente, de investidores privados, como antes de 2012. Agora a Grécia fará empréstimos do setor privado (especuladores de bolsa, fundos 'hedge' e outros abutres capitalistas) para pagar à Troika a dívida antiga.
Como a Grécia consegue pagar os juros dessa dívida? Com muito arrocho (chamado erradamente de "austeridade") contra os cidadãos, especialmente contra os trabalhadores, pequenos comerciantes, os pobres em geral. O estado grego e o banco central grego (simples apêndice do Banco Central Europeu sob o euro) recolhe o superávit administrado pelo governo grego do Syriza (aumento de impostos sobre os mais pobres, cortes em aposentadorias e pensões, cortes nos salário, venda de empresas nacionais, tudo que signifique arrocho, chamado "austeridade"). Os banqueiros do banco central grego então cuidam de pagar os juros da dívida usando empréstimos que recebem da Troika (e a Troika repassa aos banqueiros). Agora a Grécia poderá continuar a pagar à Troika e indiretamente aos banqueiros, ao mesmo tempo em que toma novos empréstimos de investidores privados e paga a eles juros privados também sobre os novos empréstimos.
As medidas do arrocho (chamadas "austeridade") nada alteram nesse quadro. O arrocho é sempre o mesmo. O desemprego grego permanece em níveis de depressão, em 19,5%. O emprego não sai de 17,5% abaixo dos picos do período pré-depressão. Os salários permanecem estagnados: salários de trabalhadores qualificados foram reduzidos em 35%, dos não qualificados, em 31% e os salários mínimos perderam 22%. Continuam os cortes nas aposentadorias, e a idade mínima foi aumentada em dez anos. Os impostos aumentaram sobre os trabalhadores e pequenos negócios. Sempre o mesmo arrocho, sob outro nome. E isso há quem chame de 'recuperação'! A única coisa que muda é o gângster coletor de dívidas? A Troika? Os novos emprestadores privados? Ambos? Nesse momento, a resposta é ambos. A Troika sai da linha de frente e cede o protagonismo aos investidores abutres privados, para que emprestem dinheiro à Grécia (para pagar à Troika e aos eurobancos), enquanto os abutres mais uma vez cobram juros sobre o novo empréstimo dado à Grécia.
Em meu livro de 2016, Looting Grécia: A New Financial Imperialism Emerges, Clarity Press, descrevi essa nova modalidade de exploração em escala nacional, pela qual instituições e aparelhos do Estado operam no século 21 papel cada vez mais direto na extração de valor e mais valia da classe dos trabalhadores e pequenos comerciantes a favor dos grandes bancos capitalistas. É uma forma de explicar o imperialismo diferente da que houve antes do século 20 e início do século 21 (explicações pesadamente influenciadas por Lênin e Hilferding). No capítulo final, discutem-se a evolução histórica do imperialismo, do século 19 ao século 21, e os vários debates do período. A Grécia é caso exemplar do microcosmo da nova modalidade.